Disco: “EarthEE”, THEESatisfaction

/ Por: Cleber Facchi 07/04/2015

THEESatisfaction
Soul/Electronic/R&B
http://www.theesatisfaction.com/

É difícil não interpretar o trabalho da dupla THEESatisfaction como uma “sucursal feminina” dos mesmos conceitos e experimentos testados pelo duo Shabazz Palaces. Parceiras e colaboradoras frequentes de Ishmael Butler e Tendai Maraire, Catherine Harris-White e Stasia Irons assumem desde o primeiro álbum de estúdio, awE NaturalE (2012), uma extensão do mesmo som retro-futurista dos produtores de Seattle. A diferença? Enquanto Butler e Maraire avançam em direção ao espaço, Harris-White e Irons encontram um ambiente de conforto criativo aqui mesmo, na própria Terra.

Com a chegada de EarthEE (2015, Sub Pop), segundo e mais recente trabalho de inéditas da dupla, elementos típicos da cultura africana, bases que vão do R&B/Soul dos anos 1970 ao Hip-Hop de 1990 se espalham com naturalidade em meio a versos que abraçam a marginalidade. Temas centrado no universo LGBT, preconceito racial e feminismo que dividem o mesmo espaço de versos sufocados pela saudade e melancolia; sussurros pessoais de pura sensibilidade romântica.

Menos “pessoal” em relação ao conceito intimista que abastece grande parte do álbum apresentado há três anos, EarthEE, como o título resume, é uma obra ampla – seja nos arranjos, como na própria estrutura lírica que movimenta as canções. Disfarçadas, como dois extraterrestres habitando nosso planeta, Harris-White e Irons exploram o presente registro como uma obra atual, debatendo ecologia, consumo e a interação entre os próprios humanos em composições como Planet For Sale e Universal Perspective.

Tamanha imposição “política” por parte da dupla, não apenas afasta o antigo diálogo “etéreo” com o Shabazz Places – ainda parceiros na faixa-título do disco -, como revela um acervo de novas (ou velhas) referências incorporadas pelas duas cantoras/rappers. A julgar pelo cruzamento continuo entre rima e canto, romantismo e temas urbanos, o álbum segue em divisão exata entre Erykah Badu (da série New Amerykah) e Missy Elliot (no clássico Supa Dupa Fly, de 1997). Sobram diálogos com a obra de Lauryn Hill, além de outras veteranas do Hip-Hop “feminino”.

O mesmo fluxo preciso na composição dos versos parece definir toda a estrutura rítmica do trabalho, ainda mais intenso, por vezes urgente, em relação ao anterior. Perceba como todo o enquadramento de batidas e sintetizadores velozes movimenta a trinca inicial do registro, sobrepondo – talvez de maneira involuntária – a voz de Harris-White e Irons de forma a valorizar quase que unicamente a camada instrumental que se estende até Nature’s Candy. Somente com a chegada de Post Black Anyway que o álbum “desacelera”, confirmando a relação da dupla com awE NaturalE.

Quem espera pela audição de uma nova QueenS, talvez acabe se decepcionando. Salve Blandland e Recognition, EarthEE é um disco que se esquiva da formação de hits comerciais e faixas minimamente acessíveis. Trata-se de uma obra movida de forma precisa pelo discurso, pela analise crítica dos versos e o diálogo provocativo de cada música. Um registro talvez “desestimulante” para ouvintes ansiosos, desesperados pelo mesmo fluxo pop de Janelle Monáe e Solange, porém, muito mais duradouro do que qualquer obra recente do Soul, Funk e R&B.

 

EarthEE (2015, Sub Pop)

Nota: 7.8
Para quem gosta de: Shabazz Palaces, Kelela e Fatima
Ouça: Planet For Sale, Recognition e EarthEE

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.