Cozinhando Discografias: Michael Jackson

/ Por: Cleber Facchi 04/05/2015
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A seção Cozinhando Discografias consiste basicamente em falar de todos os álbuns de um artista, ignorando a ordem cronológica dos lançamentos. E qual o critério usado então? A resposta é simples, mas o método não: a qualidade. Dentro desse parâmetro temos uma série de fatores determinantes envolvidos, que vão da recepção crítica do disco no mercado fonográfico, além, claro, dentro da própria trajetória do grupo e seus anteriores projetos. Além da equipe do Miojo Indie, outros blogs parceiros foram convidados para suas específicas opiniões sobre cada um dos trabalhos, tornando o resultado muito mais democrático.

Dono de algumas das maiores obras do pop, Michael Jackson é o novo escolhido da seção Cozinhando Discografias. Para a montagem da lista – organizada do pior para o melhor lançamento de estúdio artista -, apenas trabalho oficiais, entregues ao público quando o artista ainda estava vivo. Logo, nada de coletâneas, álbuns de remixes ou obras póstumas. Do primeiro trabalho em carreira solo, Got To Be There (1972), ao último lançamento de inéditas, Invincible (2001), abaixo você encontra nosso ranking particular do Rei do Pop.

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#10. Ben
(1972, Motown)

Ainda que Got to Be There (1972), primeiro registro solo de Michael Jackson não tenha sido um grande sucesso comercial, Berry Gordy e demais executivos da Motown não pensaram duas vezes, apresentando poucos meses depois o segundo álbum do jovem cantor, Ben. Na época com 14 anos, Jackson parecia provar – mais uma vez – que a pouca idade em nada prejudicava sua atuação em estúdio, efeito da voz limpa, precisa e clara desenvoltura expressa em todo o catálogo de faixas da obra. Inaugurado de forma melancólica pela faixa-título do registro, o segundo álbum solo do cantor – ainda membro do The Jackson 5 – está longe de parecer uma obra sofredora. Em meio a regravações apaixonadas como My Girl e faixas de temática esperançosa, caso de People Make the World Go ‘Round e What Goes Around Comes Around, Jackson e um time enorme de produtores se orientam de forma a arquitetar uma obra sorridente, plástica e naturalmente pop. Uma fuga leve da Disco Music que orientava o garoto e sua própria família na época, além de uma passagem segura para o R&B/Soul que viria a orientar o cantor até o final dos anos 1970.

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#09. Forever, Michael
(1975, Motown)

O refrão instalado na faixa de abertura de Forever, Michael (1975), We’re Almost There – “estamos quase lá” – por vezes soa como um “recado” sobre o futuro de Michael Jackson. Último trabalho do cantor lançado pela Motown, o álbum de fluidez melancólica, faixas densas e número limitado de singles só não contou com uma maior aceitação do público e crítica, por conta do boicote da própria gravadora. Com o The Jackson 5 deixando a Motown para seguir com a Epic Records, Berry Gordy, responsável pela gravadora, interpretou a ruptura como uma afronta pessoal, proibindo o grupo de utilizar o nome original – registrado sob domínio da Motown -, forçando o quinteto a trabalhar com um novo título, The Jacksons. Grande prejudicado, Michael não teve o quarto álbum solo prensado e distribuído em diversos países. Somente no começo dos anos 1980, com o enorme sucesso de Off the Wall (1979), que algumas das faixas do registro contaram com o apoio da gravadora. Embora distante do criativo acervo de Jackson na década de 1980, o álbum concentra uma série de boas canções, caso da pop Just A Little Bit Of You e da melancólica One Day In Your Life.

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#08. Music & Me
(1974, Motown)

A imagem “bucólica” estampada na capa de Music & Me funciona como resumo do som incorporado por Michael Jackson na época. Lançado em um período de transição dentro da carreira e vida do jovem cantor – incomodado com as transformações do próprio corpo na adolescência, principalmente a voz -, o terceiro álbum solo de Jackson sustenta na utilização de temas acústicos e pouco dançantes a passagem para um novo universo de possibilidades. Sob a influência nítida de Marvin Gaye e álbuns como What’s Goin On (1972) e Let’s Get It On (1973), Jackson, orientado pelo produtor Hal Davis, caminha de forma sóbria em meio a temas entristecidos, arranjos de cordas e um coro de vozes complementar, como um reforço ao som incorporado um ano antes no álbum Ben. Dividido em duas metades, o álbum concentra no primeiro um catálogo acústico e liricamente sofredor, reservando para a segunda metade da obra, a partir de Doggin’ Around, uma sonoridade quase dançante, estrutura rompida apenas na confessional canção de encerramento da obra. Como o próprio Jackson naquele momento, uma obra curiosa, lançada em um período de nítida transição.

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#07. Got To Be There
(1972, Motown)

Com o sucesso do The Jackson 5 em alta desde a década de 1960, investir na carreira solo de cada integrante da família Jackson parecia ser uma aplicação de retorno garantido e (quase) imediato para qualquer gravadora. Mesmo que Got To Be There, estreia solo do infante Michael Jackson não tenha se mostrado um estrondoso sucesso de vendas, decepcionando parte dos executivos da Motown, a segura posição do cantor nas paradas de sucesso garantiria uma sequência de novos lançamentos em fase solo. Projetado por Hal Davis e Willie Hutch, o debut funciona como um retrato doce da música negra que ocupava o período. Coros de vozes manipulados de forma sutil, orquestrações, pianos e um fino toque de leveza ocupa todas as lacunas da obra, tão íntima das transformações que sustentavam a música da época, como de toda a essência da soul music nos anos finais da década de 1960. Recheado por pequenos clássicos – como Rockin’ Robin, Ain’t No Sunshine e I Wanna Be Where You Are -, Got To Be There viria a definir toda a base do trabalho Jackson até o meio dos anos 1970, garantindo experiência e o aprimoramento técnico/vocal de Jackson.

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#06. HIStory: Past, Present and Future, Book I
(1995, Epic)

Primeiro registro lançado por Michael Jackson desde as denúncias de abusos sexuais do cantor, HIStory: Past, Present and Future, Book I é uma obra marcada pelos excessos e números elevados. Morada de um dos clipes mais caros da história – Scream, dueto com a irmã Janet Jackson que custou aproximadamente 7 milhões de dólares -, além de um gasto de 30 milhões de dólares em publicidade e viagens ao redor do globo para a divulgação do trabalho – incluindo o Brasil, onde Jackson gravou o clipe de They Don’t Care About Us -, o nono álbum solo do “Rei do Pop” nasce como um passeio pela carreira e diferentes fases do músico. São 30 composições divididas em dois registros. Na primeira metade, um acervo de clássicos (antigos e recentes) do cantor; faixas remasterizadas que se estendem de Off the Wall (1979) até o começo dos anos 1990 com Dangerous (1991). Na segunda metade, um catálogo de canções inéditas como Stranger in Moscow, Tabloid Junkie e Scream, além, claro, da releitura de músicas como Come Together, clássico dos Beatles. De concepção instável, HIStory parece refletir a mente instável de Jackson durante o período, depressivo, viciado em compras e isolado por conta da pressão da mídia.

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#05. Invincible
(2001, Epic)

O conceito “irregular” aplicado em HIStory: Past, Present and Future, Book I (1995), então último disco de inéditas de Michael Jackson, parece evitado a todo custo no interior de Invincible. Quase uma resposta aos ataques que vinha sofrendo desde o começo da década de 1990 – efeito das acusações de abusos sexuais praticados contra crianças -, o último álbum de estúdio de Jackson reflete um artista perturbado, mas não menos provocativo, intenso e ainda focado em recuperar a boa forma dos trabalhos apresentados na década de 1980. Naturalmente extenso, são quase 80 minutos de duração e 16 longas faixas, o álbum parece seguir exatamente de onde Jackson parou em Dangerous, replicando elementos do Hip-Hop, Soul, R&B e Eletrônica sem necessariamente escapar da fluidez pop conquistada desde o ápice em Thriller (1982). Inspiração óbvia para o trabalho de Justin Timberlake, The Weekend e outros gigantes do “neo-R&B”, Invincible pode não replicar o mesmo acerto explícito na juventude de Jackson, entretanto, garante ao público um acervo mais do que satisfatório de (novos) clássicos assinados pelo cantor, caso de Break of Dawn, Speachless, Butterflies e Heartbreaker.

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#04. Dangerous
(1991, Epic)

Mesmo em um ano de grandes lançamentos musicais, como Nevermind do Nirvana e Achtung Baby do U2, foi Dangerous o álbum que de fato atingiu parte expressiva do grande público. Montado em uma estrutura completamente distinta em relação ao trabalho anterior, Bad (1987), o oitavo álbum solo de Jackson pode até “desacelerar”, mas parece longe de perder a energia exposta pelo músico desde o dançante Off The Wall (1979). De um lado, o peso das batidas e o flerte explícito com o Hip-Hop, tendência solucionada desde Jam e naturalmente repetida em faixas como She Drives Me Wild e Can’t Let Her Get Away. No outro oposto, a sempre curiosa relação do cantor com o Rock, em Dangerous, representado com acerto nas guitarras dançantes de Black Or White, crueza explícita em Why You Wanna Trip On Me e até na participação do guitarrista Slash (Guns ‘n’ Roses) na soturna Give In To Me. Em geral, um catálogo de faixas extensas, com mais de seis minutos de duração, preferência que em nenhum momento prejudicou o desempenho de Jackson, no topo das paradas de sucesso por mais de três anos. Como explícito na sequência de lançamentos, o último grande álbum do cantor.

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#03. Bad
(1987, Epic)

Michael Jackson não queria errar. Com Thriller (1982) se transformando no álbum mais vendido de todos os tempos, foi preciso tempo até que o cantor se mostrasse capaz de produzir outra obra de efeito e grandeza similar. Não por acaso, Bad, sétimo registro solo do artista, precisou de cinco anos até ser concluído, espera compensada com um dos catálogos mais marcantes de toda a carreira do músico. São nove singles recebidos de forma eufórica pelo público – I Just Can’t Stop Loving You, Bad, The Way You Make Me Feel, Man in the Mirror, Dirty Diana, Another Part of Me, Smooth Criminal, Leave Me Alone e Liberian Girl -, acervo que posicionou Jackson com destaque no topo das paradas de sucesso por mais de dois anos. Raivoso e enérgico, fazendo valer o título do próprio trabalho, Bad confirma a versatilidade do cantor, capaz de fragmentar o R&B/Soul em diferentes peças eletrônicas, espalhando vozes e arranjos – mais uma vez comandados por Quincy Jones – de forma urgente, sempre pegajosa. Da abertura ao fechamento, difícil escapar das artimanhas de Jackson, provocativo e ainda mais íntimo do panteão da música pop, confirmando que todo o sucesso conquistado no álbum de 1982 ainda estava longe do fim.

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#02. Off The Wall
(1979, Epic)

Em 1978, quando entrou em estúdio para as gravações de Off The Wall, Michael Jackson não tinha a completa noção do que estava procurando, porém, sabia exatamente o que não queria parecer: com o The Jackson 5. Para a produção do primeiro álbum solo dentro da Epic Records, o artista contou com a produção e colaboração de Quincy Jones, produtor que se ofereceu para trabalhar depois que Michael pediu indicações de outros produtores a Jones durante as gravações do musical The Wiz (1978). Curva rápida em relação ao som projetado até o último álbum de estúdio do artista, Forever, Michael (1975), o registro não apenas rompe com a essência prévia do cantor, como estabelece uma série de regras para o R&B-Soul-Pop que orientara toda a produção musical na década de 1980.

Flexível e simples, o álbum carregado de sintetizadores, baixo sedutor e guitarras funkeadas mais parece uma coletânea de hits, tamanha quantidade de acertos e faixas pegajosas encaixados em cada brecha do trabalho. De referências ao filme Star Wars – Uma Nova Esperança (1977) em Don’t Stop ‘Til You Get Enough, passando pelo catálogo de músicas assinadas por Paul McCartney (Girlfriend) e Rod Temperton (Rock with You, Burn This Disco Out), além da sequência de canções autorais (Workin’ Day and Night, Get On The Floor), Michael Jackson acabava de alcançar a própria maturidade, pavimentando um caminho seguro para a sequência de obras que ainda estavam por vir.

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#01. Thriller
(1982, Epic)

As guitarras de Eddie Van Halen em Beat It, o dueto com Paul McCartney em The Girl Is Mine, a linha de baixo precisa em Billie Jean e, claro, o impressionante número de 110 milhões de cópias vendidas no mundo todo – 40 milhões apenas no período de lançamento da obra. Não importa a direção, para onde quer que você aponte os olhos e ouvidos em Thriller (1982), tudo soa como acerto e reluz como ouro. Segundo produto da resolvida parceria entre Michael Jackson e Quincy Jones, o sucessor de Off The Wall (1979) conseguiu não apenas superar os limites do próprio criador, como transportou Jackson para um posto poucas vezes assumido dentro da música: o de “Rei do Pop”. Quantos discos você conhece em que todas as faixas são hits em potencial? De fato, das nove canções do sexto álbum solo de Michael Jackson, sete foram lançadas como singles, sequência de composições que garantiram a presença do cantor nas paradas de sucesso até o lançamento do disco seguinte, Bad, obra apresentada cinco anos mais tarde. Beat It, Baby Be Mine, P.Y.T. (Pretty Young Thing) ou mesmo a faixa-título e seu clipe icônico, o acerto está por todas as partes.

Explícito resultado da época em que foi produzir, Thriller passeia em meio a sintetizadores grudentos, vozes em coro e guitarras projetadas para as pistas. Uma mistura dançante e leve que segue em ritmo crescente da abertura (com Wanna Be Startin’ Somethin’) ao fechamento (em The Lady In My Life). Natural sequência ao jogo de referências testadas por Jackson e Jones três anos antes, Thriller assume um caráter de “urgência” talvez maior que o antecessor, concepção reforçada pelo acervo limitado de canções, sempre curtas e convidativas. Recepcionado de positiva por parte expressiva do público e crítica, com Thriller Michael Jackson levaria para casa uma sequência de oito prêmios Grammy, superando o descontentamento do trabalho anterior, o injustiçado Off The Wall, indicado em duas categorias e vencedor em apenas uma delas.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.