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Críticas

Catavento

: "Ansiedade na Cidade"

Ano: 2018

Selo: Honey Bomb Records

Gênero: Dream Pop, Indie Rock, Rock Psicodélico

Para quem gosta de: Boogarins e Terno Rei

Ouça: Lagartia, Panca Úmida e Alergia Alergia

8.8
8.8

Resenha: “Ansiedade na Cidade”, Catavento

Ano: 2018

Selo: Honey Bomb Records

Gênero: Dream Pop, Indie Rock, Rock Psicodélico

Para quem gosta de: Boogarins e Terno Rei

Ouça: Lagartia, Panca Úmida e Alergia Alergia

/ Por: Cleber Facchi 09/08/2018

Sente-se, respire fundo, busque conforto na imersão dos fones de ouvido e deixe que a viagem musical proposta pela banda gaúcha Catavento tenha início. De essência escapista, ainda que consciente, centrado em conflitos urbanos, crises existencialistas e tormentos pessoais, Ansiedade na Cidade (2018, Honey Bomb Records) convida o ouvinte a se perder em uma cama de sons enevoados, como um doce refúgio criativo. Melodias e versos que transitam entre o delírio e a realidade crua, como uma extensão natural de tudo aquilo que o grupo original de Caxias do Sul vem produzindo desde o primeiro álbum de estúdio, Lost Youth Against The Rush (2014).

Meu coração abriu, ninguém viu / Desconhecidos vêm comentar … Tu vai procurar / No mesmo lugar / Não vai encontrar / Tu vai procurar a vida inteira / Nunca vai achar“, provoca a letra de Deus Online. Versos angustiados que refletem a busca desesperada do eu lírico por respostas, além, claro, do desejo imediato por atenção, sentimento reforçado pela euforia das redes socais. Um reflexo da alma inquieta de qualquer indivíduo, conceito que vem sendo explorado pela banda desde o álbum anterior, o maduro CHA (2016), mas que alcança melhor resultado nas canções do presente disco.

Melancólico e provocativo, esse mesmo direcionamento se materializa de diferentes formas ao longo da obra. Há desde composições indagadoras, como no pop psicodélico de Se Não Vai (“Somos coisas diferentes / Temos infinitos lados / Caminhos distintos a escolher / Pra qual devo correr?“), até faixas que se permitem provar de debates políticos e sociais, como em Paraíso do Terceiro Mundo (“São muitos bilhões em ações / Dinheiro no banco pra dar e vender / É de quem tiver / Quente é“). Uma colisão de ideias e experiências particulares que refletem a interferência de cada colaborador da banda – hoje formada por Leonardo Lucena (vocal, guitarra e baixo), Leonardo Sandi (vocal, guitarra e teclado), Eduardo Panozzo (baixo, guitarra e vocal), Johnny Boaventura (vocal, piano e teclados), Lucas Bustince (bateria e percussões), Jonas Bustince (percussões e bateria) e Francisco Maffei (samples, sintetizadores, guitarras e vozes), esse último, produtor do trabalho.

Interessante notar que mesmo sóbrio, por vezes amargo em excesso, conceito reforçado em músicas como Alergia Alergia (“Tristeza quer entrar / Convida pra subir / Bota um som pra relaxar / Ou entreter um pouco“), Ansiedade na Cidade está longe de parecer uma obra arrastada, talvez impossível de ser digerida pelo ouvinte. Pelo contrário, difícil não se deixar guiar pela melancolia fina que rege o disco, direcionamento sutilmente corrompido pela inserção de pequenos respiros criativos ao longo da obra. É o caso de Lagartia, música que se espalha em meio a guitarras preguiçosas, espaçadas, e versos pensados para confortar o ouvinte (“Tudo bem daqui perdendo um tempo / Uma brisa leve de argumento / Chama pra sair que eu vou correndo“). Um som delirante que alcança maior refinamento na colorida This is Life / Corre, composição que se aproxima da musicalidade cósmica de estrangeiros como Washed Out.

A própria base instrumental do disco, sempre detalhista, parece trabalhada de forma a hipnotizar o ouvinte. Exemplo disso está na dobradinha composta por Panca Úmida e Groove Geral. Enquanto a primeira canção se espalha sem pressa, dialogando com o mesmo dream-pop-jazzístico de King Krule e BadBadNotGood, ao esbarrar na faixa seguinte, um nítido ponto de evolução do trabalho. Poucas vezes antes o grupo gaúcho pareceu tão próximo da música brasileira em sua forma convencional, reverberando nostalgia em uma clara conexão com a obra de veteranos como Gilberto Gil. Melodias deliciosamente letárgicas, contraponto ao tom sério dos versos, naturalmente centrados no atual cenário político do país (“Sem saber levantou sua voz / Com a faca e o sangue nas mãos“).

Feito para ser apreciado sem pressa, sussurrando informações e referências disfarçadas a cada nota ou mínimo fragmento poético, Ansiedade na Cidade ganha destaque no álbum visual que o acompanha. Um registro contínuo, guiada pelo movimento e inserções pontuais que dialogam com a obra de Toro Y Moi em Boo Boo (2011), uma das inspirações do projeto. Incontáveis camadas instrumentais, líricas e estéticas que se conectam diretamente com a imagem de capa do disco, ilustração que conta com a assinatura de Leonardo Sandi e, sutilmente, revela ao público parte do universo mágico que se esconde por entre as brechas do disco.

 

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.