Cozinhando Discografias: Dirty Projectors

/ Por: Cleber Facchi 19/11/2012

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A sessão Cozinhando Discografias consiste basicamente em falar de todos os álbuns de um artista ignorando a ordem cronológica dos lançamentos. E qual o critério usado então? A resposta é simples, mas o método não: a qualidade. Dentro desse parâmetro temos uma série de fatores determinantes envolvidos, que vão da recepção crítica do disco no mercado fonográfico, além, claro, dentro da própria trajetória do grupo e seus anteriores projetos. Vale ressaltar que além da equipe do Miojo Indie, outros blogs parceiros foram convidados para suas específicas opiniões sobre cada um dos trabalhos, tornando o resultado da lista muito mais democrático e pontual.

Para a terceira edição da coluna vamos “reorganizar” a discografia do coletivo nova-iorquino Dirty Projectors, que chega ao Brasil no dia 30 de novembro para mais uma apresentação do repertório experimental e pop que define a trajetória da banda.

Aviso: Não concordou com a ordem dos discos? Simples, mantenha a calma e use os comentários. Aproveite para indicar qual banda você gostaria que estivesse na próxima sessão.

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 #07. Morning Better Last!
(2003, States Rights)

Com quase uma hora de duração e mais de 20 músicas armazenadas, Morning Better Last! quebra o que seria uma simples compilação de tudo que David Longstreth produziu antes da formação do Dirty Projectors. Totalmente artesanal e menos expansivo do que o anterior The Glad Fact, o álbum flutua em um ambiente de ideias parcialmente desordenadas, avulsas, mas ainda assim instigantes na maneira como o artista rompe com a sonoridade do que estava em voga naquele instante. Sem o mínimo compromisso de parecer uma obra concisa, cada faixa quebra de forma direta com o que fora promovido dentro da composição anterior, transformando o disco em uma imensa solução de altos e baixos instrumentais e poéticos. Construído quase inteiramente em cima de voz e guitarra, o álbum encontra nos parcos encaixes de percussão uma forma de engrandecer a estrutura do trabalho. Embora menor em termos de qualidade – principalmente quando observamos os registros mais recentes da banda -, o disco passa longe de se manifestar como um descartável ou que não complemente o trabalho do grupo, naquele instante diluído na presença única de Longstreth.

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 #06. The Glad Fact
(2003, Western Vinyl)

Quando formado no começo dos anos 2000, o Dirty Projectors nada mais era do que um imenso emaranhado das ideias, necessidades e aspirações que pairavam pela mente do inquieto David Longstreth. Exemplo mais claro disso está na execução do primeiro “trabalho oficial” do músico, The Glad Fact, lançado em 2003. Imenso em conceitos, músicas e segmentos instrumentais, o álbum parece amarrar de forma ilógica todas as influências do compositor, que soa como se David Byrne cantasse Beyoncé, fazendo uso de uma sonoridade caseira que muito lembra Daniel Johnston. Embora irregular, o disco trouxe bases sólidas para o que seria aprimorado posteriormente pelo músico, como os vocais alongados, o ritmo torto e a constante quebra de ritmos, marca de cada nova canção abordada no decorrer do trabalho. Nascia o Dirty Projectors, e com ele uma frente de registros nem sempre fáceis de serem absorvidos ou compreendidos pelo público.

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 #05. Slaves’ Graves and Ballads
(2004, Western Vinyl)

Slaves’ Graves and Ballads é um trabalho que funciona para além do tempo de sua própria concepção. Concentrado de faixas avulsas lançadas por Dave Longstreth e os parceiros de banda ao longo de 2004, o registro marca a transição entre o indie rock esquizofrênico e por vezes orquestral dos primeiros registros, para a sonoridade que viria a delimitar o Dirty Projectors tal qual conhecemos hoje – a própria capa serve como referência para o que a banda apresentou em 2009 com Bitte Orca. Apoiado em melodias quebradas, arranjos complexos e os vocais até então direcionados inteiramente em cima dos exageros de Longstreth, o registro se dissolve em um sem número de formas e encaixes sonoros despretensiosos, como se a banda ou seu idealizador ainda buscasse por uma solução instrumental e lírica totalmente própria. Mezzo caseiro, mezzo profissional, o álbum se destaca pela plena inclusão de arranjos de cordas, elemento que engrandece e garante melhor acabamento ao registro.

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 #04. The Getty Address
(2005, Western Vinyl)

Apresentado ao público em abril de 2005, The Getty Address rompe totalmente com a sonoridade outrora convencional da banda, arrastando Longstreth (não mais única mente por trás do projeto) para uma sonoridade de fato particular do coletivo. Utilizando de climatizações tribais – evidentes logo na canção de abertura do disco, I Sit on the Ridge at Dusk -, guitarras não óbvias e efeitos de percussão explorados de maneira ampliada, o disco solidifica uma série de marcas do grupo, entre eles os vocais em coro. Ainda que o líder do projeto assuma a condução vocálica do trabalho do princípio ao fecho, os apoios suaves das vozes femininas tendem a ampliar a sonoridade do álbum, que em cada curva assume uma nova tonalidade. Como se fosse pensado de forma única, faixa após faixa o disco mergulha em uma mesma estrutura instrumental, como se tudo fosse parte de uma imensa e única composição, resultado que se reflete em cada instante do disco. O álbum é o último registro dentro do selo Western Vinyl e talvez o último lançamento “não profissional” da banda.

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 #03. Rise Above
(2007, Dead Oceans)

Quando voltamos os ouvidos para Bitte Orca e Swing Lo Magellan fica a sensação de que todos os trabalhos do Dirty Projectors sempre foram tocados pela limpidez das vozes e da instrumentação. Um erro. Somente com o lançamento de Rise Above que Dave Longstreth e os agora fixos parceiros de banda conseguiram entender do que se tratava o projeto. Bem delimitado, o álbum explora em 11 faixas tudo aquilo que faz do grupo um dos mais importantes da cena atual. Dos vocais açucarados de Amber Coffman, passando pela linha de baixo marcante de Nat Baldwin, cada instante dentro do disco posiciona o coletivo dentro de uma proposta talvez impossível de ser prevista no surgimento do grupo. Melódico, experimental e curioso na maneira como brinca com as palavras, o registro mergulha no Afrobeat e emerge na soul music, resultando em uma sucessão de criações memoráveis e essenciais para tudo aquilo que define do Dirty Projectors ou mesmo outros grandes artista do gênero – Vampire Weekend que o diga.

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 #02. Swing Lo Magellan
(2012, Domino)

Quem talvez pudesse questionar a qualidade instrumental e lírica que banha os trabalhos do Dirty Projectors teve de se calar quando Swing Lo Magellan foi lançado. Embora seja uma continuação clara do que a banda havia testado três anos antes com Bitte Orca, cada textura, voz e som que preenche o novo disco arrasta o coletivo nova-iorquino para uma proposta distinta. Mais comercial que o trabalho que o precede, ao alcançar o sexto álbum ”oficial”, o grupo não somente derrama uma sucessão de sons peculiares, como promove um trabalho que parece íntimo do grande público, resultado incontestável em faixas como Dance For You, The Socialites e principalmente no hit Gun Has No Trigger. Mesmo sem os vocais coesos de Angel Deradoorian, o álbum segue dentro do mesmo limite assertivo entre as vozes de Longstreth e Amber Coffman, resultando em um projeto muito mais atrativo em se tratando da execução dos vocais. Além do disco, um EP – About To Die – e um curta-metragem – Hi Custodian – foram preparados para a divulgação do álbum.

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 #01. Bitte Orca
(2009, Domino)

O Dirty Projectors já havia se transformado por completo em 2007 durante o lançamento de Rise Above, entretanto, o que ninguém imaginava é que o grupo voltasse com um registro ainda mais rico e inventivo passado tão pouco tempo. Lançado em 2009, Bitte Orca é o trabalho que de fato tornou pública e mundialmente conhecida a banda comandada por Dave Longstreth. Cruzando elementos da World Music (sons que fariam David Byrne se sentir orgulhoso), melodias acessíveis que brincam com a soul music e todo um jogo de referências instrumentais jamais tímidas ou previsíveis, o álbum segue de forma crescente, com Longstreth mergulhando fundo na tríade de vozes femininas que o acompanham até o encerramento da obra. Recheado por nove composições de grandeza (e beleza) incontestável, temos nos vocais em ritmo semi-tribal e nas guitarras tramadas de forma hipnótica as bases para que faixas como Temecula Sunrise, Stillness Is the Move e Useful Chamber cresçam sem limites, puxando o ouvinte para dentro desse imenso jogo de referências e percursos não óbvios. Ao lado de Merriweather Post Pavilion do Animal Collective e Veckatimest de Grizzly Bear é provavelmente um dos trabalhos mais influentes da recente fase da música norte-americana, feito que é reforçado em cana nova audição do disco.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.