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Crítica

Leon Vynehall

: "Rare, Forever"

Ano: 2021

Selo: Ninja Tune

Gênero: Eletrônica, Experimental, Deep House

Para quem gosta de: Nicolas Jaar e Jamie XX

Ouça: Mothra, Ecce! Ego! e Dumbo

8.5
8.5

Leon Vynehall: “Rare, Forever”

Ano: 2021

Selo: Ninja Tune

Gênero: Eletrônica, Experimental, Deep House

Para quem gosta de: Nicolas Jaar e Jamie XX

Ouça: Mothra, Ecce! Ego! e Dumbo

/ Por: Cleber Facchi 05/05/2021

Quem há tempos acompanha as criações de Leon Vynehall, produtor britânico que tem chamado a atenção da imprensa desde o início da década passada, sabe que o artista costuma se dividir entre registros de essência atmosférica e obras que parecem apontar para as pistas de dança. Exemplo disso fica bastante evidente no contraste entre os temas tropicais abordados em Rojus (2016) e o minimalismo de Nothing Is Still (2018), esse último, trabalho em que se aprofunda conceitualmente na história dos próprios avós que deixaram o Reino Unido de navio para viver em Nova York. Interessante notar nas canções de Rare, Forever (2021, Ninja Tune), recente lançamento do compositor, um precioso exercício criativo que combina o que há de melhor nesses dois opostos.

Marcado pela sobreposição das texturas eletrônicas, ruídos e batidas assíncronas, o trabalho de dez faixas serve de passagem para um território desvendado em essência por Vynehall. Discípulo confesso de veteranos como Aphex Twin e DJ Shadow, o produtor britânico entrega ao público um álbum que pode ser absorvido superficialmente, porém, oculta um universo de pequenos detalhes, quebras e ambientações tortas que exigem ser desvendadas pelo ouvinte. São incontáveis camadas instrumentais e vozes picotadas que se escondem por entre as brechas do registro, conceito bastante evidente no também minucioso Music for the Uninvited (2014), obra que apresentou o artista a uma parcela ainda maior do público, mas que ganha ainda mais destaque com o presente disco.

Não por acaso, para o anúncio da obra, Vynehall decidiu presentear o público com duas composições, as contrastantes Ecce! Ego! e Mothra. Síntese conceitual de tudo aquilo que o produtor busca desenvolver ao longo do álbum, cada fragmento do trabalho conduz o ouvinte de forma diferente. Enquanto a primeira canção se aprofunda no uso de temas atmosféricos, mergulhando em camadas de sintetizadores, batidas e melodias liquefeitas, com a faixa seguinte, o resultado passa a ser outro. Pouco mais de cinco minutos em que o artista parece testar os limites dentro de estúdio, rompendo de maneira bastante evidente com qualquer traço de linearidade. E é essa mesma ausência de ordem e permanente corrupção das ideias que torna a experiência de ouvir Rare, Forever tão satisfatória.

Do momento em que tem início, na já citada Ecce! Ego!, até alcançar All I See Is You, Velvet Brown, Vynehall parece jogar com as possibilidades. Perceba como cada composição se espalha em um universo de pequenos detalhes, texturas granuladas e micro-ambientações que tingem com incerteza o andamento da obra. É como se o artista resgatasse tudo aquilo que tem produzido desde o início da carreira, porém, de maneira cada vez menos linear. Exemplo disso fica bastante evidente na já conhecida An Exhale, sétima faixa do disco. Marcada pela criativa sobreposição de ritmos, a canção nasce do cruzamento entre duas trilhas conceituais que ora convidam o ouvinte a dançar, ora utilizam de uma abordagem transcendental, tratamento que vai do uso dos sintetizadores às batidas.

Nesse espaço aberto às possibilidades, Vynehall vai do breve diálogo com o jazz, na atmosférica Alichea Vella Amor, ao uso de temas dançantes, marca de músicas como Mothra e Snakeskin ∞ Has-Been. É como se cada composição transportasse o ouvinte para um território diferente. Parte expressiva desse resultado vem da escolha do produtor em fazer do álbum um verdadeiro estudo ritmico, costurando fragmento extraídos de diferentes campos da música de forma propositadamente desordenada. É o caso de Dumbo, registro em que parte de uma abordagem linear, porém, cresce no encaixe torto das batidas e vozes picotadas. Instantes em que o artista inglês aponta para as criações de conterrâneos como Jamie XX e Floating Points, mesmo preservando a própria identidade.

Feito para ser absorvido aos poucos, sem pressa, Rare, Forever amplia os horizontes criativos na mesma medida em que potencializa uma série de elementos previamente testados pelo produtor britânico, vide o uso fragmentado das batidas e captações analógicas que deliciosamente se espalham pelo interior do registro. Acessível quando se permite ser, como nos temas dançantes de Dumbo, e provocativo quando busca testar os próprios limites dentro de estúdio, como no som labiríntico de An Exhale e All I See Is You, Velvet Brown, Vynehall entrega ao público uma obra essencialmente ampla. São fragmentos instrumentais e rítmicos que se atravessam a todo minuto, proposta que orienta de maneira incerta a experiência do ouvinte até o último segundo do trabalho.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.