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Crítica

Bully

: "Sugaregg"

Ano: 2020

Selo: Sub Pop

Gênero: Indie Rock, Rock Alternativo

Para quem gosta de: Charly Bliss e Speedy Ortiz

Ouça: Every Tradition, Prism e Where To Start

8.0
8.0

Bully: “Sugaregg”

Ano: 2020

Selo: Sub Pop

Gênero: Indie Rock, Rock Alternativo

Para quem gosta de: Charly Bliss e Speedy Ortiz

Ouça: Every Tradition, Prism e Where To Start

/ Por: Cleber Facchi 26/08/2020

Ouvir o trabalho de Alicia Bognanno é sempre uma satisfação. Entre versos confessionais, guitarras altamente distorcidas e vozes berradas, a cantora e compositora norte-americana estabelece um precioso diálogo com a produção musical dos anos 1990, porém, sempre preservando a própria identidade criativa. Exemplo disso está em toda a sequência de obras apresentadas pela artista de Nashville, Tennessee, ao longo da última década. Da estreia com Feels Like (2015), passando pelo melancólico Losing (2017), sobram registros em que somos convidados a partilhar das experiências e momentos de maior vulnerabilidade da líder do Bully.

Com Sugaregg (2020, Sub Pop) não poderia ser diferente. Terceiro e mais recente álbum de estúdio da guitarrista norte-americana, o registro co-produzido em parceria com John Congleton (St. Vincent, Angel Olsen), nasce como um acumulo de tudo aquilo que a artista tem incorporado desde o início da carreira. São blocos de ruídos, incontáveis camadas de guitarras e a completa minúcia no tratamento dado aos arranjos, estrutura que naturalmente aponta para a obra de veteranos do gênero, vide as criações de Steve Albini, com quem Bognanno trabalhou como estagiária, além, claro, de nomes importantes como Hole, Dinosaur Jr. e The Breeders.

Entretanto, para além da forte conexão com diferentes obras do gênero, são as letras de Bognanno, como tudo aquilo que a artista tem produzido desde o início da carreira, que realmente chamam a atenção do ouvinte. “É como a pressão de ter um bebê / Quando eu não quero um em meu corpo / Você diz que minha mente vai mudar um dia / Mas eu me senti assim para sempre“, reflete em Every Tradition, música em que discute o peso do machismo e a repressão histórica sofrida pelas mulheres. São versos sempre intimistas, marcados pela crueza dos elementos e profunda entrega da cantora, conceito que orienta a formação do registro até a derradeira What I Want.

Em termos de estrutura, não há nada de exatamente novo em relação ao material que Bognanno tem produzido desde a estreia com Feels Like, porém, a forma como a guitarrista interpreta o próprio trabalho de maneira cada vez mais acessível é o que torna o álbum tão interessante. Mesmo abordando temáticas tão sensíveis, em nenhum momento cantora perde a essência radiofônica que embala a experiência do ouvinte. Exemplo disso está na entrega de músicas como Where To Start, Stuck In Your Head e Hours and Hours. Instantes em que a guitarrista se despe de possíveis traços de complexidade, fazendo do disco uma obra de linguagem universal.

Interessante notar que mesmo acessível, Sugaregg em nenhum momento interfere na produção de músicas densas e conceitualmente desafiadoras. É o caso de Prism. Faixa mais extensa do disco, a canção mostra a capacidade de Bognanno em arrastar o ouvinte para dentro de um território marcado por pequenos improvisos com as guitarras, ambientações sujas e versos sempre dolorosos. “Apenas uma bagunça, amarrada com os lençóis e coberta de lágrimas / Controlada pelo silêncio, cara a cara com meus medos“, canta. São pouco mais de cinco minutos em que a artista norte-americana faz da própria melancolia um instrumento de diálogo com o ouvinte.

Tamanho esmero e comprometimento no processo de composição da obra faz de Sugaregg o trabalho mais completo de Bognanno até aqui. Mesmo que parte significativa do registro aponte para os dois primeiros álbuns da guitarrista, sobrevive na formação dos versos e equilíbrio dado aos arranjos um evidente ponto de maturação dentro da curta discografia do Bully. É como se a artista, pela primeira vez, se sentisse realmente à vontade para tratar dos próprios medos, relacionamentos fracassados e conflitos intimistas, proposta que faz de cada fragmento do disco, mesmo o menos expressivo, um precioso objeto de destaque.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.