Disco: “Arrocha”, Curumin

/ Por: Cleber Facchi 25/04/2012

Curumin
Brazilian/Alternative/Experimental
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Por: Cleber Facchi

Curumin

Luciano Nakata, o Curumin, não está nem um pouco errado quando diz que Arrocha é um disco que “tem uma pressão” dentro dele. Parcialmente oposto do que o cantor e compositor paulistano vinha desenvolvendo com os dois elogiados Achados e Perdidos (2005) e Japan Pop Show (2008), o novo álbum se expande como um mineral resistente, de brilho raro e que parece esculpido inteiramente em cima da pressão de batidas secas. Distante das formas instrumentais e do suingue que conduzia a carreira do músico até pouco tempo, o registro se aproxima de forma natural da música eletrônica, referência que há tempos circunda a discografia do artista, mas que somente agora assume as rédeas e os experimentos do recente álbum.

Mesmo que a mudança e novos rumos se apoderem do trabalho, não há em nenhum momento a percepção de uma quebra brusca no que Curumin vinha desenvolvendo. Parte do que assume os comandos do disco já era visível durante toda a extensão do álbum anterior. A diferença está na curva assumida pelo músico no recente lançamento, como se durante a execução da faixa Kyoto, uma das melhores do último disco, o paulistano optasse por abandonar o som orgânico que vinha explorando para se concentrar exclusivamente no aperfeiçoamento das batidas e de todo o referencial sintético que acabam se revelando ao longo do novo projeto.

Construído e gravado quase inteiramente em casa, dentro de um estúdio particular e improvisado pelo artista, o álbum transparece a todo instante a formação de um produto musical rústico, que se ausenta dos mesmos detalhes e acertos essenciais para a formação do último disco. Esse caráter de urgência – e mais uma vez pressão – está presente logo na construção da faixa de abertura, algo que os sintetizadores acizentados e os beats quadrados de Afoxoque transparecem de forma rápida e assertiva. O mesmo posicionamento se mantém sólido até os instantes finais do disco, que tem na segunda metade dele a expansão do lado experimental de Curumin.

O caráter de urgência que pontua a quase totalidade de Arrocha faz com que ele se oriente como um disco intencionalmente curto e permeado por vinhetas e introduções. Das 14 composições do álbum, apenas seis delas ultrapassam os dois minutos de duração, sendo o restante do lançamento composto por músicas rápidas e pequenos experimentos onde Nakata deposita parte do acerto que traduz o disco. Em Sapo Garimpeiro, por exemplo, batidas ruidosas e samples são condensados em uma composição que toca a produção britânica, esbarra no funk carioca e mergulha fundo no tom esverdeado das músicas do paulistano. A leveza das faixas garantem respiro ao álbum, que entre uma passada e outra pelas antigas referências do músico, prova de todo um novo cardápio de escolhas e experiências.

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Mesmo que essa força (quase) brutal delimite a totalidade do projeto, não são poucos os momentos em que Nakata abstrai o aspecto intenso do disco para se apoiar na mesma leveza e no suingue de outrora. Todavia, a grande diferença entre a proposta dos registros anteriores e do novo álbum está no romantismo que comanda faixas como Doce e Passarinho, dois exemplos de toda a sutileza que banha o LP e acaba estabelecendo um interessante contraste no posicionamento das faixas. Enquanto o amor passeava ao fundo dos antigos trabalhos, hoje ele ganha um lugar de desataque, como se em meio ao agrupado de batidas secas e reformulações eletrônicas que dão vida e distinção ao projeto, doses de calmaria brotassem de forma natural e envolvente.

Bem menos “politizado” ou crítico do que o espírito que regia algumas faixas do último disco – principalmente Mal Estar Card e Caixa Preta -, em Arrocha Curumin volta a explorar letras tomadas pelos mesmos retratos do cotidiano que marcaram todo o inaugural Achados e Perdidos. A característica que preenche os momentos mais românticos da obra se evidencia também na aconchegante Vestido de Prata e na pacata Pra Nunca Mais, músicas rodeadas por uma aura simplista e que por vezes as tornam ocultas dentro do composto eletrônico e amplo que caracteriza o novo projeto.

Ao lado de Lucas Santtana (com O Deus Que Devasta, Mas Também Cura) e da cantora Céu (com Caravana Sereia Bloom), Curumin faz de Arrocha um trabalho que revive todas as revoluções que se apoderaram do cenário brasileiro entre 2008 e 2009, quando a mesma tríade – seguida de Cidadão Instigado, Wado, Otto, Guizado e Emicida – rompeu com todas as lógicas e limites dos sons nacionais. Mais do que um reencontro (não intencional), ver esses três artistas ocupando novamente um mesmo espaço com álbuns tão ou mais complexos que os trabalhos anteriores, só reforça o quanto ainda é cedo para se impressionar.

Assim como o que aconteceu com o alagoano Wado no lançamento do excepcional Samba 808 no ultimo ano, Curumin vai de encontro ao que talvez já fosse velho e por vezes desgastado na música brasileira (e internacional), utilizando de elementos básicos (nesse caso um fino toque de eletrônica e outros temperos sintetizados) para incorporar ao registro um aspecto moderno e desafiador. Mesmo a capa colorida que simboliza o trabalho é um reflexo mínimo perto da grandiosidade de sons, referências e todos os múltiplos caminhos que se abrem até o encerramento da obra.

Arrocha (2012, Vinyl Land)

Nota: 8.7
Para quem gosta de: Wado, Lucas Santtana e Maquinado
Ouça: Selvage, Passarinho e Tupazinho Guerreiro

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.