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Crítica

Liars

: "The Apple Drop"

Ano: 2021

Selo: Mute

Gênero: Art Rock, Experimental

Para quem gosta de: No Age e These New Puritans

Ouça: Sekwar e Big Appetite

7.8
7.8

Liars: “The Apple Drop”

Ano: 2021

Selo: Mute

Gênero: Art Rock, Experimental

Para quem gosta de: No Age e These New Puritans

Ouça: Sekwar e Big Appetite

/ Por: Cleber Facchi 13/08/2021

Por mais tortuoso e confuso que tenha sido o caminho percorrido por Angus Andrew ao longo da última década, difícil não se deixar conduzir pelas experiências propostas pelo compositor filipino. Entre experimentações com a música eletrônica, em obras como WIXIW (2012) e Mess (2014), passando pela completa esquizofrenia que embala os ainda recentes TFCF (2017) e Titles with the Word Fountain (2018), sobram registros em que o multi-instrumentista naturalizado norte-americano parece testar os próprios limites dentro de estúdio, mesmo que de forma totalmente irregular. Um permanente atravessamento de informações, quebras e costuras rítmicas, proposta que alcança maior refinamento estético nas canções do estratosférico The Apple Drop (2021, Mute).

De essência homogênea, ainda que marcado pelo forte caráter exploratório, o registro que busca inspiração em temas cósmicos e viagens espaciais amplia seus horizontes como forma de potencializar conceitos existencialistas detalhados por Andrew ao longo da obra. São canções que discutem a passagem do tempo, a permanente sensação de deslocamento, medos e outros conflitos intimistas, conceito que tem sido explorado pelo músico desde o início dos anos 2000, quando se destacou como um dos nomes mais importantes da cena nova-iorquina. Um sombrio catálogo de ideias, ritmos e informações que vai da construção dos arranjos ao uso fragmentado das vozes.

Não por acaso, Andrew fez de Sekwar uma das primeiras composições do disco a serem apresentadas ao público. Enquanto os versos se projetam em um misto de canto e rima, reforçando o sentimento de opressão e angústia vivida pelo artista – “Eles me disseram que eu sou um saco de lixo desgastado e cheio de energia / E eles não conseguem descobrir o que estou tentando fazer aqui / Exceto ficar parado e ser um idiota” –, batidas inexatas, sintetizadores e vozes tratadas como instrumentos parecem pensadas para bagunçar a experiência do ouvinte. É como uma síntese conceitual de tudo aquilo que o músico busca desenvolver até a música de encerramento do disco, New Planets New Undoings, outro importante exercício criativo que define os limites e possibilidades da obra.

Nesse sentido, The Apple Drop nasce como uma soma conceitual de tudo aquilo que Andrew tem explorado nos últimos anos. Da combinação de vozes, ruídos e melodias eletroacústicas que tomam conta da já conhecida From What the Never Was, música que ainda evoca os temas atmosféricos de Radiohead, passando pelo labirinto de sons e experiências sentimentais que se apoderam de Big Appetite, cada fragmento do disco parece concebido a partir da permanente sobreposição de sedimentos líricos e instrumentais. Uma permanente reciclagem de ideias, mas que em nenhum momento ecoa de maneira previsível, indicativo do completo domínio criativo do músico.

Claro que essa maior coesão no processo de montagem das faixas e curioso resgate autoral não distancia o disco de alguns problemas bastante destacados. Como indicado logo nos primeiros minutos da obra, em The Start, The Apple Drop segue uma abordagem marcada pelo forte caráter atmosférico, conceito reforçado na segunda metade do registro, quando músicas como Start Search e Leisure War tornam a experiência de ouvir o material cada vez mais arrastada. Falta ao álbum o mesmo tratamento dinâmico de Drum’s Not Dead (2006), Sisterworld (2010) e outros exemplares do Liars que, embora pontuados por momentos de maior recolhimento, evidenciam a potência das guitarras e uso sempre ritmado da bateria, rompendo com possíveis traços de morosidade e conforto

Mesmo dotado de uma abordagem menos urgente em relação aos antigos trabalhos da banda, The Apple Drop está longe de ser encarado como um registro menor dentro da discografia do Liars. Pelo contrário, desde o pulsante Mess que Andrew não apresentava uma obra tão interessante, principalmente quando observamos o refinamento dado aos versos. Trata-se apenas de um álbum marcado por um direcionamento rítmico pouco usual quando observamos tudo aquilo que o grupo nova-iorquino tem produzido desde o início da carreira. Um lento desvendar de ideias, emoções e temas instrumentais, como a passagem para um novo e ainda inusitado território criativo.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.