Disco: “Bisch Bosch”, Scott Walker

/ Por: Cleber Facchi 06/12/2012

Scott Walker
Avant-Garde/Experimental/Singer-Songwriter
http://4ad.com/artists/scottwalker

Por: Cleber Facchi

Scott Walker

A ruptura entre os iniciais trabalhos de Scott Walker e a fase experimental iniciada em meados dos anos 90 praticamente transformaram o músico norte-americano em dois artistas diferentes. Enquanto os projetos iniciais vinham banhados pela leveza do pop rock dos anos 1960, o ressurgimento há duas décadas serviu para separar de maneira brusca toda a trajetória do influente artista – responsável por inspirar uma centena de bandas, entre elas Radiohead e Pulp. Dando segmento ao que fora alcançado com o álbum Tilt (1995) e posteriormente aprimorado em The Drift (2006), o veterano reforça de maneira ainda mais áspera sua presença no panorama musical com Bisch Bosch (2012, 4AD).

Se levarmos em conta a variedade de instrumentos, sons distintos, vozes e delineamentos sonoros, pouco se transformou desde o trabalho de estreia do músico em carreira solo. A diferença está na forma como Walker da vazão a essa mesma sonoridade, agora perturbada e sempre pessoal. O que antes era trabalhado de forma a resultar em doces composições de amor, exaltações à mulher amada e até um fino toque de esperança, hoje vem rompido pela agressividade das palavras. É como se o poeta buscasse encontrar a exata formatação lírica para os ruídos que passeiam pelo álbum, transitando sempre pelo desespero e o humor negro.

Rompendo com a fórmula trabalhada desde meados da década de 1990 e ainda assim acertando nos versos, Bisch Bosch passa longe da atmosfera sombria testada há seis anos, sendo um trabalho muito mais pensado na instrumentação e na forma como os sons se locomovem do que nas palavras em si. Por diversas vezes o barítono de Walker é aplicado como um complemento ao engenho sonoro, transformando os versos distribuídos no decorrer do disco em um mero realce aos acordes obtusos e principalmente em relação à percussão expansiva que toma conta de grande parte do disco.

[youtube:http://www.youtube.com/watch?v=2Ih7KzKLLWA?rol=0]

[youtube:http://www.youtube.com/watch?v=TWi3ZymnHHY?rol=0]

Pensado em cima de pausas constantes, respiros sonoros por vezes confusos e a alteração sequencial das formas instrumentais, em alguns momentos o disco abandona as barreiras experimentais para se abrir ao público. Exemplo mais consistente da capacidade de Walker em soar acessível está na surpreendente Epizootics!. Grandiosa e delicada na mesma proporção, a faixa esbarra no jazz da década de 1970 até retornar sintetizada ao presente. Ora passeando pela fusão de sons proclamados por Herbie Hancock, raspando em Steve Reich e até capaz de brincar com a psicodelia recente de vários grupos norte-americanos, a música surge como o resultado final da inventiva trilogia de Scott.

Mesmo quem já está acostumado aos realces sombrios e a esquizofrenia do músico precisa entrar em Bisch Boschcom parcimônia. Primeiro pela multiplicidade de detalhes incorporados em cada diferente faixa, depois pela forma complexa como cada música é pensada individualmente. SDSS14+13B (Zercon, A Flagpole Sitter), por exemplo, traz em mais de 20 minutos de duração uma gama de possibilidades tão extremas que praticamente a transformam em um registro isolado do restante do álbum. Mesmo a pequena Pilgrim esconde tantas nuances e fórmulas complexas que ouvir sem atenção é deixar passar um catálogo vasto de referências.

Por se tratar de uma obra que demanda tempo para ser apreciada como um todo – ainda que toda audição revele um novo resultado -, Bisch Bosch deve ser aceito mesmo que inicialmente cause “desconforto” ao ouvinte. Levando em conta os grandes espaços de tempo que Scott Walker leva para apresentar um novo disco – não se sabe ainda se este será o último da carreira do cantor -, o presente álbum deve gerar audições suficientes para que ao menos parcialmente absorvido, entregando ao ouvinte a ponta do iceberg sonoro que o artista mantém submerso. Leve o tempo que for para ser digerido uma coisa permanece certa: veteranos ou músicos recentes, ninguém lida com tamanho invento de forma tão corajosa quanto Scott Walker.

Scott Walker

Bisch Bosch (2012, 4AD)

Nota: 8.0
Para quem gosta de: Swans, John Cale e Lou Reed
Ouça: Epizootics!

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.