Cozinhando Discografias: Wilco

/ Por: Cleber Facchi 04/06/2013

Por: Cleber Facchi

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A seção Cozinhando Discografias consiste basicamente em falar de todos os álbuns de um artista ignorando a ordem cronológica dos lançamentos. E qual o critério usado então? A resposta é simples, mas o método não: a qualidade. Dentro desse parâmetro temos uma série de fatores determinantes envolvidos, que vão da recepção crítica do disco no mercado fonográfico, além, claro, dentro da própria trajetória do grupo e seus anteriores projetos. Vale ressaltar que além da equipe do Miojo Indie, outros blogs parceiros foram convidados para suas específicas opiniões sobre cada um dos trabalhos, tornando o resultado da lista muito mais democrático e pontual.

Um dos grandes ícones do Alt. Country e banda surgida em meados da década de 1990, o Wilco é a escolhida da nova seção. Com uma das discografias mais ricas de toda a presente safra da cena norte-americana, a banda comandada por Jeff Tweedy acumula em oito registros de estúdio uma das obras mais dolorosas e inventivas já lançadas. São registros que mergulham na amargura do cancioneiro country, mas que mantém firme o toque contemporâneo das melodias, referências que vez ou outra esbarram em ruídos e porções mais experimentais do gênero.

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A.M.

#08. A.M.
(1995, Sire/Reprise)
Com sete anos de atuação e quatro bons discos, o Uncle Tupelo, banda inicial de Jeff Tweedy, chamou as atenções dentro da cena Alternative Country que se espalhava pelos Estados Unidos. Com o desfecho do grupo em 1994, Tweedy não tardou em dar vida a um novo projeto, transformando o Wilco e mais especificamente o disco A.M. uma quase continuação do que havia testado previamente. Lançado em um ano em que o rock alternativo tomava conta de toda a produção musical, o registro de estreia do grupo de Chicago, Illinois funciona como uma oposição ao que Radiohead, PJ Harvey, Pavement e tantos outros pareciam inclinados a desenvolver naquele instante. Por se tratar de uma nítida obra de descoberta, cada etapa do álbum soa banhada pelo frescor e a timidez, ao mesmo tempo em que relances de maturidade se aconchegam despretensiosos. Embora passe despercebido em boa parte das vezes, o registro concentra um catálogo primoroso de faixas, bases para o que a banda viria a desenvolver logo no ano seguinte com Being There.

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Sky Blue Sky

#07. Sky Blue Sky
(2007, Nonesuch)

Jeff Tweedy e os parceiros de banda precisavam respirar, e foi isso que eles alcançaram em Sky Blue Sky. Obra mais comportada e acessível de toda a trajetória da banda, o disco funciona como uma reaproximação do grupo com o universo bucólico de começo de carreira, algo que parecia esquecido passadas as transformações impostas em Summerteeth. De forte apelo folk, o disco passeia pela calmaria dos vocais e instrumentos em entalhes brandos, propósito que na maior parte do tempo subtrai os ruídos impostos em A Ghost Is Born (2004). Ainda assim estão lá algumas das composições mais expressivas do grupo, caso de Impossible Germany e o solo caricato que cresce em seu interior, ou mesmo a apaixonante Please Be Patient With Me, uma das faixas mais sutis de toda a composição da banda. Com produção assinada pelo próprio grupo, o registro parece crescer dentro de um ambiente familiar, confortável, transformando o álbum em um encontro de amigos que parecem interessados em partilhar as próprias dores e comoções.

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Wilco

#06. Wilco (The Album)
(2009, Nonesuch)

Passado o regresso às melodias solares de Summerteeh e toda a ambientação bucólica que alimentou Sky Blue Sky, em 2009 a necessidade de Jeff Tweedy e seus parceiros era de experimentar e possivelmente preparar terreno para uma obra maior. Dentro desse propósito cresce Wilco (The Album), registro talvez mais desconcertante da carreira da banda e um projeto de clara separação entre o que a banda vinha desenvolvendo ao longo dos anos 2000 e traria posteriormente com The Whole Love. Ora protegido por espeças camadas de ruídos, ora centrado na organização de músicas confortáveis, o álbum cresce até os últimos instantes, reverberando a necessidade do grupo em se reencontrar. Ainda que pareça um registro menor perto da grandiosidade imposta em obras prévias, o álbum se alimenta de grandes canções, caso de You And I (parceria com Feist) e You Never Know, uma daquelas composições volumosas, muito próxima do que o grupo alcançou na fase A.M.

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A ghost is Born

#05. A Ghost Is Born
(2004, Nonesuch)

Lançado dois anos depois da obra-prima Yankee Hotel Foxtrot, A Ghost Is Born veio com a impossível tarefa de superar o insuperável. Inicialmente ambientado dentro da mesma proposta sombria exposta no trabalho que o antecede, o álbum lentamente revela sua real função dentro da trajetória da banda: Experimentar. Ainda que diversos elementos que deram vida à carreira da banda estejam por todas as partes da obra, cada passo dado no interior do disco assume novo e incerto direcionamento. Impregnado de ruídos, o disco traz na presença do produtor Jim O’Rourke (um dos nomes de maior relevância da música experimental norte-americana) um elemento necessário, reforçando a atuação do grupo dentro do rock alternativo e em pequenas passagens que soam como um Sonic Youth e um show de música Country. Melancólico, Tweddy reforço sua dor em músicas como Hell is Chrome, Less Than You Think e Company in My Back, transformando o quinto registro em estúdio da banda em uma obra que talvez pareça estranha em uma primeira audição, mas que se sustenta madura e inventiva quanto mais tempo nos habituamos a ela.

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The Whole Love

#04. The Whole Love
(2011, dBpm)

De natureza instável, The Whole Love é o ponto de concentração e aprimoramento que o grupo parecia em busca desde o lançamento de A Ghost Is Born. Armazenando referências esquecidas, além de ressaltar a mesma porção experimental e ruidosa que o Wilco já havia exposto previamente, o disco faz de cada faixa um exercício não óbvio – seja para os novos ou mesmo veteranos apreciadores do trabalho da banda. Enquanto músicas aos moldes de Open Mind reforçam a calmaria dentro da obra (e uma possível relação com Sky Blue Sky), canções aos moldes de Born Alone e Standing O trazem de volta o peso e os elementos crescentes que orientaram a banda pós-Summerteeth. Tudo é exposto dentro de uma medida de plena incerteza até o fecho do registro, o que criou forte discussão sobre na época de seu lançamento. Entretanto, assim como os grandes trabalhos da banda, The Whole Love força o ouvinte a romper com a obvia relação dos sons e versos, transformando o disco em um caminho seguro para qualquer rumo que o grupo possa a vir desenvolver.

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Wilca

#03. Being There
(1996, Reprise)

Com o lançamento de A.M em 1995, Jeff Tweedy propunha uma espécie de continuação daquilo que vinha desenvolvendo em sua anterior banda, o Uncle Tupelo, entretanto, ao lançar o segundo álbum ao lado do Wilco, o músico não apenas garantiria identidade, como apresentaria um dos trabalhos mais influentes do Alt. Country naquele período. Dividido em dois álbuns, Being There pode ser de fato considerado como o primeiro trabalho do grupo de Chicago, afinal, é nele que Tweedy – acompanhado de um bom número de instrumentistas – desenvolve e faz chover composições memoráveis para o grupo. Faixas que a princípio trouxeram desconforto aos já encaminhados na música country de raíz, mas que agradariam (e muito) aos amantes do rock alternativo ou mesmo de outras áreas da música. Mesmo vendendo pouco, o disco contou com total apoio da crítica, identificando o registro como um dos mais interessantes em seu ano de lançamento e um álbum essencial para quem busca se aventurar pelas sempre fundamentais composições do Wilco.

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Wilco

#02. Summerteeth
(1999, Reprise)

A década de 1990 teve um papel significativo para a construção definitiva do Wilco e de tudo aquilo que a banda viria a desenvolver nos anos seguintes. Ponto claro dessa transformação, Summerteeh amarra as pontas entre a herança country do Uncle Tupelo com as melodias dolorosas que a banda viria a construir em Yankee Hotel Foxtrot (2002). Menos extenso que o registro que o antecede, porém, delimitado em cima de melodias e acertos instrumentais tão ou mais grandiosos, o álbum é a abertura para a consolidação do Wilco. Recheado por elementos de forte apelo comercial, além de uma clara evolução nos versos de Jeff Tweedy, o disco traz em cada uma das 14 composições oficiais um encanto raro – mesmo em relação ao que a banda lançaria posteriormente. Um dos exemplares mais acessíveis da discografia do grupo, Summerteeth talvez seja o último ponto iluminado dentro do terreno sombrio que viria a ser explorar com cuidado na década seguinte, fazendo com que mesmo faixas aos moldes de A Shot in the Arm e How to Fight Loneliness sejam capazes de se esquivar do sofrimento real por conta do bem explorado jogo sonoro da banda.

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Wilco

#01. Yankee Hotel Foxtrot
(2002, Nonesuch)

O inferno tomava conta da vida de Jeff Tweedy em 2001. Além de problemas pessoais que o afastavam do parceiro de banda Jay Bennett e a pressão da Warner Bros. – descontente com as vendas do grupo -, o músico vinha se esforçando para dar continuidade ao processo inciado em Summerteeh, trabalho que mesmo aclamado pela crítica parecia distante de manifestar qualquer interesse do público. No meio desse cenário desordenado – abastecido por crises constantes e a própria relação com os atentados terroristas de 11 de Setembro -, nasce em 2002 Yankee Hotel Foxtrot, obra mais adulta de toda a discografia da banda, e um dos lançamentos mais significativos no novo século. De propósito inevitavelmente sombrio, o álbum se arrasta em meio aos versos descritivos e dolorosos de Tweedy, deixando para a instrumentação um ponto de clara transformação dentro da trajetória do grupo. Do começo de carreira voltado ao Alt. Country pouco parece ter sobrevivido, fazendo com que o grupo dance por experiências voltadas ao Krautrock, ruídos instaurados pelo colaborador Jim O’Rourke e toda uma propriedade específica que praticamente transforma YHF em uma estação de rádio clandestina. A julgar pela forma como o álbum foi lançado – gratuitamente na internet, em vista do desprezo do trabalho pelo selo Warner -, talvez seja exatamente isso o que ele representa. Captando o processo de construção do disco e a relação instável entre os integrantes da banda, o diretor Sam Jones lançou no mesmo ano I Am Trying to Break Your Heart, registro visual que observa toda a produção daquela que é uma das obras mais significativas da história recente da música.

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+ Cozinhando Discografias

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.