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Crítica

Julianna Barwick

: "Healing Is A Miracle"

Ano: 2020

Selo: Ninja Tune

Gênero: Experimental, Música Ambiente, Ambient Pop

Para quem gosta de: Grouper e Sigur Rós

Ouça: In Light, Inspirit e Flowers

8.5
8.5

Julianna Barwick: “Healing Is A Miracle”

Ano: 2020

Selo: Ninja Tune

Gênero: Experimental, Música Ambiente, Ambient Pop

Para quem gosta de: Grouper e Sigur Rós

Ouça: In Light, Inspirit e Flowers

/ Por: Cleber Facchi 17/07/2020

Consumida pelo peso de antigos relacionamentos e uma série de conflitos pessoais, Julianna Barwick precisava de um lugar para recomeçar. Não por acaso, após o lançamento do eletrônico Will (2016), a cantora e compositora norte-americana decidiu deixar a cidade de Nova Iorque, onde residia desde o início dos anos 2000, para encontrar na região ensolarada de Los Angeles um evidente ponto de transformação dentro da própria carreira. “Eu tive que me afastar desses fantasmas“, respondeu em entrevista ao The New York Times. Vem justamente dessa necessidade em esquecer o passado e secar as lágrimas que se transformaram em pequenos oceanos o estímulo para o quarto e mais recente álbum de inéditas da musicista, Healing Is A Miracle (2020, Ninja Tune).

Ponto de equilíbrio entre o pop etéreo que embala o introdutório The Magic Place (2011) e o experimentalismo eletrônico do trabalho entregue há quatro anos, Healing Is A Miracle estabelece na fina sobreposição dos elementos o estímulo para cada uma das oito faixas do disco. Composições montadas a partir de fragmentos de vozes, ambientações etéreas, ruídos e repetições que parecem dançar pela cabeça do ouvinte, convidado a se perder em um universo de emanações cósmicas, sempre sensíveis, conceito reforçado logo nos primeiros minutos do álbum, em Inspirit.

Escolhida para apresentar o disco, a canção parte da lenta sobreposição das vozes e sintetizadores atmosféricas como estímulo para capturar a atenção do ouvinte. É como se cada elemento fosse apresentado em uma medida própria de tempo, conceito reforçado por Barwick durante o lançamento de Nepenthe (2013), porém, ampliado durante a montagem do presente disco. Com base nessa estrutura, a cantora que cresceu região de Louisiana revela parte expressiva das regras que orientam o trabalho. Composições regidas pelos instantes, como retalhos instrumentais que surgem e desaparecem durante toda a execução da obra, indicativo do completo domínio da artista em relação ao próprio álbum.

Claro que isso não interfere na entrega de músicas turbulentas, fortes, como representações da alma atormentada de Barwick durante o processo de formação do disco. Exemplo disso ecoa com naturalidade em Flowers, sexta faixa do álbum. Música que mais se distancia do restante da obra, a canção estabelece no uso destacado dos sintetizadores e vozes cíclicas, como o canto hipnótico de uma sereia, um precioso elemento de transformação. É como se a cantora caminhasse em um terreno nebuloso, estrutura que evoca parte da atmosfera eletrônica detalhada no registro passado, porém, partindo de um novo direcionamento estético.

Outro aspecto curioso em relação aos antigos trabalhos de Barwick está na frequência de colaboradores que aparecem durante a execução de Healing Is A Miracle. São nomes como Nosaj Thing, com quem divide a derradeira Nod, e a harpista Mary Lattimore, colaboradora na melancólica Oh, Memory. Nada que se compare ao encontro com Jónsi, líder do Sigur Rós e uma das principais inspirações da artista, na labiríntica In Light. São pouco mais de seis minutos em que o ouvinte é convidado a se perder em uma nuvem de vocalizações atmosféricas, respiros e melodias acolhedoras, indicativo do completo refinamento da obra. Instantes em que cantora transporta para dentro de estúdio parte da essência colaborativa que embala alguns de seus principais projetos paralelos, vide encontros com Helado Negro e a compositora Ikue Mori.

Ponto de ruptura dentro da curta discografia de Barwick, Healing Is A Miracle se divide entre a busca por novas possibilidades e faixas que preservam a identidade da musicista estadunidense. Parte desse resultado vem do próprio processo de composição da obra. São músicas que parecem externalizar as dores, vivências e sentimentos que movimentaram a vida da artista nos últimos anos, conceito que muito se assemelha ao material entregue no introdutório The Magic Place. Entretanto, enquanto o álbum que apresentou a cantora estabelecia um olhar para o passado, buscando em memórias da infância um componente de inspiração, com o novo disco é o contato com o presente e a necessidade de seguir em frente que dita com leveza os rumos de cada canção.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.