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Crítica

Annie

: "Dark Hearts"

Ano: 2020

Selo: Annie Melody

Gênero: Pop, Synthpop, Electropop

Para quem gosta de: Little Boots e Robyn

Ouça: The Streets Where I Belong e Corridors of Time

6.0
6.0

Annie: “Dark Hearts”

Ano: 2020

Selo: Annie Melody

Gênero: Pop, Synthpop, Electropop

Para quem gosta de: Little Boots e Robyn

Ouça: The Streets Where I Belong e Corridors of Time

/ Por: Cleber Facchi 22/10/2020

Em um lento processo de transformação, Anne Lilia Strand, a Annie, foi do pop detalhista entregue no cultuado Anniemal (2004) para o reducionismo de Don’t Stop (2009). Canções que preservam a habilidade da cantora e compositora norueguesa em transitar por entre gêneros de forma sempre minuciosa, porém, partindo de um novo direcionamento estético, estrutura que se reflete em toda a sequência de obras apresentadas pela artista nos últimos anos, vide o flerte com as pistas e a produção eletrônica em The A&R (2013) e Endless Vacation (2015), além, claro, de outras composições isoladas que se espalham em um intervalo de mais de uma década.

A mesma busca por novas possibilidades acaba se refletindo no terceiro e mais recente trabalho de estúdio da cantora, Dark Hearts (2020, Annie Melody). Como indicado durante o lançamento de American Cars, primeira composição do disco a ser apresentada ao público, cada fragmento do álbum conduz ouvinte em direção ao passado. São canções que emulam o pop dos anos 1980, revelando camadas de sintetizadores, solos empoeirados de guitarras e versos ora cantados, ora declamados. Instantes em que artista norueguesa utiliza de uma linguagem nostálgica como forma de amarrar cada uma das canções entregues até o último segundo da obra.

Exemplo disso acontece logo nos primeiros minutos do disco, em The Streets Where I Belong. Da construção das guitarras e sintetizadores, passando pelo uso calculado das vozes, tudo soa como uma tentativa da artista em emular as baladas românticas de veteranos como Pet Shop Boys, uma de suas principais referências criativas. Mais à frente, em Corridors of Time, o mesmo direcionamento nostálgico, porém, partindo de uma linguagem quase caricatural. São versos semi-declamados e arranjos atmosféricos que tanto apontam para a obra do Cocteau Twins, como fazem lembrar do pop revisionista produzido pelo Chromatics e outros grupos recentes.

Com base nessa estrutura, Annie garante ao público uma obra que chama a atenção do ouvinte, mas que pouco avança criativamente. Observado de maneira atenta, não há nada em Dark Hearts que outros artistas já não tenham apresentado de forma ainda mais expressiva nos últimos meses, vide os recentes trabalhos de Jessie Ware, Kate NV e Jessy Lanza. Mesmo a forte similaridade entre as faixas evidencia outro grave defeito da obra. Canções que partem de uma estrutura contida, crescem momentaneamente e encolhem nos minutos finais, tornando a experiência de ouvir o álbum sempre previsível, livre de grandes surpresas e possíveis quebras conceituais que tanto definiram o som produzido pela artista no início dos anos 2000.

Entretanto, mesmo nesse cenário onde todas as regras são previamente apresentadas pela artista, instantes de breve experimentação tingem com novidade o processo de formação do álbum. É o caso de The Bomb. Faixa que mais se distancia do restante da obra, a canção não apenas rompe com o pop nostálgico de Dark Hearts, como se entrega às pistas em um estrutura que abraça a mesma eletrônica urbana de Jamie XX e Burial. A própria Forever ’92, com suas guitarras melódicas e saxofone pontual muda o curso do trabalho, refletindo parte da versatilidade explícita em Anniemal.

Lançado sob grande expectativa, o primeiro álbum de Annie em 11 anos é uma obra que sobrevive de momentos. São canções que se espalham em um bloco conceitual que aponta para o passado, porém, estabelecem no uso de pequenas rupturas conceituais um necessário ponto de renovação. É como se a cantora buscasse se encontrar criativamente após esse longo período de hiato, revelando ao público um disco em que confessa algumas de suas principais referências, memórias e experiências vividas ao longo dos anos. Um exercício criativo que encanta nos instantes de maior transformação, porém, custa a impressionar quando voltamos os ouvidos para tudo aquilo que a artista havia apresentado nos primeiros registros autorais.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.