Disco: “B’lieve I’m Goin Down…”, Kurt Vile

/ Por: Cleber Facchi 29/09/2015

Kurt Vile
Indie/Folk/Singer-Songwriter
http://www.kurtvile.com/

A boa fase de Kurt Vile parece longe de chegar fim. Em um ascendente sequência de registros autorais, entre eles os recentes Smoke Ring for My Halo (2011) e Wakin on a Pretty Daze (2013), o compositor e cantor norte-americano encontra no sexto álbum de inéditas uma espécie de fuga da psicodelia bucólica testada nos últimos cinco anos. Versos e arranjos detalhados de forma sempre intimista, passagem para o catálogo de temas sombrios que define cada uma das composições de B’lieve I’m Goin Down… (2015, Matador).

Ainda que temas como abandono, isolamento e depressão sejam encarados com naturalidade dentro dos trabalhos de Vile, marca explícita desde o inaugural Constant Hitmaker (2008), poucas vezes antes o artista original da cidade de Filadélfia, Pensilvânia pareceu abraçar a (própria) tristeza com tamanha delicadeza e comoção quanto no presente disco. Da abertura com Pretty Pimpin – “Eu acordei esta manhã / E não reconheci o homem no espelho” – ao ato final de Wild Imagination – “Eu estou com medo de que estou sentindo muitos sentimentos”, difícil não ser arrastado pela lírica triste e solitária do cantor.

Canto uma canção triste quando estou só / Às vezes você precisa estar só para descobrir as coisas / Seja solitário, mesmo em uma multidão de amigos”, canta Vile na melancólica (e ainda sóbria) Wheelhouse. Quinta faixa do disco, a canção de versos lentos, quase declamados, parece apontar a direção assumida pelo músico em cada uma das 12 faixas que sustentam o disco. Um misto de pessimismo e clareza que destoa do personagem sonhador “interpretado” por Vile até o último disco. Não por acaso o álbum carrega o amargo título de B’lieve I’m Goin Down.

A forma como o disco parece musicalmente planejado tende a reforçar a atmosfera triste das canções. Livre dos temas ensolarados do antecessor Wakin on a Pretty Daze, Vile e o time de instrumentistas convidados para o álbum concentram na produção de bases cíclicas, sempre arrastadas e densas, montagem que parece “sufocar” o ouvinte lentamente. Uma constante sensação de que os temas delicados, por vezes oníricos de Smoke Ring for My Halo, foram agora retratados de forma torta, transformando os versos do compositor em pequenos pesadelos.

Embora sufocado pela própria melancolia e pessimismo, difícil encarar B’lieve I’m Goin Down… como uma obra exageradamente dolorosa. Durante toda a execução da obra, Vile parece criar pequenos respiros instrumentais e líricos, estímulo para a construção do dedilhado leve que finaliza All in a Daze Work e pequenos suspiros românticos que preenchem o disco em momentos pontuais.

Dessa forma, ao mesmo tempo em que boa parte das canções parecem reforçar o diálogo com nomes como Bob Dylan, Bruce Springsteen e Nick Drake, difícil encarar B’lieve I’m Goin Down… como uma obra de caráter referencial, sustentada de forma copiosa por possíveis clássicos. Ao lado do produtor Rob Schnapf, músico responsável pelos primeiros discos de Beck e todo o acervo de obras que eternizaram Elliott Smith na década de 1990, Vile sustenta mais de 60 minutos de versos intimistas, dolorosos e confessionais. O estímulo necessário para um trabalho de imediata comunicação como ouvinte.

B’lieve I’m Goin Down… (2015, Matador)

Nota: 8.5
Para quem gosta de: The War On Drugs, Real Estate e Cass McCombs
Ouça: All in a Daze Work, Wheelhouse e Pretty Pimpin

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.