Disco: “Foreign Body”, Mirroring

/ Por: Cleber Facchi 18/06/2012

Mirroring
Experimental/Ambient/Drone
http://www.myspace.com/tinyvipersss
http://www.myspace.com/grouperrepuorg

Por: Cleber Facchi

Liz Harris é uma verdadeira artesão quando se trata de mexer com as formas sonoras ambientais, ruídos sutis e exaltações suaves típicas da música drone. Ativa entusiasta do estilo desde que começou com suas produções na segunda metade da década passada, a artista passou os últimos anos se revezando na construção de projetos tomados por uma sutileza ruidosa e formas sombrias que transformaram o Grouper, projeto comandado por ela, em um dos mais elogiados e inventivos do gênero. Ao mesmo tempo em que ocupa boa parte do tempo com lançamentos contínuos, a musicista de Portland, Oregon aproveita para investir em algumas parcerias, colaborações sempre conceituais, mas que em nenhum momento superam o recente encontro entre ela e a conterrânea Jesy Fortino.

Dona de uma produção tão individual quanto Harris, Fortino assume todos os comandos dentro do Tiny Vipers, projeto em que interage por meio de construções acústicas sempre climáticas, utilizando dos vocais como uma espécie de instrumento extra para as sempre etéreas projeções por ela arquitetadas. Todavia, enquanto com o Grouper Harris alcança um trabalho sombrio e noturno, algo visível nos sintetizadores climáticos e sujos que percorrem as composições, em carreira solo Jesy transita por um universo matinal, resultando em uma sonoridade de quase oposição. Dentro desse caráter dicotômico surge o Mirroring, colaboração entre as duas artistas que fazem do recente Foreign Body (2012, Kranky) um ameno crepúsculo, um encontro entre as experiências levemente ensolaradas de uma, com o toque noturno da outra.

Ora voltado aos encantos angelicais promovidos por Julianna Barwick no também climático The Magic Place, ora flutuando nas mesmas emanações projetadas por Julia Holter no ainda recente Ekstasis, a dupla parece a todo momento partilhar referências de maneira que elas se completem. Enquanto Harris ocupa todos os espaços do álbum com teclados monumentais e densos, Fortino deixa que os vocais escorram agradáveis, temperando as canções com acordes controlados de violão, elementos que embora partilhem de uma sonoridade muito próxima do que cada uma explora em carreira solo, ecoam distintos com o passar da obra.

Se a princípio o registro abre banhado pela luz fraca do final de tarde, algo bem expresso nos sintetizadores de Fell Sound ou no violão solitário que passeia pela agradável Silent From Above, à medida que nos aproximamos do fechamento do álbum, mais o ouvinte é tragados para um universo de sonorizações escuras e amarguradas. O que antes era distinto e marcado por pequenos contrastes – vocais ou sonoros -, agora surge em meio a ruídos homogêneos, algo que os quase nove minutos da faixa Mine traduzem com vocais alongados, sintetizadores etéreos e um fino toque noturno que pende para o Grouper nos momentos mais épicos.

Por mais que Foreign Body seja claramente um registro em que o compartilhamento de influências é o que movimenta o trabalho, não são poucos os momentos em que a força de uma acaba predominando sobre a outra. Enquanto Drowning the Call é claramente uma continuação daquilo que Fortino desenvolveu em Life on Earth (2009), último registro em estúdio do Tiny Vipers, em Mirror of our Sleeping, faixa que encerra o trabalho, temos uma forte presença e uma marca clara do trabalho do Grouper. Tanto os teclados quanto os vocais minimalistas remetem diretamente ao que fora testado dentro do disco A I A : Alien Observer, lançado no ano passado, com Harris transformando o disco em um tratado próprio.

Os pequenos momentos de expansão individual, entretanto, não trazem quaisquer prejuízos à obra, que mantém um caráter de concisão instrumental e precisão entre as formas sonoras da primeira até a última faixa. Por mais específico de um determinado público que seja o álbum – não pense que você irá encontrar qualquer mínima fração comercial dentro dele -, Foreign Body consegue aos poucos fisgar mesmo os mais despreparados ouvintes, como se tanto Liz Harris como Jesy Fortino se especializassem na construção de um som hipnótico, percepção que se abre logo na delicadeza da faixa título e se expande magistralmente durante o executar de toda a obra. Se Mirroring é apenas um projeto colaborativo passageiro, resta apenas torcer para que o encontro continue a se repitir futuramente, afinal, difícil não embarcar e se perder nas doces emanações construídas pela dupla.

Foreign Body (2012, Kranky)

Nota: 8.0
Para quem gosta de: Julianna Barwick, Grouper e Tiny Vipers
Ouça: Cliffs e Mine

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.