Aquecimento: “De Graça”, Marcelo Jeneci

/ Por: Cleber Facchi 25/09/2013

Por: Cleber Facchi

Marcelo Jeneci

Um compilado de sensações melancólicas e sublimes adornadas pelo jogo orquestral dos instrumentos. Quando lançado em 2010, Feito Pra Acabar, na contramão do próprio título, firmou durabilidade e fez de Marcelo Jeneci um dos nomes mais queridos da nova safra da MPB. Com os ouvidos apontados para a década de 1970 e outras fases da produção nacional, mas capaz de reproduzir todo esse efeito com um toque de novidade, o cantor e compositor paulistano fez do registro um passo seguro dentro da própria carreira, limites que o músico parece inclinado a romper em De Graça, segundo álbum de estúdio e uma quebra natural em relação ao debut. Consumido pelo efeito da primavera, como já anunciou em vídeo, o álbum aporta em um universo distinto em relação ao último disco, pintado por cores, tendências e sons que a seção Aquecimento tenta catalogar agora.

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Marcelo Jeneci – De Graça

Primeiro single do novo álbum, a faixa-título assume de forma evidente todas as transformações que ocupam a mente de Marcelo Jeneci. Com produção de Kassin e a interferência de Adriano Cintra (ex-CSS), a música rompe de maneira brusca com o cenário épico/melancólico proposto em Feito Pra Acabar (2010), carregando na estética tropical e na letra intencionalmente simples um outro lado – talvez impossível de ser previsto – do compositor. O que antes era cercado por melodias volumosas e instrumentais manifestos de forma extensa, agora se entrega à simplicidade.

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Kassin – Sonhando devagar (2011, Coqueiro Verde)

Convidado para assumir a produção do disco, Kassin é uma das figuras mais voláteis da cena nacional em termos de composição. Depois de já ter trabalhado com os cariocas do Los Hermanos, brincado coletivamente com Moreno Veloso e Domenico Lancellotti no +2, além de ter assumido a construção de uma série de obras significativas da música brasileira recente, o músico traz para a obra de Jeneci um pouco do universo exposto em Sonhando Devagar. Álbum solo de 2011, o registro é uma coletânea dos delírios ora experimentais, ora abastecidos pela música pop que tanto potencializam a atuação do produtor.

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Marcelo Jeneci – Copo d’água

O efeito veloz das guitarras, pequenas interferências eletrônicas e sons tropicais podem até passar como um resultado inédito para quem chega agora em De Graça, entretanto, basta voltar os ouvidos para Copo d’Água, um dos hits do álbum passado, para ver como tudo isso já foi testado. Do posicionamento plástico dos vocais aos ruídos marcados por colagens específicas, nada do que caracteriza o presente single (e consequentemente o próprio álbum) parece fugir do controle do músico, que, ao que tudo indica, sabe exatamente onde está pisando.

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Adriano Cintra (CSS/Madrid/Thee Butchers’ Orchestra)

Embora conhecido pelo trabalho com o Cansei de Ser Sexy, o paulistano Adriano Cintra acumula desde o fim da década de 1990 uma sequência de obras pontuadas (com acerto) pela diversidade. Do Garage-Punk do Thee Butchers’ Orchestra ao Folk sombrio do Madrid, cada registro assumido pelo músico/produtor força com acerto o gênero em que está inserido. Responsável pela construção das batidas, efeitos e de parte da “estética” do novo álbum de Jeneci, Cintra torna evidente logo nos primeiros instantes de De Graça o quanto a própria essência pode interferir na construção final o álbum.

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Luiz Sérgio Carlini

Assim como o debut de 2010, De Graça é uma obra abastecida por pequenas colaborações. Dentre os convidados que integram o novo time de Marcelo Jeneci, está o guitarrista paulistano Luiz Sérgio Carlini. Um dos nomes mais importantes do rock tupiniquim, Carlini fundou em meados da década de 1970 o Tutti Frutti, coletivo que, ao lado de Rita Lee, fez nascer algumas das canções mais curiosas do período, caso de Agora Só Falta Você, Ovelha Negra ou mesmo uma sequência de outros clássicos – antigos e recentes – arquitetados em parceria com artistas como Titãs, Lobão e Erasmo Carlos.

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Erasmo Carlos – Carlos, Erasmo (1971, Universal)

Por falar no Tremendão, o veterano do rock nacional não é apenas figura garantida na construção final do novo álbum, como já anda desfilando por aí em uma série de apresentações ao vivo ao lado de Jeneci. Influência confessa paulistano, o parceiro de Roberto Carlos reverbera de maneira nítida na composição do primeiro álbum do cantor e talvez ocupe uma presença ainda maior em De Graça. Caso escolha se aventurar pela rica (e extensa) discografia do músico carioca, Carlos, Erasmo, de 1971, talvez seja o caminho mais seguro ao ouvinte novato, além, claro de uma das obras mais significativas da produção nacional dos anos 1970.

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Ritmo Regionais

Quem se assustou com a presença dos sons típicos da música nortista em De Graça, talvez tenha ouvido pouco o trabalho de Jeneci. Basta voltar os ouvidos para o toque sertanejo, em Pra Sonhar, ou o romantismo brega, instalado em Dar-Te-Ei, para perceber o quanto os diferentes aspectos da música brasileira interferem na obra do cantor. Jeneci, que começou a carreira tocando sanfona na banda de Chico César, e até já escreveu músicas para cantores como Leonardo (acima), sempre foi um profundo interessado nas diferentes tendências da cena nacional. O novo álbum deve potencializar algum aspecto específico dessa preferência.

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Felipe Cordeiro – Kitsch Pop Cult (2012, Na Music)

Como a fluidez acalentada da faixa-título logo entrega, o Pará e toda a cultura local serve como um para o cantor durante a construção do novo álbum. A influência, que passa pela própria obra solo de Kassin e até esbarra em alguns conceitos esquizofrênicos de Adriano Cintra com o CSS, distancia Jeneci do território uniforme do último disco, o que talvez acrescente uma carga extra de cores à obra – já marcada na capa do trabalho. De Gaby Amarantos ao trabalho de Felipe Cordeiro, quem mergulhar na colorida feira musical paranaense talvez encontre boas respostas para o novo álbum do paulistano.

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Caetano Veloso – Cinema Transcedental (1979, Universal)

As vocalizações, a forma como as guitarras se encaixam aos versos e as pequenas interferências tropicais não conseguem esconder: Caetano Veloso habita na presente fase de Marcelo Jeneci. Enquanto Feito Pra Acabar esbanjava uma série de marcas da essência de Roberto e Erasmo Carlos, com o segundo álbum os rumos passam a ser outros e lembrar de Cinema Transcedental, ou qualquer obra do cantor nascida na segunda metade da década de 1970, é algo mais do que visível.

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Verão, Outono, Inverno e…

Apresentando parte dos conceitos que abastecem o novo disco, o vídeo Começo de Tudo revela na passagem das estações uma série de marcas, efeitos e interferências que abastecem a construção de De Graça. Construídas no verão, montadas no outono e gravadas no inverno, as canções devem florescer coloridas na primavera, algo que o primeiro single já manifesta com precisão, mas que todo um catálogo de criações inéditas ainda escondem. Com estreia prevista para Outubro de 2013, o álbum conta com lançamento pelos selos Slap Musica e Urban Jungle.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.