10 Discos Para Gostar de Sludge Metal

/ Por: Cleber Facchi 24/02/2014


Por: Cleber Facchi

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Título dado ao subgênero do Heavy Metal que começou a se propagar na segunda metade dos anos 1980, o Sludge – do inglês, lodo – trouxe na colagem de referências um mecanismo de sustento para o estilo. Tendo em bandas como Melvins um ponto de partida, o gênero fez do cruzamento entre os ruídos do Doom Metal e a aceleração do Hardcore a base para um terreno até então inacessível ou pouco explorado. Com variações que se estendem do Progressive Metal ao Grunge, passando pelo Stoner Rock, Pós-Rock e Blues, o estilo firma nas distorções densas e arranjos contrastados um princípio natural de organização. Dentro desse cenário tão diverso, organizamos uma sequência de 10 Discos Para Gostar de Sludge Metal.

São obras que vão do começo dos anos 1990 (Acid Bath) até idos de 2010 (Tombs) em meio a diferentes variações instrumentais e cenas quase opostas. Ainda que alguns dos registros – caso de Spiral Shadow (2010), do Kylesa e Meanderthal (2008), do Torche – apresentem uma intimidade maior com o Stoner Metal do que com o Sludge em si, as passagens pelo estilo servem como um ponto de partida para o ouvinte menos conhecedor. Afinal, como o título da lista logo anuncia, trata-se de uma seleção de obras para gostar do gênero, e não um conjunto de discos essenciais ou obras definitivas sobre o estilo. Para todos os efeitos, os comentários estão abertos e seu disco favorito é mais do que bem vindo.

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Acid Baths

Acid Bath
When the Kite String Pops (1994, Rotten)

Ainda que o Melvins leve boa parte dos créditos pela “formação” do Sludge Metal, é da banda Acid Bath um dos registros mais influente do gênero: When the Kite String Pops. Lançado em idos de 1994, o álbum passeia abertamente por referências lançadas nas décadas de 1970 e 1980 sem necessariamente fugir do presente da época. O resultado está na formação de um projeto essencialmente psicodélico, resultado evidente nas guitarras de Mike Sanchez, mas que não se distancia da crueza explícita do hardcore e até de elementos do Death metal – alicerce confesso da banda. Perturbador, tratamento explícito logo na capa do disco – uma ilustração do serial killer John Wayne Gacy -, a estreia do Acid Bath é praticamente uma passagem para um universo de preferências e ambientações próprias do grupo. Enquanto músicas “brandas” como Scream of the Butterfly reforçam passagens pelo Country e Blues, outras como Finger Paintings of the Insane se acomodam em atos longos, servindo de morada para que elementos do Doom Metal se desenrolem em verdadeiras tapeçarias instrumentais. Sexo, assassinato, delírios e certa dose de esquizofrenia, tudo converge de forma instável no interior da obra.

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Baroness

Baroness
Blue Album (2009, Relapse)

Enquanto Red Album (2007), foi entregue como um típico registro de apresentação, anunciando os rumos e “possibilidades” do Baroness, com Blue Album, de 2009, a desconstrução desse mesmo cenário passou a orientar cada faixa assinada pelo grupo estadunidense. Ainda que parte das canções se comuniquem de forma precisa com o que fora apresentado dois anos antes, o diálogo atento com elementos do rock progressivo (Swollen and Halo), Stoner Rock (The Sweetest Curse) e até folk (Steel That Sleeps the Eye) fazem com que a banda possa ziguezaguear por entre diferentes essências. A complexidade explícita das canções em nenhum momento impede que o grupo reproduza um resultado acessível ao público médio, tratamento evidente nos riffs plásticos e vocalizações melódicas do trabalho – como em A Horse Called Golgotha, faixa mais “comercial” do disco. Pontuado por pequenos desdobramentos climáticos – em O’er Hell and Hide e Blackpowder Orchard -, o grupo usa desse mecanismo como um respiro para o álbum. Instantes de recolhimento e puro detalhismo que contribuem para a formação intensa e sempre versátil que orienta o restante da obra. Na dúvida, comece por este disco.

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Boris

Boris
Pink (2005, Southern Lord)

Desde o nascimento, no começo dos anos 1990, a obra do grupo japonês Boris foi marcada pela versatilidade. Tramas que cruzam o Pós-Rock, Shoegaze, Noise e Doom Drone em um mesmo ambiente conceitual. Entretanto, em Pink, de 2005, todas as referências lançadas pela banda parecem seguir um mesmo bloco de experiências. Apresentando o que parece ser uma aproximação entre a melancolia de Nick Drake – homenageado na capa de Akuma no Uta, de 2003 – e os ruídos do Melvins – grupo que inspirou o nascimento da banda -, o álbum cresce em meio a um bloco de sons caóticos, mas ainda assim controlados. Longe das vozes guturais que orientam grande parte dos trabalhos do gênero, Pink é um disco que administra de forma coesa arranjos desconstruídos e faixas tomadas pela leveza das formas. São tramas extensas, como em Farewell, na abertura do disco, ou mesmo canções efêmeras, caso de Woman on the Screen, música que abraça o Stoner Rock e o Hardcore em um mesmo jogo de experências (des)controladas. Como se cada música fosse um passo para a canção seguinte, Wata (guitarra), Takeshi (baixo) e Tetsuo (bateria, voz) fazem do álbum um conjunto de referências cíclicas, obrigando o regresso do espectador tão logo o registro chega ao fim.

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Isis

Isis
Panopticon (2004, Ipecac)

Caos sob controle, assim é Panopticon, terceiro registro em estúdio da banda norte-americana Isis e uma obra que reforça a construção dos inventos climáticos do grupo. Com um pé no Pós-Rock e outro no metal anunciado em idos da década de 1990, o disco é praticamente uma sequência aprimorada do resultado lançado dois anos antes, em Ocean (2002). A diferença em relação ao disco que o antecede está na forma como o grupo parece autorizado a experimentar com maior liberdade. Enquanto as irmãs Backlit e In Fiction manifestam toda a formatação atmosférica da obra, intercalando melodias brandas com vozes controladas, outras como Syndic Calls e Altered Course reforçam a agressividade ponderada que cresce pelo disco. São acordes cíclicos e sombrios, mas que se encaminham para o bloco ascendente que orquestra os instantes finais da obra. O típico caso de um trabalho que começa sublime, encontra um evidente ápice, e depois regressa para a timidez embrionária que ocupa a abertura do álbum. Parcimônia e expansão dissolvidos em um mesmo jogo de experiências.

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Kylesa

Kylesa
Spiral Shadow (2010, Season Of Mist)

Com o lançamento de Static Tension, em 2009, o trabalho da banda norte-americana Kylesa parecia ter assumido novo curso. O que antes era tratado sob forte anárquica nos primeiros registros, passou a ser representada sob forte cuidado e boas melodias, princípio para aquilo que Spiral Shadow traria de forma muito mais organizada no ano seguinte. Delineado pelo uso de guitarras psicodélicas e uma forte comunicação com o rock da década de 1970, o disco de 11 faixas rompe a comunicação convencional com o Sludge para flertar com o Stoner Rock e outras referências próximas. São pouco mais de 40 minutos em que as guitarras de Phillip Cope se perdem de forma assertiva por entre as bases percussivas das canções – exercício assumido pela dupla Carl McGinley e Tyler Newberry. Soma-se a isso os vocais mezzo graciosos, mezzo explosivos de Laura Pleasants, efeito essencial para o ambiente contrastado que percorrer todas as faixas do álbum. Como o redemoinho em preto e branco da capa logo revela, Spiral Shadow é um ponto onde todas as referências do grupo parecem se encontrar e ainda assim divergir.

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Mastodon

Mastodon
Blood Mountain (2006, Reprise)

Remission (2002) e Leviathan (2004) já haviam transformado o quarteto Mastodon em um dos nomes de maior relevância do novo metal estadunidense. Porém, com a chegada de Blood Mountain (2006), a provável divisão entre o Underground e o Mainstream que antes orientava a sonoridade da banda seria parcialmente rompida. Menos hermético e forçando os limites do progressive metal, o registro assume em cada música um objeto fechado dentro do ambiente instrumental que sustenta o disco. Contando com a participação de Josh Homme (Colony of Birchmen), Scott Kelly (Crystal Skull) e Cedric Bixler-Zavala (Siberian Divide), Blood Mountain é um trabalho em que guitarras, vozes e batidas duelam durante toda a formação do registro. Marcado do princípio ao fim pela colisão de solos (Bladecatcher) e batidas que mudam instantaneamente os rumos das canções (Circle Cysquatch), o álbum é ao mesmo tempo uma completa ruptura e uma natural extensão da sonoridade lançada pelo grupo. Ainda que o teor “comercial” do projeto só fosse aprimorado anos mais tarde – em The Hunter (2011) -, com o terceiro disco, a Mastodon cravou de vez o nome na história recente da música – independente de gêneros ou possíveis delimitações sonoras.

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Melvins

Melvins
Houdini (1993, Atlantic)

Depois de quatro discos lançados de forma independente – entre eles a obra-prima Bullhead, 1991 -, a banda norte-americana Melvins finalmente pisava no território de um grande selo com uma obra ainda mais desafiadora: Houdini. Com um tempo maior em estúdio, e a interferência de Kurt Cobain como um dos produtores do álbum, o registro apresentado pela Atlantic Records se sustenta em meio a um catálogo de ruídos incertos, mas ainda concisos, prova da plena coerência que administra a formação do projeto. São 13 composições orquestradas em essência pelas guitarras e versos ásperos de Buzz Osborne, figura que não apenas dissolve a essência do Black Sabbath, como brinca com as imposições e tramas marcadas do Rock Alternativo, tão em evidência na época. Abrindo espaço para músicas versáteis, caso de Lizzy, ao mesmo tempo em que edifica blocos de ruídos, como em Hooch, Osborne desenvolve um universo inteiro à sua maneira. Seja na aceleração de Honey Bucket, ou nos atos climáticos de Hag Me, com mais de sete minutos de duração, cada música passeia por diferentes cruzamentos, garantindo ao disco a versatilidade necessária para alimentar uma geração inteira de artistas hipnotizados pela mesma estética.

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Neurosis

Neurosis
Given To The Rising (2007, Neurot)

Ainda que contabilize outros bons discos – caso de Through Silver In Blood (1996) e Times Of Grace (1999) -, com Given To The Rising, de 2007, a maturidade do Neurosis se revela como um elemento complementar. Apostando na constante aproximação entre as músicas, Steve Albini, produtor do disco, garante uma obra límpida, mas ainda sim torta em se tratando das guitarras ruidosas de Scott Kelly. São oito longos temas – com mais de sete minutos cada -, intercalados por pequenos atos  – At the End of the Road e Nine -, respiros que contribuem para a sobrevivência da obra. Mantendo os experimentos sob controle, o disco cresce em estrutura de plena comunicação entre as faixas, como se uma mesma linha guia fosse seguida da abertura ao fechamento, pontuando de forma sombria a derradeira Origin. Marcado pelo uso de tempos lentos em aproximação com uma série de ruídos (ouça Fear and Sickness), o disco vai do Sludge aos domínios do pós-metal em instantes, trazendo em músicas como To the Wind um estado de leveza perturbadora poucas vezes visto em trabalhos do gênero.

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Tombs

Tombs
Path of Totality (2011, Relapse)

Apostando em uma sonoridade muito mais experimental do que a retratada nos primeiros trabalhos em estúdio, Path of Totality trouxe ao grupo nova-iorquino Tombs um conjunto de possibilidades a serem exploradas sob plena grandeza das formas e arranjos. De um lado, um catálogo de temas sombrios e ambientações soturnas invasivas, típicas do Black Metal, no outro oposto, a coleção de arranjos tortos, capazes de estabelecer uma forte comunicação com o Pós-Metal. No meio desse conjunto de experiências, acordes sujos de guitarras reforçam o hermetismo da obra – presa em um universo de ruídos, caos e ambientações sempre particulares. Orquestrado pela sobriedade de Mike Hill, vocalista e guitarrista da banda, o álbum segue até a última música em meio a uma constante colisão de temas densos, como blocos de distorção que aos poucos são sobrepostos. Enquanto músicas como Vermillion reforçam a crueza do registro, outras como Passageways abraçam o lado mais “arrastado” da obra, reverberando acordes densos, capazes de espalhar aos poucos a atmosfera crescente que se organiza desde a primeira canção do álbum.

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Torche

Torche
Meanderthal (2008, Hydra Head)

“Intensa” é uma palavra que parece definir a atuação da banda norte-americana Torche em Meanderthal. Segundo registro em estúdio do grupo de Miami, Flórida, o trabalho ultrapassa sem dificuldades os limites do Sludge, encontrando nas emanações psicodélicas do Stoner Metal um cenário para provar de diferentes possibilidades rítmicas e líricas. Marcado pela sobreposição veloz das guitarras, o disco utiliza de toda a primeira metade como um palco para a construção de faixas urgentes e curtas. Canções como Grenades e Sandstorm que fogem das imposições sombrias, típicas de obras do gênero. Já para a segunda metade do álbum, arranjos alongados e tempos mais lentos reforçam o detalhismo das composições. Músicas como Amnesian, em que as guitarras de Steve Brooks e Juan Montoya se espalham confortavelmente por entre as batidas de Rick Smith, ou outras como a faixa-título, em que o caos reina em meio a distorções abrasivas e lentas. Uma sequência de faixas, berros e solos que parecem cessar antes mesmo que você consiga tomar fôlego.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.