Disco: “★ (Blackstar)”, David Bowie

/ Por: Cleber Facchi 08/01/2016

David Bowie
Rock/Alternative/Art Rock
http://davidbowie.com/blackstar/

I’m not a popstar
I’m not a film star
I’m not a wandering star
I’m a blackstar, I’m a blackstar

A negativa sequência de versos espalhada nos instantes iniciais de Blackstar apontam a direção do 25º álbum de estúdio de David Bowie. Em ★ (2016, RCA / Columbia), segundo registro de inéditas do cantor e compositor britânico desde o regresso com The Next Day, de 2013, um catálogo de temas sombrios, pessimistas e essencialmente cotidianos se agrupam de forma a sufocar o ouvinte. Um misto de reverência e reinvento que passeia por elementos da discografia do cantor, mas que em nenhum momento ecoa como uma gasta reciclagem de ideias.

Imerso em uma solução de temas “jazzísticos” e experimentos anteriormente testados em obras como Station to Station (1976) e Heathen (2002), ★ mostra um artista que conseguiu alcançar a maturidade, porém, continua em busca de novas ferramentas, ritmos e possibilidades a serem exploradas em estúdio. Da sonoridade flexível e detalhista de ‘Tis a Pity She Was a Whore aos entalhes eletrônicos de I Can’t Give Everything Away, poucas vezes o título de “camaleão do rock” de Bowie pareceu tão coeso.

Mais uma vez acompanhado pelo produtor Tony Visconti, parceiro desde o clássico Space Oddity, de 1969, Bowie, para além do próprio universo de temas e conceitos autorais, faz de ★ uma obra entregue ao domínio de novos colaboradores. Nomes como Jason Lindner, Donny McCaslin, Ben Monder e Mark Guiliana; um verdadeiro time de personagens ativos na cena nova-iorquina de Jazz. Da mesma Nova York vem o produtor James Murphy (LCD Soundsystem), responsável por parte da percussão e encaixes eletrônicos que sustentam o disco.

Dentro desse cenário de permanente mutação, Bowie apresenta ao público uma obra que dialoga com o caos. Conflitos urbanos, sociais e pessoais que ultrapassam os limites da identidade visual proposta para o clipe de Blackstar e crescem nos versos de cada canção. “Ver mais e sentir menos / O não que significa sim / Isso é tudo que eu sempre quis dizer / Essa é a mensagem que enviei”, canta o veterano em I Can’t Give Everything Away, faixa que mergulha no isolamento dos indivíduos e ainda brinca com o simbolismo sombrio, por vezes religioso, que abastece a obra.

Terceira faixa do disco, a densa Lazarus nasce como uma espécie de síntese das canções que abastecem ★. Da base jazzística que cresce lentamente, passando pela lírica repleta de metáforas sobre a morte e elementos ocultistas, Bowie finaliza uma composição que não apenas dialoga com a passagem bíblica da ressurreição de Lázaro, como analisa aspectos da própria carreira do cantor. De fato, a presença de Bowie como protagonista do trabalho se revela a cada nova sequência de versos. Um protagonismo explícito, mas que em nenhum momento interfere na relação do ouvinte com o álbum, vide a empática sensação reforçada pelos versos de Dollar Day – “Eu estou morrendo também”.

Inspirado pelo trabalho de Kendrick Lamar em To Pimp a Butterfly (2015), Bowie faz de ★ uma obra que dialoga com o presente. São faixas como Dollar Days, I Can’t Give Everything Away e Lazarus que distanciam o cantor do isolamento quase “divino” dos últimos trabalhos em estúdio, fazendo do presente álbum a obra mais provocativa desde o último suspiro dançante de Bowie no começo dos anos 1980.

 

★ (2016, RCA / Columbia)

Nota: 8.7
Para quem gosta de: Brian Eno, Morrissey e Paul McCartney
Ouça: Blackstar, Lazarus e I Can’t Give Everything Away

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.