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Crítica

Charly Bliss

: "Young Enough"

Ano: 2019

Selo: Barsuk

Gênero: Indie Rock, Power Pop, Pop Rock

Para quem gosta de: The Strokes e Speedy Ortiz

Ouça: Young Enough, Capacity e Hurt Me

8.4
8.4

“Young Enough”, Charly Bliss

Ano: 2019

Selo: Barsuk

Gênero: Indie Rock, Power Pop, Pop Rock

Para quem gosta de: The Strokes e Speedy Ortiz

Ouça: Young Enough, Capacity e Hurt Me

/ Por: Cleber Facchi 17/05/2019

Relacionamentos abusivos, o medo de encarar a vida adulta e a constante sensação de fracasso gerada a partir de um amadurecimento forçado dos indivíduos. Em Young Enough (2019, Barsuk), segundo álbum de estúdio do grupo nova-iorquino Charly Bliss, cada fragmento do trabalho reflete a alma e poesia sensível de Eva Hendricks (voz e guitarra). Um olhar melancólico e sempre confessional sobre a vida adulta, mas que em nenhum momento distorce a capacidade da banda, completa pelos músicos Sam Hendricks (bateria), Spencer Fox (guitarra e voz) e Dan Shure (baixo e voz), em produzir um registro de essência melódica, pop, estrutura que vem sendo aprimorada desde a bem-sucedida estreia do quarteto com Guppy (2017).

Menos urgente em relação ao registro que o antecede, o trabalho que conta com produção do experiente Joe Chiccarelli (U2, The Strokes) encontra no uso complementar dos sintetizadores e melodias descomplicadas a base para uma obra que dialoga de forma imediata com o ouvinte. Parte dessa estrutura vem do evidente desejo do quarteto em revisitar a obra de veteranos da New Wave, como The Cars, além, claro, de incorporar uma série de elementos originalmente testados por Carly Rae Jepsen, em Emotion (2015), uma das principais referências criativas para o presente álbum.

O resultado dessa rica colagem de elementos está na produção de uma obra que avança criativamente, porém, preserva a essência do grupo nova-iorquino. São ecos de Bruce Springsteen e Tom Petty, na faixa-título do disco; em Capacity, um precioso cruzamento de informações que soa como um encontro entre os Strokes da fase Room on Fire (2003) com Britney Spears; no colorido nostálgico de Chatroom, o mesmo rock eletrônico incorporado por nomes como The Killers e Bloc Party no início da década passada; movida pela força das guitarras, batidas e vozes rápidas, Camera aponta para a mesma atmosfera de Exile in Guyville (1993), obra-prima de Liz Phair. Ideias e diálogos improváveis com diferentes campos da música que sintetizam a versatilidade do quarteto.

Enquanto a base melódica do trabalho parece dançar pelo tempo, em se tratando dos versos, Hendricks mergulha de forma confessa no mesmo universo temático detalhado por Lorde em Melodrama (2017). O resultado desse forte direcionamento poético está na produção de músicas como Hurt Me, canção inspirada em Liability, da cantora neo-zelandesa, mas que cresce de forma particular na temática de um relacionamento abusivo detalhado pela vocalista do Charly Bliss. “Você está rindo e eu estou acenando de volta / Fácil, mas você não é nada disso / Olhos como um funeral, boca como uma contusão / Veias como um corredor, voz como uma ferida / Você não quer me machucar“, canta em meio a sintetizadores e temas atmosféricos.

Na faixa-título do disco, a mesma riqueza na composição dos versos e doloroso resgate nostálgico que passeia pelas memórias de Hendricks. “Quem sou eu se não tenho você agora? / Ninguém conhece / O destino de uma paixão / Como eu tive que consumir e nos destruir / Somos jovens o suficiente / Para acreditar que deveria doer tanto“, desaba em meio a cenas reais e memórias de um passado ainda recente. Instantes em que reflete sobre relacionamentos fracassados, a própria depressão e o lento distanciamento entre os indivíduos, conceito reforçado em músicas como Chatroom, Hard To Believe e Under You.

Pop e desafiador na mesma proporção, Young Enough mostra o esforço de Eva Hendricks e seus parceiros de banda em produzir uma obra de essência equilibrada. São versos consumidos pela dor que se entrelaçam em meio a arranjos descomplicados e linhas de vozes sempre melódicas, como se pensadas para grudar na cabeça do ouvinte logo em uma primeira audição do trabalho. Um evidente exercício de amadurecimento criativo que se reflete na forma como diferentes referências criativas, sentimentos e possibilidades se espalham de forma a ocupar toda a extensão do registro.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.