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Crítica

Luana Carvalho

: "Segue o Baile"

Ano: 2021

Selo: Independente

Gênero: Pop, MPB, Funk

Para quem gosta de: Adriana Calcanhotto, Illy e Silva

Ouça: Selfie, Hoje e Garota Nota 100

7.0
7.0

Luana Carvalho: “Segue o Baile”

Ano: 2021

Selo: Independente

Gênero: Pop, MPB, Funk

Para quem gosta de: Adriana Calcanhotto, Illy e Silva

Ouça: Selfie, Hoje e Garota Nota 100

/ Por: Cleber Facchi 27/01/2021

O passado embala o presente de Luana Carvalho. Poucos meses após o lançamento de Baile de Máscara (2020), trabalho em que resgata memórias e sambas eternizados pela própria mãe, a cantora e compositora Beth Carvalho (1946-2019), a artista está de volta com o também nostálgico Segue o Baile (2021, Independente), registro em que utiliza de fragmentos da adolescência como estímulo para o mergulho em composições icônicas da década de 1990 e além. São canções que parecem dançar pelo tempo, proposta que preserva a essência do introdutório Branco (2017), porém, de forma ainda mais acessível, capaz de dialogar com uma nova parcela do público.

Por causa da nostalgia que a quarentena me trouxe, voltei meus ouvidos a tudo que mais profundamente me constituiu como ser musical. E lá nos primórdios das minhas tardes inteiras ouvindo e decorando letras de música, encontrei, inevitavelmente, o repertório de minha mãe, e os funks que tanto embalaram uma época fundamental da minha vida“, comentou no texto de apresentação do trabalho. É partindo desse curioso olhar para o passado, muitas vezes ainda recente, que a artista orienta a experiência do ouvinte durante toda a execução da obra. Da releitura de Hoje, criação de Jefferson Junior e Umberto Tavares que ganhou forma na voz de Ludmilla, passando por Rap do Solitário e Garota Nota 100, de MC Marcinho, cada elemento do disco contribui para esse exercício particular assumido pela cantora.

Exemplo disso acontece na interpretação de Carvalho para a faixa Está Escrito. Originalmente lançada pelo cantor Bob Rum, em 1996, a música que já foi tema de abertura em novela do SBT, assume novo e delicado tratamento na voz da cantora. São inserções reducionistas que se conectam à percussão complementar de Dedê Silva e arranjos de Pedro Sá e Kassin, esse último, parceiro durante toda a execução da obra e produtor do disco. Instantes em que a artista carioca vai do doce romantismo à melancolia, conceito reforçado pela escolha do repertório formado por músicas sempre confessionais, como as já citadas Rap do Solitário e Garota Nota 100.

Entretanto, é justamente quando rompe com parte dessa proposta que o trabalho evidencia seus momentos de maior acerto. Longe do resgate temático, como a já desgastada adaptação de Me Leva, do cantor Latino, música que ganhou recentemente uma versão na voz de Alice Caymmi, sobrevive nas composições autorais de Carvalho a real grandeza do álbum. Exemplo disso acontece em Selfie, canção em que preserva o diálogo com as batidas do funk, porém, sustenta na letra política um precioso elemento de transformação. “Sobe favela aprova projeto / Curte um cunho social / Mas dois beijinhos só na galera / Nos porteiros nem a pau“, canta em meio a vozes sobrepostas que encolhem e crescem a todo instante.

O mesmo direcionamento pode ser percebido em outros momentos ao longo da obra. É o caso Teta Sem Treta, faixa em que se aprofunda na discussão sobre o câncer de mama, porém, fazendo da aplicabilidade explícita os versos um componente de diálogo com diferentes temáticas voltadas ao universo feminino. Instantes em que Carvalho traz de volta a brasilidade evidente nas canções de Branco e ainda utiliza da letra como elemento de diálogo com o ouvinte. A própria faixa de encerramento, com sua percussão quase ritualística, evidencia a força criativa e entrega da cantora, percepção destacada em diversos momentos ao longo do álbum.

Nesse sentido, Segue o Baile se revela como um trabalho muito mais corajoso e talvez decisivo do que o material entregue no disco anterior. É como se, pela primeira vez, Carvalho estivesse à vontade para confessar as próprias referências e brincar com as possibilidades dentro de estúdio, estrutura que parte do inevitável diálogo gerado como resgate de clássicos do funk carioca, mas que acaba servindo como instrumento para apresentar o fino repertório assinado pela cantora. Um misto de resgate conceitual e sutil formação da própria identidade artística, proposta que orienta a experiência do ouvinte do início ao fim da obra.


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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.