Disco: “Ester”, Trailer Trash Tracys

/ Por: Cleber Facchi 05/01/2012

Trailer Trash Tracys
British/Shoegaze/Lo-Fi
http://trailertrashtracys.com/
http://www.facebook.com/trailertrashtracys

Por: Cleber Facchi

Ao longo dos últimos dez anos por meio de uma convenção natural, vertentes antes obscuras e culturalmente herméticas como o shoegaze e o noise rock acabaram se convertendo em algo acessível, comercial e – para o desespero de alguns – em um som pop. Um tipo de linguagem musical que talvez se oponha ao que fora proposto em outras épocas ao que os irmãos Reid do The Jesus and Mary Chain, Thurston Moore do Sonic Youth ou Kevin Shields do My Bloody Valentine desenvolveram em seus projetos. Entretanto, se isso é uma convenção para os artistas mais recente – incluindo nomes como The Pains Of Being Pure At Heart e Smith Westerns -, para os membros do Trailer Trash Tracys isso parece não se aplicar.

Dentro dos exatos 33 minutos de duração de Ester (2012, Domino/Double Six), primeiro álbum do quarteto londrino – composto por Susanne Aztoria (vocais), Jimmy-Lee (guitarras), Dayo (bateria) e Adam J (baixo) -, torna-se praticamente impossível encontrar mínimos traços de uma tonalidade pop versátil e aberta a todos os públicos. Mesmo os vocais angelicalmente desenvolvidos de Aztoria ou os versos levemente melódicos por ela entoados parecem não se abrir exageradamente, resultando em um trabalho climático, sujo e atentamente específico.

Parte dessa necessidade da banda em compor um álbum fechado parece vir do completo afastamento do quarteto em relação ao cenário norte-americano, epicentro de todo esse cruzamento entre melodias anti-comerciais, sujeiras imoderadas e avalanches de melodias radiofônicas. De fato, a relação com a cena local faz com que as soturnas bandas britânicas dos anos 80 e início da década de 1990 como Ride (além dos demais projetos anteriormente mencionados) acabem se transformando nas únicas e marcadas referências do grupo, algo visível nas texturas sobrepostas e nas guitarras derretidas que se amontoam no interior do disco.

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Mesmo obscuro e recluso o trabalho evita a todo o momento a aproximação com uma vertente instrumental tocada pela experimentação ou ruídos demasiadamente complexos. O som atmosférico, os vocais dissolvidos como instrumentos e toda uma vertente de melodias acinzentadas estão lá, porém, distantes do surgimento de algo difícil ou inacessível em excesso. É como se o tempo todo o quarteto tivesse uma clara noção dos limites do disco, como se ele se movimentasse até certo ponto (beirando o experimental) e ali assentasse.

Provavelmente o que mais agrade em relação ao trabalho do TTT seja a total falta de conexão com todo o desgastado – e irritante – revival pós-punk que ainda hoje define o trabalho de uma maioria absoluta de grupos ingleses. Talvez pela bateria matemática de Bayo a sonoridade encorpada e densa da banda em diversos momentos acaba se aproximando de uma fluência eletrônica, algo bem evidente nas batidas retas de Turkish Heights ou na pulsação quebrada de You Wish You Were Red (provavelmente o grande hit do disco). Todavia, nada que possibilite algo demasiado dançante, com o grupo mantendo o tom soturno e a continuidade climática até o encerramento do disco.

Assim como aconteceu com o primeiro álbum Yuck no ano passado, Ester é um registro que cresce justamente ao olhar para o passado, absorvendo de velhas influências a base para a solidificação das canções que se encontram em seu interior. Entretanto, contrário ao trabalho do também grupo inglês, o presente álbum parece ter um delineamento melhor estabelecido e calculado, não caindo no aspecto excessivamente vasto – como se o disco fosse uma grande coletânea de clássicos dos anos 90 -, transformando o interior do álbum em um abrigo acolhedor e ao mesmo tempo específico para que apenas determinado grupo de canções possam se evidenciar.

Ester (2012, Domino/Double Six)

Nota: 7.7
Para quem gosta de: Cymbals Eat Guitars, Yuck e Wild Nothing
Ouça: You Wish You Were Red
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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.