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Crítica

Yves Tumor

: "Heaven to a Tortured Mind"

Ano: 2020

Selo: Warp

Gênero: Experimental, Rock Alternativo

Para quem gosta de: Dean Blunt, Blood Orange e Arca

Ouça: Kerosene! e Gospel For A New Century

8.5
8.5

Yves Tumor: “Heaven to a Tortured Mind”

Ano: 2020

Selo: Warp

Gênero: Experimental, Rock Alternativo

Para quem gosta de: Dean Blunt, Blood Orange e Arca

Ouça: Kerosene! e Gospel For A New Century

/ Por: Cleber Facchi 07/04/2020

De todas as músicas entregues por Yves Tumor durante o lançamento de Safe in the Hands of Love (2018), Noid segue como uma das mais curiosas. Longe do experimentalismo eletrônico que marca grande parte do trabalho, sobrevive na escolha dos samples, instrumentação destacada e uso das vozes a passagem para um universo criativo completamente reformulado. É como se longe da atmosfera densa detalhada nos introdutórios When Man Fails You (2015) e Serpent Music (2016), o cantor, compositor e produtor norte-americano entrasse no rock dos anos 1970 o estímulo para um novo direcionamento estético, proposta que ganha ainda mais destaque nas canções de Heaven to a Tortured Mind (2020).

Registro mais acessível e desafiador do músico de Miami, o trabalho que conta com produção assinada por Justin Raisen (Angel Olsen, Kim Gordon), mostra a capacidade de Sean Bowie, grande responsável pelo projeto, em transitar por diferentes possibilidades temáticas, porém, preservando a própria identidade criativa. Exemplo disso está na introdutória Gospel For A New Century, música que parte de trechos de 이송아, da sul-coreana Lee Son Ga, para mergulhar em um universo de vozes complementares, ruídos e batidas cíclicas, como uma extensão do som apresentado em Noid.

É partindo justamente dessa colorida colagem de ideias, que Bowie orienta a experiência do ouvinte até a derradeira A Greater Love. São camadas de guitarras, metais recortados de disco obscuros dos anos 1970 e texturas sempre detalhistas, como se diferentes obras fossem condensadas dentro de um único registro. O mais curioso talvez seja perceber o mesmo preciosismo na entrega músicas essencialmente curtas. São faixas como Identity Trade e as já conhecidas Romanticist e Dream Palette, em que o artista norte-americano parece testar os próprios limites em intervalo de poucos minutos. Frações instrumentais que se entrelaçam sem ordem aparente, jogando com a interpretação do público.

Entretanto, assim como em Safe in the Hands of Love, na mesma medida em que parece desafiar o próprio ouvinte, Yves Tumor estabelece pequenos respiros criativos que refletem o lado menos complexo da obra. É o caso da já citada A Greater Love e Super Stars, faixa que vai do rock ao R&B em uma linguagem deliciosamente acessível, estrutura que aponta para os trabalhos Prince na segunda metade dos anos 1980. A mesma proposta acaba se refletindo mais à frente, em Strawberry Privilege, música que esbarra na psicodelia, porém, preserva o mesmo pop torto do artista estadunidense.

Interessante notar em Kerosene!, quarta faixa do disco, um ponto de equilíbrio entre esses dois universos. Composição mais extensa do disco, a música ganha forma em meio a melodias empoeiradas, guitarras e vozes compartilhadas com a nova-iorquina Diana Gordon. Instantes em que Bowie vai do soul ao rock clássico sem necessariamente perder o caráter inventivo da obra, estrutura que ganha ainda mais destaque na letra confessional da canção. “Eu posso ser qualquer coisa / Me diga o que você precisa / Eu posso ser seu bebê na vida real / Eu posso viver nos seus sonhos / Eu posso ser o que você precisa“, cresce o coro de vozes cuidadosamente trabalhados em estúdio.

Repleto de participações especiais, como a cantora Kelsey Lu, o saxofonista Sylvain Carton e o multi-instrumentista Joe Kennedy, Heaven to a Tortured Mind mostra a capacidade de Yves Tumor em se reinventar criativamente mesmo em um curto intervalo de tempo. Do momento em que o ouvinte é prontamente transportado para dentro do disco, logo na introdutória Gospel For A New Century, passando pela entrega de músicas como Strawberry Privilege, Kerosene! e Medicine Burn, cada composição se abre de forma a revelar um mundo de novas possibilidades, indicativo de uma obra tão complexa e desafiadora quanto o registro que a antecede.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.