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Crítica

Gil Scott-Heron / Makaya McCraven

: "We’re New Again"

Ano: 2020

Selo: XL Recordings

Gênero: Jazz, Blues, Soul

Para quem gosta de: Bobby Womack e Shuggie Otis

Ouça: Me and The Devil e I'm New Here

8.0
8.0

Gil Scott-Heron & Makaya McCraven: “We’re New Again”

Ano: 2020

Selo: XL Recordings

Gênero: Jazz, Blues, Soul

Para quem gosta de: Bobby Womack e Shuggie Otis

Ouça: Me and The Devil e I'm New Here

/ Por: Cleber Facchi 11/02/2020

We’re New Again: A Reimagining by Makaya McCraven (2020, XL Recordings) é um registro que facilmente poderia ter dado errado, mas que funciona de maneira incontestável. Interpretação particular do baterista Makaya McCraven sobre o último trabalho de estúdio de Gil Scott-Heron (1949-2011), o registro marcado pela riqueza dos detalhes utiliza da grandiosidade dos arranjos como um contraponto à base minimalista que define a versão original do disco. Instantes em que o jazzista perverte a essência anêmica do álbum entregue há uma década, porém, preserva o lirismo melancólico que há tempos define a extensa obra do poeta de Chicago.

Enquanto o material entregue em I’m New Here (2010) encanta pelo reducionismo dos elementos, sobrevivendo da produção enxuta de Richard Russell, ruídos e monólogos ocasionais, We’re New Again segue o caminho oposto. Do momento em que tem início, na sequência formada por Special Tribute (Broken Home, Pt. 1) e I’m New Here, incontáveis camadas instrumentais surgem e desaparecem de forma estratégica, valorizando cada fragmento de voz detalhado por Scott-Heron. Um lento desvendar de ideias e experiências que segue até a derradeira Me and the Devil, com sua linha de baixo e bateria sempre destacada, forte.

É justamente nesse ponto em que se percebe a deficiência de We’re New Again em relação ao trabalho que o antecede. Durante toda a execução da obra, evidente é o esforço de McCraven em igualar a entrega emocional do poeta de Chicago. São orquestrações, metais e inserções volumosas que naturalmente capturam a atenção do ouvinte, porém, pouco avançam criativamente quando voltamos os ouvidos para a versão original do disco. Difícil ouvir as reedições de I’ll Take Care of You, Running ou mesmo a já citada Me and the Devil e não perceber o quanto Scott-Heron consegue fazer muito mais, mesmo no direcionamento contido da obra.

Nesse ponto, We’re New Here (2011), trabalho que conta com a produção de Jamie XX e adota a mesma abordagem revisionista, se mostra como uma obra muito mais eficiente e inovadora. É impressionante a forma como o produtor britânico consegue interpretar de forma acessível, por vezes dançante, um delicado conjunto de versos regidos pelos sentimentos e constante sensação de despedida. Em We’re New Again, tudo se resolve de forma burocrática, por vezes previsível, como se fosse possível antecipar cada novo movimento de McCraven e seu vasto time de colaboradores, entre eles, o guitarrista Jeff Parker e a harpista Brandee Younger.

Entretanto, mesmo nesse contexto em que a comparação se torna inevitável, seria um erro tratar We’re New Again como uma obra menor. Por mais previsível que seja a estrutura adotada por McCraven, o esmero na composição dos arranjos é mais impactante do que qualquer defeito. Exemplo disso está em Where Did the Night Go, faixa que parte de uma estrutura minimalista, concisa, para mergulhar em um dos instantes de maior experimentação do trabalho. Surgem ainda preciosidades como This Can’t Be Real, canção que parece apontar para o rap jazzístico de nomes como The Roots e Talib Kweli, conceito reforçado durante toda a execução da obra.

O mais interessante em We’re New Again talvez seja perceber que mesmo retalhos espalhados pela obra de despedida de Scott-Heron se transformam em músicas completas nas mãos de McCraven. São ideias que se entrelaçam sem ordem aparente, como se cada fragmento cantado pelo músico norte-americano há uma década servisse de estímulo para um novo universo criativo. Canções talvez cômodas dentro da estrutura que elas adotam, porém, difíceis de serem ignoradas, proposta que naturalmente ultrapassa os limites de uma simples homenagem, fazendo do presente álbum um novo e delicado exercício de criação.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.