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Crítica

Kaina

: "Next To The Sun"

Ano: 2019

Selo: Scooper Records

Gênero: R&B, Neo-Soul, Hip-Hop

Para quem gosta de: Noname, Kali Uchis e Jamila Woods

Ouça: Could Be a Curse e Ghost

7.8
7.8

“Next To The Sun”, Kaina

Ano: 2019

Selo: Scooper Records

Gênero: R&B, Neo-Soul, Hip-Hop

Para quem gosta de: Noname, Kali Uchis e Jamila Woods

Ouça: Could Be a Curse e Ghost

/ Por: Cleber Facchi 19/07/2019

Do prolífico e naturalmente movimentado cenário cultural de Chicago, em Illinois, descendem alguns dos registros mais significativos do novo R&B. São obras consumidas pela melancolia dos versos, caso de Care For Me (2018), do rapper Saba; a poesia política de Legacy! Legacy! (2019), segundo e mais recente registro de inéditas de Jamila Woods, além, claro, de uma seleção de álbuns marcados pela profunda leveza na composição dos arranjos, melodias e vozes, marca de Ravyn Lenae, no bom Crush EP (2018), ou mesmo Noname, em todo o catálogo de projetos entregues nos últimos anos, como Room 25 (2018).

Parte desse mesmo universo criativo e colaboradora em diferentes obras de destaque apresentadas nos últimos meses, Kaina Castillo utiliza desse diálogo com a cena local, porém, de forma particular, estimulo para o material entregue no primeiro álbum de estúdio da carreira, Next To The Sun (2019, Scooper Records). Concebido em parceira com o conterrâneo Sen Morimoto, outro personagem de destaque na música de Chicago, o registro de nove faixas vai do R&B ao neo-soul em uma linguagem propositadamente irregular, proposta que vai do experimentalismo atmosférico ao delicado uso de elementos da música latina.

De ascendência venezuelana e guatemalteca, Castillo utiliza desse diálogo com o regionalismo sul-americano como elemento de composição estética. Exemplo disso está na própria faixa-título do disco. Da versatilidade na formação das batidas, passando pelo calor abrasivo que emana das guitarras, difícil não lembrar de Kali Uchis, em Isolation (2018), e Rosalía, no elogiado El Mal Querer (2018), efeito direto do colorido conjunto de ideias e referências pontuais que borbulham no interior da canção. São variações rítmicas e pequenas rupturas conceituais que orientam a experiência do ouvinte até o último instante da obra, na festiva Green.

Mesmo quando parte desse direcionamento regional, interessante perceber como Castillo em nenhum momento tende ao óbvio. É o caso de Could Be A Curse, música que parte de uma base atmosférica, típica do R&B dos anos 1990, para mergulhar em melodias acústicas e vozes em coro que se espalham em uma medida própria de tempo. São camadas instrumentais marcadas pelo detalhismo quase psicodélico dos arranjos, abrindo passagem para a letra trilíngue compartilhada com Morimoto. “Apenas eu e a lua / Me sinto tão sozinha ao dormir / Na minha preocupação, aqueço os lençóis / Eu apenas tento dormir“, canta.

Claro que essa busca de Castillo por um registro deliciosamente versátil não interfere na produção de músicas ancoradas em moldes tradicionais. Perfeita representação desse resultado ecoa com naturalidade em Ghost, segunda faixa do disco. São pouco mais de três minutos em que a cantora parte de uma base densa e arrastada para mergulhar em conflitos intimistas, íntimos de qualquer ouvinte. Surgem ainda músicas como What’s a Girl e Waiting On a Day, faixas que dialogam com o mesmo universo criativo de nomes como Lizzo e Janelle Monáe, aproximando o trabalho da cantora de uma parcela maior do público.

Doloroso e acolhedor na mesma proporção, Next To The Sun cumpre com naturalidade o papel de apresentar o trabalho de Castillo, garantindo novo direcionamento estético, lírico e conceitual ao criativo núcleo de Chicago. Da poesia romântica que orienta a composição dos versos, passando pela colagem de fórmulas instrumentais e ritmos que apontam para diferentes campos da música, tudo se projeta de forma sensível e autoral, como um reflexo da alma e experiências acumuladas pela cantora desde o início da promissora carreira.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.