Disco: “Crazy Clown Time”, David Lynch

/ Por: Cleber Facchi 08/11/2011

David Lynch
Experimental/Electronic/Dark Ambient
http://davidlynch.com/

 

Por: Cleber Facchi

 

Para além da somatória de experiências surrealistas, diálogos sempre marcados pela densidade e a constante exposição de temáticas amarradas por uma aura de mistério, a música sempre foi um elemento fundamental na carreira de David Lynch. Seja através das colaborações com o compositor Angelo Badalamenti em Twin Peaks – indubitavelmente a melhor trilha sonora que uma série televisiva já teve – ou mesmo as contribuições com o trabalho de outros artistas – como o ainda recente Dark Night of the Soul, trabalho em parceria com Dangermouse e Sparklehorse -, Lynch sempre manteve sua relação com a música dentro de um limite de constante proximidade.

Longe das telas, o norte-americano de Montana surge agora com seu primeiro registro musical solo, deixando para lá as já constantes parcerias com outros músicos – que incluem Marek Żebrowski, Chrysta Bell e John Neff – e se embrenhando na construção de uma sequência de sons que parecem se conectar diretamente com sua vasta obra cinematográfica. Quem espera por um trabalho que se relacione com o clima obscuro das películas do diretor encontrará em cada segundo de Crazy Clown Time (2011, Sunday Best) essa forte aproximação, com o (agora) cantor passeando por entre uma nuvem de sons abafados e obscuros.

Utilizando da música eletrônica como a fonte de sua obra musical, Lynch e o engenheiro de som Dean Hurley dão formas a um conjunto de 14 composições afundadas em uma atmosfera sombria e experimental, transformando o álbum em uma espécie de trilha sonora alternativa para os trabalhos visuais do diretor. Entre passeios pelo blues (explorado de forma sintetizada), predisposições ao dark ambient, além de algumas doses de rock alternativo e até noise rock no melhor estilo Sonic Youth, o registro vai lentamente circundando o ouvinte, delimitando um território musical puramente sombrio.

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Longe de se apresentar como um músico amador e um cantor passional que utiliza de sua voz em contornos artificialmente moldados – fazendo de suas aventuras pela música uma simples realização de algum milionário excêntrico -, Lynch realmente bota a mão na massa em cada uma das faixas apresentadas. Por mais que Hurley se revele como um indivíduo necessário ao longo de todo o projeto, assumindo habilmente todos os efeitos, bateria e alguns teclados do álbum, é o entusiasmado senhor de 65 anos quem acaba ditando as regras e os rumos a serem percorridos no desenrolar do trabalho.

Além de projetar todo o bem explorado jogo de versos do álbum – que contrários aos seus roteiros conseguem manter uma estranha linearidade -, Lynch assume de maneira bem fundamentada grande parte das guitarras e sintetizadores do trabalho, compondo um tipo de sonoridade que se encaixa cuidadosamente tanto com sua voz, quanto com seus obscuros versos. Como resultado, Lynch e o parceiro acabam desenvolvendo um registro realmente satisfatório, ficando muito acima da média de suas anteriores experiências pelo mundo da música.

Por mais que a presença de Karen O (Yeah Yeah Yeahs) na primeira música do álbum (Pinky’s Dream) acabe proporcionando uma eficaz abertura ao registro, mediante a grandiosidade do trabalho ela acaba soando desnecessária, com o anfitrião da obra se revelando como a única presença realmente necessária dentro da totalidade do disco. David Lynch não apenas prova ser um dos maiores e mais completos cineastas que já passaram por esse mundo, como se revela habilmente preparado para trafegar pelo mundo da música.

Crazy Clown Time (2011, Sunday Best)

 

Nota: 7.8
Para quem gosta de: Angelo Badalamenti, John Neff e
Ouça: Noah’s Ark e Strange and Unproductive Thinking

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.