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Ano: 2019

Selo: Slap

Gênero: MPB, Indie Pop, Alternativa

Para quem gosta de: Rubel e Castello Branco

Ouça: Saudade do Meu Pai e O Seu Amor Sou Eu

8.0
8.0

“Guaia”, Marcelo Jeneci

Ano: 2019

Selo: Slap

Gênero: MPB, Indie Pop, Alternativa

Para quem gosta de: Rubel e Castello Branco

Ouça: Saudade do Meu Pai e O Seu Amor Sou Eu

/ Por: Cleber Facchi 29/07/2019

Mesmo que pareça imersa em preceitos ecológicos, ao ouvir Emergencial, faixa de abertura do terceiro e mais recente álbum de estúdio de Marcelo Jeneci, Guaia (2019, Slap), fica evidente o desejo do cantor e compositor paulistano em resgatar elementos que definem a própria essência. “É emergencial a gente se conectar com a terra“, canta de forma reflexiva. Um misto de passado e presente, efeito da poesia nostálgica que aponta para memórias da infância na região de Guaianases, Zona Leste de São Paulo, onde o músico cresceu. Canções que preservam a identidade do artista responsável por obras como Feito pra Acabar (2010) e De Graça (2013), porém, partindo de um novo direcionamento estético e conceitual.

Não por acaso, passado o atmosférico ato de abertura que ainda conta com fragmentos do canto Ikashawhu, da tribo acreana de Yawanawa, Jeneci mergulha de cabeça no regionalismo de Oxente. Trata-se de uma parceria com Chico César, com quem começou a carreira tocando sanfona no início dos anos 2000. É dentro desse ambiente familiar e acolhedor que o músico paulistano orienta a experiência do ouvinte até o último instante da obra. Fragmentos de vozes, melodias e versos consumidos pela força dos sentimentos, como um passeio por diferentes fases e memórias acumuladas pelo artista ao longo dos anos.

Exemplo disso ecoa com naturalidade na sensível Saudade do Meu Pai. “Tô com saudade do meu pai / Do seu velho corte de cabelo / Do seu jeito de me olhar / Fazendo a barba diante do espelho“, canta em meio a cenas e paisagens descritivas, sempre melancólicas. Um lento desvendar de ideias que se completa pelos arranjos minuciosos de Jeneci, responsável por parte expressiva dos instrumentos tocados no decorrer da obra. São sintetizadores e ambientações eletrônicas, estrutura que se completa pela interferência direta de Pedro Bernardes e Lux Ferreira (Mahmundi, Duda Beat), com quem divide a produção do disco.

Partindo desse direcionamento reducionista, Jeneci entrega ao público uma obra que exige tempo até ser absorvida por completo. São camadas instrumentais que mais ocultam do que parecem revelar informações, como uma fuga do pop ensolarado que marca o antecessor De Graça. Síntese desse profundo comprometimento estético se revela na agridoce O Seu Amor Sou Eu. Composta em parceria com Luiz Tatit, a canção parte do reducionismo eletrônico para um exercício que se completa pela adição de cordas e elementos orquestrais da Filarmônica de São Petesburgo. “Devo admitir tenho sofrido / Mas não quero sofrer mais … Que uma paixão desse tamanho / Quando aumenta / Pode até explodir / O seu amor sou eu“, canta em meio a falsetes e instantes de profunda entrega sentimental.

O mesmo direcionamento melancólico acaba se refletindo na dolorosa Melodia da Noite, canção que vai do blues ao soul em uma estrutura deliciosamente contida, abrindo passagem para o uso de harmonias de vozes no melhor estilo The Beatles. Surgem ainda criações como a confusa Redenção, faixa marcada pela constante quebra rítmica e inquietações religiosas que invadem a mente do próprio Jeneci. Em Ritos, música de encerramento do disco, um exercício de profunda leveza, como um respiro aliviado após o turbilhão emocional que conduz o trabalho.

Claro que essa busca por um som denso e atmosférico não interfere na produção de faixas imediatas, por vezes íntimas do material entregue em Feito pra Acabar. É o caso do dueto Vem Vem, colaboração com a cantora e compositora fluminense Maya, mas que acaba lembrando os antigos encontros do artista paulistano com Laura Lavieri. A mesma leveza se reflete em Aí Sim, um misto de reggae e pop que se completa pela poesia transformadora de Arnaldo Antunes, parceiro de longa data do cantor. Ideias que se espalham sem ordem aparente, refletindo o desejo de Jeneci em preservar e perverter uma série de conceitos que vem sendo aprimorados desde o início da carreira.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.