Disco: “Blank Project”, Neneh Cherry

/ Por: Cleber Facchi 25/02/2014

Neneh Cherry
Electronic/Female Vocalists/Trip-Hop
http://nenehcherry.com/

Por: Cleber Facchi

Neneh Cherry

É um erro encarar os 18 anos que separam Man (1996), terceiro registro em estúdio da cantora Neneh Cherry, de seu sucessor, o recém-lançado Blank Project (2014, Smalltown Supersound). Ainda que o distanciamento entre um trabalho e outro tenha acrescentado uma vírgula extensa aos inventos em carreira solo da artista sueca, Cherry, diferente de tantos músicos que mergulham no silêncio e no isolamento autoral, aproveitou como poucos o período de “férias” e todo esse distanciamento da própria obra.

Como se não bastassem as interferências em registros tão opostos quanto Love Box (2002) do Groove Armada e Demon Days (2005) do Gorillaz, desde 2006 a cantora é parte importante do CirKus, coletivo de Trip-Hop que, entre outros nomes, conta com Burt Ford (Massive Attack, Portishead) como um dos principais organizadores. Os pequenos desdobramentos e rápidas colaborações se estendem até The Cherry Thing, parceria com o grupo norueguês The Thing lançada em 2012 e faísca para a explosão controlada que parece alimentar a presente obra da cantora.

Continuando exatamente de onde parou em 1996, porém, atenta aos desdobramentos recentes dos gêneros que a apresentaram, Cherry dança por um conjunto de referências atuais, mas ainda assim pontuadas pela nostalgia. São músicas como Across the Water, logo na abertura do disco, que se relacionam com toda a intimidade melancólico dos primeiros inventos da cantora, ao mesmo tempo em que outras, como a faixa-título, anunciam uma liberdade poucas vezes vista dentro da obra de Cherry. Um constante cruzamento entre passado e presente que organiza toda a atmosfera do disco.

Tão confessional quanto qualquer outro registro da cantora, Blank Project é um trabalho em que a maturidade de Cherry se converte como uma ferramenta extra para a formação do projeto. Matéria-prima do próprio disco, a artista usa de músicas como Naked ou mesmo da própria faixa-título como um reforço da individualidade lírica do registro, entretanto, são os versos de Everything, faixa de encerramento da obra que Cherry se revela em essência: “Eu gostaria de vê-lo/ Ter me divertido/ Se você puder/ Eu olho para você/ Mas sou eu que vejo”.

Ainda que o enclausuramento dos versos sirva como um ponto específico para o isolamento de Cherry, parte desse resultado vem da forte influência de Kieran Hebden quanto produtor do álbum. Grande mente aos comandos do Four Tet, o artista britânico é o grande responsável pela tapeçaria eletrônica cíclica que se desenvolve ao longo do projeto. Valorizando toda as nuances da voz de Cherry, Hebden apresenta desde faixas marcadas pela serenidade, caso de 422, até músicas ascendentes, ponto em comum entre a inicial faixa-título e a derradeira Everything.

Mesmo contando com a interferência da conterrânea Robyn (no R&B sintetizado de Out of the Black), é de Neneh Cherry o completo domínio do álbum. Assumindo diferentes interpretações de si própria em um mesmo universo, a cantora espalha os próprios sentimentos de forma aleatória, ocupa territórios líricos/musicais para finalizar o álbum com uma imposição tão original quanto nos registros passados. Uma prova de que os 18 anos “de espera” apenas amadureceram o teor da obra exposta em Blank Project.

 

Neneh Cherry

Blank Project (2014, Smalltown Supersound)

Nota: 8.0
Para quem gosta de: Björk, Four Tet e CirKus
Ouça: Blank Project, Naked e Everything

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.