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Crítica

Thom Yorke

: "ANIMA"

Ano: 2019

Selo: XL Recordings

Gênero: Eletrônica, Experimental, Techno

Para quem gosta de: Four Tet e Flying Lotus

Ouça: Dawn Chorus, The Axe e Traffic

8.5
8.5

“ANIMA”, Thom Yorke

Ano: 2019

Selo: XL Recordings

Gênero: Eletrônica, Experimental, Techno

Para quem gosta de: Four Tet e Flying Lotus

Ouça: Dawn Chorus, The Axe e Traffic

/ Por: Cleber Facchi 05/07/2019

Quanto mais ouço The King of Limbs (2011), mais percebo nele uma ideia abortada de Thom Yorke e menos uma obra do Radiohead. Do minimalismo na composição dos arranjos, batidas e temas eletrônicos, passando pela subtração de cada integrante que não seja o vocalista da banda, todos os elementos relacionados ao trabalho se revelam ao público como uma extensão clara do material entregue pelo músico britânico meia década antes, durante o lançamento do também econômico The Eraser (2006). Mesmo as canções que acabaram de fora do corte final do disco, como Supercolider e The Butcher, parecem contribuir para a arquitetura sintética originalmente testada pelo cantor.

Interessante perceber nas canções de ANIMA (2019, XL Recordings), terceiro e mais recente álbum de estúdio do músico inglês em carreira solo, uma interpretação talvez completa do esboço entregue em The King of Limbs. Do uso detalhista dos sintetizadores, passando pelo tratamento instrumental dado ao uso da voz, sempre trabalhada de forma cíclica e ritmada, poucas vezes antes Yorke pareceu tão minucioso na produção de um registro autoral quanto no presente álbum.

De fato, cada fragmento do disco estabelece um curioso resgate criativo de tudo aquilo que o músico havia testado em obras como Tomorrow’s Modern Boxes (2014). São retalhos eletrônicos, batidas assíncronas e camadas sobrepostas, direcionamento reforçado pela presença do experiente Nigel Godrich na produção. Um delirante cardápio de ideias que não apenas preserva a identidade de Yorke, como dialoga com alguns de seus principais parceiros de criação. Difícil ouvir a base urbana e cíclica de Twist, terceira faixa do disco, e não lembrar de 128 Harps, Parallel Jalebi e outras criações recentes do parceiro Kieran Hebden (Four Tet). Mesmo a permanente ruptura estética, como na instável The Axe, parece apontar para a obra do parceiro de longa data, o produtor californiano Steve Ellison (Flying Lotus).

Enquanto a base do disco reflete o fascínio de Yorke pelo experimentalismo eletrônico, nos versos, o cantor se perde em meio a inquietações e conflitos particulares. “Mostre-me o dinheiro / Celebre com um zumbi rico / Sugue-o através de um canudo … Não consigo respirar / Não consigo respirar“, canta em Traffic, delirante canção de abertura que sintetiza parte das experiências compartilhadas pelo artista no decorrer da obra. São versos inspirados por sociedades distópicas, ansiedade e o medo do futuro. Instantes de caos político e conflitos psicológicos que fazem lembrar o som produzido pelo Radiohead em Hail to the Thief (2003) e In Rainbows (2007).

Se pudesse fazer tudo de novo / Sim, sem um segundo pensamento / Eu não deixaria a porta fechada / Acho que perdi alguma coisa / Mas não tenho certeza do que“, desaba emocionalmente em Dawn Chorus, música que preserva a poesia triste explícita no restante da obra, porém, sutilmente conversa com as vivências recentes do próprio artista, como o divórcio detalhado de forma dolorosa em A Moon Shaped Pool (2016), e a morte da ex-esposa, a pesquisadora Rachel Owen (1968 – 2016). Canções que refletem o isolamento e permanente sensação de abandono do eu lírico, estrutura que orienta a experiência do ouvinte até o último instante da obra.

De essência versátil, como tudo aquilo que Thom Yorke vem produzindo desde o início da carreira, ANIMA não apenas perverte o material entregue há poucos meses, durante o lançamento da trilha sonora de Suspiria (2018), como aproxima o músico de outros campos das artes. Não por acaso, o cantor e compositor britânico convidou o cineasta Paul Thomas Anderson para a produção de um curta-metragem que serve de complemento à obra. São imagens coreografadas, truques de câmera e pequenas repetições de ideias, no melhor estilo Tempos Modernos (1963), de Charlie Chaplin, que contribuem para o tom angustiado do registro. Uma permanente sensação de queda e sufocamento, conceito que ultrapassa o limite dos versos e dialoga com a própria imagem de capa do disco.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.