Disco: “Ava Patrya Yndia Yracema”, Ava Rocha

/ Por: Cleber Facchi 04/08/2015

Ava Rocha
Indie/Alternative/Experimental
http://www.avarocha.com/

Fotos: Daryan Dornelles

“Iniciante” é uma palavra que não se aplica ao trabalho de Ava Rocha. Filha do cineasta Glauber Rocha (1939 – 1981), a artista que já se relacionou com diferentes campos da artes, como o teatro, cinema e, em 2011, apresentou o primeiro álbum com a banda Ava, Diurno, encontra no primeiro trabalho em carreira solo um espaço em branco, entregue ao experimento e criação. Uma obra tecida com simplicidade e referências talvez óbvias – como Gal Costa e Cássia Eller -, entretanto, lentamente joga com a interpretação do ouvinte, provocado pelos momentos de caos e acolhido nos instantes de explícita melancolia.

Queria um disco pop, inventivo, quente, político, sensual, um disco que reunisse uma série de elementos com uma linha inventiva, que a gente pudesse pirar”, disse a cantora em entrevista ao G1. Curioso encontrar em cada faixa de Ava Patrya Yndia Yracema (2015, Independente) uma pequena porção de cada um dos temas apresentados pela cantora, também responsável pelos versos que sustentam a presente obra. Sem necessariamente perder o controle, ou tropeçar, o registro que conta com a participação de Pedro Sá, Domenico Lancelotti e os quatro integrantes da banda carioca Do Amor é uma obra que delira, explode e encolhe a todo o instante.

Ao mesmo tempo em que a inaugural Boca do Céu aproxima a artista do mesmo universo “denso” da cena paulistana criada por membros do Metá Metá e Passo Torto, em minutos, o romantismo de Você não vai passar e Transeunte Coração arremessa sem dificuldades o ouvinte para um novo cenário de possibilidades – muito mais pop, descomplicado e acessível. Como indicado logo na capa do disco, uma imagem de temática nonsense, talvez lisérgica, APYY é um trabalho feito para brincar com interpretação do ouvinte, longe de prováveis pontos de apoio e imposições óbvias.

Parte desse resultado surge como um efeito direto da interferência de Jonas Sá, produtor do disco. Convidado para trabalhar com a cantora em estúdio, o cantor e compositor carioca transporta para dentro do álbum parte da estética, sonoridade, excentricidade e referências também exploradas no interior de BLAM! BLAM! (2015), último registro solo do músico. A diferença está na direção assumida por cada artista. Enquanto Sá assume uma trilha marcada pela sexualidade e versos focados na boemia, Rocha mergulha de cabeça na própria intimidade, detalhando relacionamentos fracassados, temas existencialistas e tormentos que bagunçam a mente de qualquer indivíduo.

A sonoridade arquitetada para o disco contribui de maneira expressiva para o crescimento de cada canção. De um lado, o uso de temas “atmosféricos”, sempre densos, caso de Beijo no Asfalto, Hermética e Mar ao Fundo, músicas que parecem extraídas de diferentes obras cinematográficas lançadas nos anos 1960/1970. No outro oposto, a utilização de arranjos, temas e interferências instáveis, típicas da música tropicalista. Uma constante mudança de direção que flerta com a obra de veteranos como Caetano Veloso sem necessariamente escapar do tracejado temático assumido por Rocha logo na primeira canção.

Ainda que carregue o nome de Ava Rocha, Ava Patrya Yndia Yracema está longe de parecer uma obra centrada apenas no universo particular da cantora. A cada faixa, um diferente personagem – real ou fictício -, que cresce e dança aos comandos e arranjos versáteis do time de colaboradores. Um trabalho que parece longe de garantir respostas, pelo contrário, parece apenas brincar com a mente do ouvinte.

Ava Patrya Yndia Yracema (2015, Independente)

Nota: 9.0
Para quem gosta de: Alice Caymmi, Carne Doce e Do Amor
Ouça: Boca do Céu, Coração Transeunte e Mar ao Fundo

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.