20 Discos de 1991

/ Por: Cleber Facchi 16/08/2013

Picasion

Definitivamente 1991 foi um bom ano para a história da música. Ponto de verdadeira ruptura entre os sons que haviam marcado a década de 1980 e toda a nova leva de ritmos que estavam nascendo, o período sustenta não apenas o alvorecer do rock alternativo, mas de uma variedade de outros gêneros e vertentes musicais. Do nascimento do Trip-Hop aos experimentos climáticos que ocupavam a eletrônica, da consolidação do Hip-Hop ao fortalecimento dos selos independentes, cada trabalho lançado durante o ano trouxe um complemento significativo para a produção da época, o que torna o período um dos mais inventivos da música recente. Dessa forma, escolher 20 registros que marcaram 1991 não foi um exercício simples. Claro que algumas obras fundamentais acabaram  de fora, mas como a intenção era a de resgatar alguns trabalhos mais “obscuros” do período, o resultado não tinha como ser outro.

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Rap

A Tribe Called Quest
The Low End Theory (Jive/RCA)

Jazz e Hip-Hop, ainda que a relação entre os gêneros fosse algo natural, o cruzamento entre os dois estilos parecia algo impensável. Pelo menos até a chegada do coletivo nova-iorquino A Tribe Called Quest. Formado no meio dos anos 1980 por Q-Tip, Phife Dawg, Ali Shaheed e Muhammad Jarobi White, o projeto conseguiu amarrar as pontas entre as conduções experimentais do Jazz e o beat típico do Rap. Apostando em um Flow melódico, desenvolvido de acordo com o suíngue das faixas, o grupo fez de People’s Instinctive Travels and the Paths of Rhythm, em 1990, uma abertura para esse cenário particular, convertendo no ano seguinte The Low End Theory no ponto central de todas essas transformações. Além da base dual que abastece o disco, elementos do Funk, Soul, R&B e até do Rock crescem exponencialmente pela obra, ampliando o catálogo de sons que alimentam as faixas. São samples bem encaixados de Miles Davis, Funkadelic e James Brown que se transformam em parte natural do trabalho do grupo. The Roots, BADBADNOTGOOD e toda uma geração de artistas tiraram muita coisa deste disco.

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Biosphere

Biosphere
Microgravity (Apollo)

Geir Jenssen havia atravessado grande parte da década de 1980 em meio a inventos pouco convencionais para a eletrônica da época. Em um sentido de aproximação e ao mesmo tempo distanciamento em relação àquilo que Aphex Twin, Autechre e outros produtores europeus vinham desenvolvendo, o norueguês fez da relação com a Ambient Techno um projeto assumido de identidade. Primeiro registro oficial de Jenssen à frente do Biosphere, Microgravity concentra grande parte daquilo que o artista havia experimentado anos antes, trazendo na forte unidade entre as músicas, um teor explícito de comunhão instrumental. São quase 50 minutos de bases atmosféricas, batidas encaixadas em um exercício matemático e pequenas colagens sonoras que bebem assumidamente do trabalho de Brian Eno. Como se todo o registro fosse delineado como um único bloco de sons, Jenssen abre espaço para uma série de inventos complementares, seguidos em Patashnik (1994) e Substrata (1997), obras posteriores ao trabalho de estreia do norueguês.

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Chapterhouse

Charptherhouse
Whirlpool (Space Age)

Entre o fim da década de 1980 e o começo dos anos 1990, o Reino Unido era soterrado por uma verdadeira avalanche de bandas inclinadas aos ruídos. No meio desse cenário criativo, nascia o Chapterhouse, grupo que trouxe na comunhão entre as guitarras e os vocais submersos, um princípio de identidade. Em exercício desde 1987, o grupo fez do primeiro registro em estúdio, Whirlpool, um catálogo natural de faixas marcantes para o gênero. Esparramando bases psicodélicas em cima de uma verdadeira tapeçaria de ruídos, o álbum serve de abrigo para canções como Pearl, Falling Down e Treasure, alimento para aquilo que grupos como Slowdive e uma centena de outros grupos trariam na mesma década. Lançado no mesmo ano que Loveless do My Bloody Valentine e todo o altar de clássicos que ocuparam 1991, o disco passaria completamente despercebido pelo grande público, se transformando anos mais tarde em um objeto de inspiração para uma centena de jovens músicos. Em produção até 1994, o Chaperthouse ainda lançaria o satisfatório Blood Music (1993) antes de ser dissolvido, com seus integrantes dando vida a uma série de outras bandas.

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De La Soul

De La Soul
De La Soul Is Dead (Tommy Boy)

Se com o lançamento de 3 Feet High and Rising (1989) o De La Soul conseguiu mostrar do que era capaz, então com De La Soul Is Dead o trio nova-iorquino conseguiu ir ainda mais longe. Tão inventivo quanto o trabalho que apresentou a tríade Posdnuos, Trugoy e Maseo, o segundo álbum de estúdio do coletivo de rappers mantém a mesma estética plural, os temas cômicos e as rimas que pareciam distante daquilo que o gênero pregava na época. São composições cênicas, trechos descritivos e uma sequência de colagens musicais que delimitam a obra em um cenário próprio. Desenvolvido para ser ouvido de forma integral, como se fosse uma espécie de audiobook, o trabalho cresce entre pequenas marcações anunciadas por um “bip”, momento exato para o ouvinte “virar a página”. Fundamental para a consolidação do grupo, o álbum conquistou boas vendas sem grandes esforços, encontrando nas críticas positivas um complemento para se firmar como um dos trabalhos mais importantes para o gênero nos anos 1990.

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kmd

KMD
Mr. Hood (Elektra)

Na contramão do que abastecia o Rap  nova-iorquino no começo dos anos 1990, o coletivo KMD (abreviação para Kausing Much Damage) parecia em busca de novidade com o lançamento de Mr. Hood. Apostando em um som descompromissado, temáticas distantes de qualquer esforço político e sobrecargas de bom humor, o grupo formado pelos rappers Rodan, DJ Subroc e o então desconhecido MF DOOM (na época se apresentando com o nome de Zev Love X) ocupou um espaço isolado naquilo que parecia dominado por grupos como Public Enemy e outros gigantes do gênero. Com samples variados, colagens instrumentais que brincavam com séries de TV, cartoons e uma centena de outras fórmulas musicais, o trio ocupa cada uma das faixas do registro com uma leveza inexistente, mesmo em obras atuais. São mais de 60 minutos de temas cotidianos, como se todo o álbum fosse um passeio pela ruas de Nova York ao lado dos rappers. Mesmo com um grande arsenal de faixas em estúdio, um acidente automobilístico em 1993 ceifaria a vida de DJ Subroc, levando ao encerramento do KMD pouco tempo depois.

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Legião Urbana

Legião Urbana
V (EMI)

Com As Quatro Estações (1989), a Legião Urbana havia se transformado na maior banda do Brasil. Shows lotados, vendagens de discos em alta e um conjunto de acertos catapultaram de forma natural o grupo brasiliense para o topo da cena nacional. Como se buscasse amenizar isso, V, quinto registro oficial do grupo, cresce em uma atmosfera intencional de ruptura. Desenvolvido em cima de um conjunto de sons amargos e intimistas, o trabalho é praticamente um reflexo do próprio Renato Russo naquele instante. Enquanto as letras se dividem entre a descoberta da Aids, a situação econômica do país e a dependência química do cantor, instrumentalmente o registro vai além dos inventos prévios da banda. São passagens pelo rock progressivo (Metal Contra As Nuvens, A Ordem Dos Templários), psicodelia (A Montanha Mágica), flertes com o punk (L’Âge D’or) ou mesmo típicas canções pop (O Mundo Anda Tão Complicado), faixas que transformam o disco no catálogo mais versátil de toda a discografia do grupo.

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Massive Attack

Massive Attack
Blue Lines (Virgin)

Enquanto Robert Del Naja (“3D”) e Grant Marshall (“Daddy G”) vão aos poucos delimitando toda a trama instrumental que toma conta do do trabalho, um time isolado assume a limpidez dos vocais em um esforço de buscar pela perfeição. São nomes como Tricky, Shara Nelson e Horace Andy, artistas até então pouco conhecidos da cena britânica, mas que derramam pela obra um misto constante de suspiro e provocação. As batidas sincopadas, os scratches, doses moderadas de dub, soul e hip-hop se acumulam com parcimônia no interior do trabalho, resultando em um jogo de nove composições capazes de esbanjar gemidos e sensualidade sem qualquer dose de exagero. Uma ode ao sexo, sem necessariamente focar nesse resultado. Originalmente apresentado há mais de duas décadas, Blue Lines serviu como a estrutura de base para todos os lançamentos seguintes voltados ao Trip-Hop, mantendo uma unidade e independência instrumental tão marcante hoje, quanto na época de sua estreia.

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Loveless

My Bloody Valentine
Loveless (Creation)

Três anos de gravação, a quase falência do selo Creation Records e Kevin Shields teria em mãos a obra mais celebrada do Shoegaze: Loveless. Exemplar fundamental para tudo o que viria a guiar o gênero pelos próximos anos, o segundo registro em estúdio do My Bloody Valentine eleva uma “simples” carga de ruídos à um caráter próximo do orquestral. São pouco mais de 40 minutos de duração em que as guitarras não apenas ditam os rumos da obra como parecem se movimentar e “pensar” de forma independente pelo disco. Gravado em diferentes estúdios ao longo dos anos, o álbum é uma natural evolução daquilo que a banda já havia experimentado em Isn’t Anything (1988), com Shields investindo fortemente no contraste entre as vozes brandas e a tapeçaria quase intransponível de sons que ocupam o álbum. Morada de composições essenciais como When You Sleep, Only Shallow e Loomer, Loveless serviria de alimento para uma centena de outros grupos, sejam eles bandas nascidas na década de 1990 ou artistas surgidos no começo dos anos 2000. Grandioso e uma das obras mais importantes já feitas na história do rock, o disco praticamente lançaria o MBV em um hiato obrigatório que só viria a ser rompido duas décadas mais tarde.

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Nevermind

Nirvana
Nevermind (Sub Pop)

Por mais rico e criativo que seja o catálogo de obras que definem 1991, nenhuma conquistou tamanho louvor e adoração do público quanto Nevermind. Segundo registro em estúdio do Nirvana, o álbum é um salto gigantesco em relação àquilo que o trio de Seattle havia testado anos antes, em Bleach (1989). Do clássico Smells Like Teen Spirit ao fechamento amargo/desesperador de Endless, Nameless, da capa icônica às quebras constantes de sons que remetem ao Pixies, poucas vezes o Mainstream e o Underground estiveram tão próximos em uma mesma obra. Reflexo da depressão que corrompia Kurt Cobain, o álbum encaixa na bateria crua Dave Grohl e as linhas de baixo de Krist Novoselic em um esforço de crescimento constante. Vocais ásperos em oposição ao cardápio de melodias particulares, letras sorumbáticas em contraste aos sons explosivos, cada passo dado pelo terreno torto do registro se traduz em incerteza, efeito que o produtor Butch Vig trata de orquestrar com direção precisa ao longo da obra. O princípio não apenas do Grunge, mas de tudo o que ocuparia o rock pelos próximos anos.

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Primal Scream

Primal Scream
Screamadelica (Creation)

No começo de 2011 o semanário inglês NME elegeu Screamadelica, terceiro trabalho de estúdio do Primal Scream como o disco mais drogado da história da música, tomando a dianteira em uma lista que contava com 50 registros, incluindo trabalhos como Revolver dos Beatles e In Utero do Nirvana. Embora a obra-prima de Bobby Gillespie seja de fato um trabalho construído em cima do abusivo uso de substâncias lisérgicas (e pareça a trilha sonora exata para o uso variado dessas mesmas substâncias), o clássico disco lançado em setembro de 1991 está muito além de um mero condensado de composições viajadas e sons projetados para as pistas. Cruzando elementos da dance music dos anos 70, house, música gospel, rock psicodélico, jazz, eletrônica e rock alternativo, o álbum surge a partir da colaboração de uma série de produtores, bandas e diversos outros artistas que montaram samples, elaboraram bases e auxiliaram Gillespie no desenvolvimento de todo o trabalho. O resultado dessa grande somatória de elementos se traduz em um álbum volumoso, perdido em diferentes eras da música e surpreendentemente belo.

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R.E.M.

R.E.M.
Out Of Time (Warner)

Depois da obra-prima Automatic For The People (1992), Out Of Time talvez seja a obra mais significativa do R.E.M. na década de 1990. Concentrado de alguns dos maiores clássicos da banda – como Losing My Religion, Near Wild Heaven e a exagerada Shiny Happy People -, o álbum marca de forma expressiva uma ruptura na carreira do grupo, cada vez mais distante da estética imposta em Murmur (1983), e dono de uma sonoridade aberta ao grande público. Comercialmente bem recebido e com críticas bastante favoráveis, o álbum veio (de forma involuntária) em um sentido de oposição ao que ocupava o rock alternativo naquele momento, resultado que apresentou o grupo de Atlanta a toda uma nova remessa de ouvintes. Abastecido por um catálogo maior de instrumentos, já anunciados em Green (1988), o álbum soa em diversos aspectos como um esboço do registro seguinte, o que de forma alguma minimiza a grandeza de suas composições.

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Saint Etienne

Saint Etienne
Foxbase Alpha (Heavenly)

Quando lançou Foxbase Alpha, em setembro de 1991, o coletivo britânico Saint Etienne parecia funcionar como um catalizador de tudo o que ocupava a música naquele momento. Entre passeios pelo Synthpop, viagens pelos primórdios da House Music, Dance e Ambient Music, o trabalho de estreia da banda londrina resumia parte expressiva das transformações da época sem necessariamente forçar isso, resultado do alinhamento sutil aplicado a cada nova faixa do álbum. Ao longo de 50 minutos, vozes brandas, sons e instrumentos ponderados são encaixados em um loop inventivo de colagens, herança visível de veteranos do Krautrock, mas que encontra um novo tratamento na proposta do grupo inglês. Delineado por clássicos como Only Love Can Break Your Heart e Nothing Can Stop Us, o trabalho viria a ditar as regras da discografia da banda, flutuando sempre entre passagens leves pela eletrônica e acordes doces, típicos do Indie Pop.

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Sebadoh

Sebadoh
III (Homestead)

Com um custo de mil e trezentos dólares, e gravado ao longo de dois finais de semana, III não trouxe apenas um esforço de transformação para a carreira do Sebadoh, mas para o rock alternativo de forma expressiva. Lançado um mês antes da chegada de Nevermind, do Nirvana, o álbum serviu para alertar o público sobre todas as mudanças que ocupavam a música estadunidense naquele momento, fazendo das 23 composições que habitam o registro, uma base para o que seria melhor compreendido dali poucos meses. Versátil, Low Barlow ultrapassa os limites prévios do Dinosaur Jr. para transformar cada composição em um reduto de acerto, boas guitarras e vozes bem posicionadas. Ainda que delimitado por uma atmosfera caseira, o álbum ecoa de forma audível durante toda a extensão do trabalho, esforço claro do produtor Sean Slade, que garante ao disco um delineamento próprio, urgente. Em 2006 o álbum foi relançado, contando com uma carga extra de músicas que acabaram de fora da versão oficial.

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Sepultura

Sepultura
Arise (Roadrunner)

Com um orçamento de 40 mil dólares e gravado sem pressa no estúdio Morrisound, na Flórida, Arise não poderia ser nada menos do que outra obra fundamental para a discografia do Sepultura. Seguindo a boa fase que a banda vinha incorporando desde Beneath the Remains (1989), o quarto registro em estúdio do grupo mineiro é mais do que uma extensão dos projetos anteriores, mas um ponto de maturidade e preparação para o que seria desenvolvido pelos próximos anos. Mesmo que cresça como um resultado da plena cooperação entre os integrantes, o disco abre espaço para que as guitarras de Andreas Kisser se espalhem livremente, ditando os rumos do trabalho em vários momentos. Responsável pelas experimentações que marcam a obra, Igor Cavalera testa diferentes formas de percussão, incorporando desde elementos do Industrial Metal (Desperate Cry), até doses pontuais de ritmos latinos. Com boas vendas, principalmente no exterior, e uma turnê extensa de dois anos, Arise elevou o Sepultura ao status de gigante em seu meio – e até fora dele.

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Slint

Slint
Spiderland (Toutch and Go)

Se existe um trabalho que pode levar o título de precursor e responsável por definir as bases para o que seria compreendido como Pós-Rock, então Spiderland, segundo álbum do Slint assume com louvor esse posto. Dois anos depois do grupo de Louisville, Kentucky ter traçado as bases instrumentais no também essencial Tweez, com o segundo registro em estúdio a banda comandada por Brian McMahan se desprende das possíveis amarras, mobilizando um disco vasto, traçando desde referências voltadas aos primórdios ao punk até doses monumentais de ambientações focadas no rock alternativo. Seja em meio a cantos, berros ou versos declamados, McMahan e os parceiros de banda atravessariam livremente as atmosféricas composições do disco, faixas sempre tomadas por guitarras que vão do introspectivo a imensos paredões sonoros. Embora não interfira de fato na construção do disco, o produtor Brian Paulson parece ser o responsável por cercar as canções dentro de um espaço próprio, amarrando cada uma das seis faixas do álbum de forma a soarem próximas e naturalmente intocáveis.

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Swans

Swans
White Light From The Mouth Of Infinity (Young God)

Mesmo depois de atravessar a década de 1980 em uma das sequências de discos mais provocativas da época, Michael Gira ainda tinha muito o que oferecer. Na sequência do que havia aprimorado em Children of God (1987), White Light From The Mouth Of Infinity mantém o mesmo alinhamento experimental e a relação prévia com o Pós-Punk, o que, nas mãos de Gira, está longe de parecer algo redundante. Ampliando de forma significativa o uso de instrumentos, o músico nova-iorquino e os parceiros de banda se perdem entre pianos, violinos, guitarras épicas e um bem posicionado coro de vozes. Herdando elementos do rock progressivo e até do Folk, o músico amarra tudo dentro de um cercado obscuro, ambiente natural para letras carregadas de misticismo, confissões e aberturas para um cenário que parece crescer na mente de seu realizador. Desenvolvido de forma quase conjunta ao registro seguinte, Love of Life (1992), o álbum é a entrada definitiva de Gira nos anos 1990, posição que, até o fim da década, garantiria bons exemplares do Swans.

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Talk Talk

Talk Talk
Laughing Stock (Polydor)

Poucos artistas representam com tamanha beleza e entendimento o significado da palavra “evolução” quanto os ingleses do Talk Talk. Se em começo de carreira a banda londrina se manifestava como um exemplar criativo na soma de artistas da New Wave, a partir do melancólico The Colour Of Spring (1986) uma série de transformações se apoderaram do trabalho do grupo britânico. Cada vez mais próximo do Art Rock e de experimentações que se voltavam abertamente ao Jazz, o coletivo trouxe em Laughing Stock uma premissa do que viria a guiar boa parte da cena alternativa na década de 1990. Continuação sublime das mesmas tramas atmosféricas expostas em Spirit Of Eden (1988), o trabalho traz no esforço ambiental o sustento para cada uma das faixas tratadas pelo disco, composições que ultrapassam os nove minutos com pura leveza e colagens musicais desprendidas do óbvio. Assumidamente inspirado no trabalho de Miles Davis, o registro ultrapassa os limites jazzísticos para brincar com a música clássica, ruídos e transições ambientais pelo Krautrock, percurso torto que acabou atraindo parte total da crítica, mas o completo desprezo do público.

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Teenage Fanculb

Teenage Fanclub
Bandwagonesque (Creation)

Fosse a crescente presença dos ruídos no Rock Alternativo ou mesmo a busca por um som de natureza caótica, no começo dos anos 1990 o uso de melodias cuidadosas parecia limitado a um grupo muito específico de bandas e ouvintes. Sem parecer distante de tudo o que ocupava o cenário musical daquele instante, o grupo escocês Teenage Fanclub fez de Bandwagonesque uma morada para boas guitarras e harmonias vocais intencionalmente cantaroláveis. Terceiro registro em estúdio da banda, o trabalho conseguiu resgatar com identidade uma série de acertos implantados por grupos veteranos como Big Star e The Replacement, trazendo o Power Pop de volta aos holofotes. Desenvolvido em um sintoma de forte unidade entre os integrantes, o trabalho intercala colaborações, coleciona riffs memoráveis e revive experiências emocionais em cada uma das faixas que o sustentam. Seria apenas o princípio de uma sequência de lançamentos memoráveis da banda, incluindo obras-primas como Thirteen (1993) e Grand Prix (1995).

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Goat

The Jesus Lizard
Goat (Touch and Go)

Goat é uma peça rara do rock alternativo que só poderia ter nascido em 1991. Com produção coesa de Steve Albini, referências condensadas do Punk, Noise e Hardcore, o segundo trabalho de estúdio da banda texana The Jesus Lizard é uma evolução nítida em relação ao debut Head, apresentado um ano antes. Passo seguro para a série de lançamentos que a banda viria a desenvolver com maturidade até o fim da mesma década, o disco cruza densas linhas de baixo, guitarras instáveis e as vozes plurais de David Yow em um esforço distinto em relação ao que movimentava o cenário naquele instante. Entre obras como Monkey Trick, Mouth Breather e Seasick, a banda desenvolve um cenário de limites próprios, ambiente este que vai se esfarelando ao longo da obra. Embora pouco conhecido do grande público, Goat serviu para alimentar conceitualmente uma série de lançamentos futuros, sendo parte importante do que orienta o rock californiano atual.

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The Orb

The Orb
The Orb’s Adventures Beyond the Ultraworld (Big Life)

Bastaria ao duo formado por Alex Paterson e Thomas Fehlmann o primeiro registro em estúdio pelo The Orb para que a herança atmosférica da década de 1990 fosse cuidadosamente propagada. Lançado em Agosto de 1991, The Orb’s Adventures Beyond the Ultraworld é um verdadeiro passeio instrumental. Com quase duas horas de experimentos, colagens de referências e samples que dançam de acordo com as incorporações da dupla, o trabalho cresce em um misto de Acid House, Dub, Hip-Hop e plena absorção de marcas espalhadas pela música da década de 1970. São samples de Kraftwerk, Lee “Scratch” Perry, Brian Eno e todo um catálogo de artistas que surgem e desaparecem de acordo com as orquestrações suaves da dupla. Etéreo até o último segundo, o disco concentra no bloco imenso de 10 composições um agregado de essência futurística e ainda assim presente. Um som que parece flutuar pelo espaço (Back Side of the Moon), ao mesmo tempo em que mantém o corpo todo preso ao chão (Earth).

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.