Disco: “Garnizé”, Dibigode

/ Por: Cleber Facchi 29/05/2015

Dibigode
Nacional/Indie/Instrumental
http://dibigode.com/

Não é difícil perceber os diferentes agrupamentos de artistas ou mesmo temáticas específicas dentro da música instrumental que é produzida no Brasil. Enquanto alguns investem no experimento (Hurtmold, ruído/mm), outros apostam no peso das guitarras (Huey, Macaco Bong), deixando o espaço aberto para aqueles que se concentram na projeção de um som onírico (Mahmed) ou mesmo outros que prezam por uma composição dançante e tropical (Bixiga 70). Mas e o trabalho assinado pela mineira Dibigode, em que grupo se encaixa?

Como uma fuga do ambiente de referências controladas do primeiro álbum do grupo – Naturais e Idênticos ao Natural de Pimentas da Jamaica e Preta (2011) -, em Garinzé (2015, Natura), segundo registro de inéditas, o quinteto de Belo Horizonte não apenas expande os próprios conceitos e possibilidades rítmicas, como ainda flerta com diferentes gêneros, colaboradores e bases sem perder o controle. Um passeio atento pelos mais variados campos da música instrumental, como se o grupo brincasse com a interpretação do ouvinte.

Entregue ao público como uma releitura da obra de Ataulfo Alves (1909 – 1969) – sambista mineiro e um dos grandes nomes da música popular brasileira -, Garnizé está longe de ser encarado como uma simples “homenagem” da banda. Trata-se de um disco de criação, marca detalhada em cada instante (ou acorde) da obra. Basta a releitura “country” de Ai Que Saudades da Amélia ou mesmo a roupagem moderna de Você Passa eu Acho Graça para perceber a constante interferência do grupo, sempre curioso, capaz de estimular o ouvinte até o jogo de metais que finaliza o disco.

Em uma lenta desconstrução do registro anterior, o quinteto – Gabriel Perpétuo (guitarra), Vicente França (guitarra), Guilherme Peluci (saxofone), Antônio Vinícius (baixo) e Tiago Eiras (bateria) – parece investir em um som cada vez mais descomplicado. Difícil não dançar ao som de faixas como Atire a Primeira Pedra – fino retrato da essência de Ataulfo Alves. E o que dizer de Cadência do Samba, música que garante novo fôlego ao disco, efeito da interferência (e voz limpa) da convidada Dona Jandira, uma das participações especiais do trabalho junto do clarinetista americano Pat O’Keefe.

Tamanho despojo em nenhum momento interfere na construção de faixas mais complexas. Seguindo a trilha da conterrânea Constantina, em Tempos de Criança, terceira música do disco, arranjos cíclicos de guitarras esbarram em bases eletrônicas, aproximando o ouvinte do mesmo ambiente sóbrio reforçado na estreia da Dibigodi. Mulata Assanhada é outra representante do lado mais “sério” do disco, mergulhando o ouvinte em um oceano de referências típicas do Pós-Rock.

Curiosamente, mesmo marcadas pelo preciosismo dos arranjos, são essas mesmas faixas – pequenos desvios rítmicos – que quebram a fluidez da obra. É necessário fôlego para seguir com o disco entre as transições de Mulata Assanhada e Ai Que Saudades da Amélia ou Lá Na quebrada do Monte e Tempos de Criança, como se duas obras distintas fossem encaixadas em um mesmo universo temático. Um “tropeço” leve, em poucos instantes contornado pela capacidade da banda em arrastar o espectador para o ambiente dançante que sustenta a obra.

Garinzé (2015, Natura)

Nota: 7.0
Para quem gosta de: Constantina, Iconilli e Bixiga 70
Ouça: Atire a Primeira Pedra, Cadência do Samba e Você Passa eu Acho Graça

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.