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Crítica

Midwife

: "Luminol"

Ano: 2021

Selo: The Flesner

Gênero: Heaven Metal, Slowcore, Shoegaze

Para quem gosta de: Low, Lightning Bug, No Joy

Ouça: Enemy e Promise Ring

7.8
7.8

Midwife: “Luminol”

Ano: 2021

Selo: The Flesner

Gênero: Heaven Metal, Slowcore, Shoegaze

Para quem gosta de: Low, Lightning Bug, No Joy

Ouça: Enemy e Promise Ring

/ Por: Cleber Facchi 28/07/2021

Em 2020, enquanto se preparava para embarcar em uma extensa turnê com apresentações agendadas em diferentes cidades e países próximos, a multi-instrumentista Madeline Johnston, de Denver, Colorado, se viu forçada a cancelar todos os compromissos para mergulhar em um longo período de isolamento por conta da pandemia de Covid-19. Desse processo de imersão e distanciamento veio o estímulo para a produção de um novo registro de inéditas como Midwife, Luminol (2021, The Flesner), trabalho que preserva tudo aquilo que a musicista estadunidense havia testado meses antes, durante o lançamento do antecessor Forever, porém, partindo de uma abordagem ainda mais sensível e intimista, proposta que se reflete em cada mínimo fragmento sentimental e poético da obra.

“Eu não consigo matar o pensamento maligno / Não consigo desligar“, confessa logo nos primeiros minutos da obra, em God is a Cop. São versos que passeiam pela mente atormentada de Johnston, como um acumulo das experiências, medos e angústias vividas pela multi-instrumentista nos últimos meses. Canções que partem de um território particular, mas que em nenhum momento deixam de dialogar com o ouvinte, efeito direto da forte vulnerabilidade que orienta a construção das letras. “Meu corpo esta contra mim / Meu corpo quer me matar / Meu corpo é um exército / Meu corpo quer me pegar“, canta minutos à frente, em Enemy, música em que reflete sobre o desconforto com o próprio corpo, reforçando o caráter melancólico e confidencial que orienta a experiência do público.

O mais interessante talvez seja perceber a forma como a artista explora esses sentimentos ao longo do registro. Assim como em Forever, Johnston investe em um material concebido em uma medida própria de tempo, sem pressa. São versos cíclicos, como mantras, que se espalham em meio a camadas de guitarras, distorções e melodias etéreas. Vem justamente desse lento processo de construção das faixas o título da obra, Luminol, produto químico usado por investigadores forenses para apontar vestígios de sangue deixados em cenas de crime. É como se a cantora, longe de garantir possíveis respostas, revelasse ao público um álbum que exige ser desvendado. Um delirante labirinto de sons e sensações que se entrelaçam até a música de encerramento do trabalho, Christina’s World.

Mesmo imersa nesse ambiente contemplativo, Johnston apresenta uma série de faixas marcadas pelo forte caráter acessível. É o caso de Promise Ring. Da construção dos versos à sobreposição das vozes e incontáveis camadas instrumentais, tudo parece pensado para envolver o ouvinte, culminando no catártico fechamento que rompe com a base atmosférica do restante da obra. “Você é o segredo que eu sangro / Eu sou a promessa que você não pode cumprir / O amor vai partir seu coração para sempre“, canta. O mesmo tratamento acaba se refletindo na já citada Enemy, composição que se espalha em um intervalo de mais de sete minutos de duração, porém, estabelece na construção dos arranjos e melodias inebriantes um acabamento totalmente hipnótico, feito para encantar o ouvinte.

Parte desse resultado vem da escolha da cantora em estreitar a relação com diferentes colaboradores ao longo da obra, ampliando os limites do trabalho. São nomes como Vyva Melinkolya, Zachary Cole Smith, do DIIV, e o músico Dan Barrett, da banda Have A Nice Life, que surgem em momentos estratégicos do registro. Nada que pareça minimizar a força criativa e completa entrega da multi-instrumentista. Do momento em que tem início, em God is a Cop, até alcançar a derradeira Christina’s World, tudo gira em torno das histórias e sentimentos da artista. A própria imagem de capa do disco, uma fotografia da mãe de Johnston, tirada nos anos 1980, quando tinha a mesma idade da musicista, parece contribuir para esse direcionamento particular que orienta a construção do álbum.

Se por um lado esse evidente controle de Johnston garante ao público uma obra homogênea e consistente durante toda sua execução, por outro, tropeça na forte similaridade entre as faixas. Assim como em Forever, a musicista se limita em excesso ao desenvolvimento de composições densas e atmosféricas, sempre guiadas pelo uso calculado das guitarras, camadas de sintetizadores e bateria econômica. O típico caso de um registro que passaria despercebido não fosse o completo refinamento dado aos versos. São canções que nascem pequenas, por vezes discretas, mas que invariavelmente se revelam maiores e mais complexas a cada nova audição, indicativo do completo domínio multi-instrumentista mesmo nos momentos de maior instabilidade e repetição do trabalho.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.