Disco: “Hummingbird”, Local Natives

/ Por: Cleber Facchi 24/01/2013

Local Natives
Indie/Alternative/Indie Pop
http://www.thelocalnatives.com/

Por: Cleber Facchi

A leveza instrumental e o sofrimento traduzido em versos são as únicas constantes dentro da obra do Local Natives. De formatação primorosa e delineamentos que brincam com a excelência das formas instrumentais, a banda de Los Angeles, Califórnia utiliza dos elementos regulares como um mecanismo de expansão para os próprios limites. Ainda que a natureza delicada que circunda a sonoridade da banda se resolva dentro de uma atmosfera bem delineada e de constante proximidade (lírica e musical), cada composição assinada pelo grupo ultrapassa os limites prévios que regem a proposta do coletivo, resultado que em 2009 transformou as sutilezas até então convencionais de Gorilla Manor em uma obra de rumos infinitos. A banda, entretanto, soube como brincar com o público, apresentando uma fina e quase inexpressiva mostra do que estava por vir.

Talvez pelo lançamento irregular – o disco foi lançado em novembro de 2009 no Reino Unido e no restante do mundo somente no início de 2010 -, a estreia do grupo californiano acabou de forma inevitável passando despercebida por boa parte do público. O que até pouco tempo soava como uma estratégia incoerente por parte do grupo e seus produtores, hoje se revela como uma atuação necessária, afinal, com base nas melodias épicas que recheiam o recente Hummingbird (2013, Frenchkiss), segundo e mais novo disco da banda, tudo o que foi apresentado há três anos se concretiza como uma espécie de aperitivo. E se as melodias cuidadosas de Airplanes, Who Knows Who Cares e Sun Hands não passavam de uma “simples” entrada, ao visitar o novo registro temos de fato o prato principal.

De texturas monumentais e arranjos que parecem aproximar Robin Pecknold (Fleet Foxes) e Win Butler (Arcade Fire) em um mesmo ambiente, o registro ultrapassa os prováveis limites de outrora para resultar em um tratado que costura cada uma das faixas dentro de uma íntima e sempre bem elaborada proposta musical. Das melodias conceituais que vez ou outra raspavam em passagens étnicas pouco sobreviveu. Dessa forma, a relação com a discografia recente do Vampire Weekend ou mesmo com a obra do Talking Heads (banda que teve a faixa Warning Sign reformulada nas mãos dos californianos) deu lugar a um novo encaminhamento musical, resultado marcado nas sinfonias volumosas que tendem ao erudito sem se desligar da aproximação natural com o radiofônico.

 

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Diferente do registro anterior, cada faixa formalizada no decorrer da obra se orienta de maneira a impulsionar a canção seguinte. O que em instantes é diminuto e comportado, logo explode em exageros controlados que se relacionam diretamente com as duas diretrizes do grupo: as melodias suaves e a dor. Dessa forma, enquanto Heavy Feet cresce de maneira a soterrar o ouvinte com emanações suntuosas e encaixes musicais sublimes, logo em sequência Ceilings puxa o álbum para junto de uma formatação melancólica e amena. Existem ainda composições que lidam com a mesma proposta duplicada do registro, caso de Breakers, faixa que arrasta o ouvinte em uma avalanche de altos e baixos instrumentais que atacam diretamente os sentimentos de quem passa pela obra.

E por falar em sentimentos, são eles quem abastecem cada mínima fração instrumental e poética no decorrer da obra. Das confissões que lavam a faixa de abertura, You & I, ao fecho honesto de Bowery, qualquer particularidade do registro lida com aspectos dolorosos da vida a dois. A medida aproxima o grupo dos mesmos lamentos adultos que abastecem a obra do The National, não apenas por conta da presença de Aaron Dessner na produção do disco, mas pela forma obscura como a banda realça marcas bem delineadas já existentes no primeiro disco. De fato, muito do que orienta a construção de Hummingbird se apega ao mesmo Chamber Rock que a banda de Cincinnati promove desde o álbum Boxer (2007), substituindo a atmosfera soturna por melodias de alcance épico, quase uma ponte com Funeral (2004) do Arcade Fire.

Por mais que as transformações incentivem o grupo a promover um novo resultado instrumental, Hummingbird é antes de qualquer proposta sonora uma morada para a voz. Cada faixa que alimenta o disco é orientada pela imersão completa de Taylor Rice, Kelcey Ayer e Ryan Hahn, artistas que se revezam na sobreposição de cantos (monumentais ou simplistas) e que de maneira orquestral direcionam os rumos marcados dos instrumentos. Seja na grandiosidade macambúzia de Three Months (faixa que posiciona a música em segundo plano para que os vocais brilhem individualmente) ou nas passagem pelo pop em Black Balloons (composição que mais se relaciona com o primeiro disco), os vocais, diferente do que fora abordado em Gorilla Manor, servem como estímulo para o começo, o meio e o fim das canções. Não apenas um “instrumento extra”, mas a linha guia que amarra o álbum do princípio ao fim.

Embora venha de um universo saturado pela similaridade musical – vide a fortíssima relação com Shields do Grizzly Bear e até com a obra de estreia dos brasileiros do Cambriana -, Hummingbird consegue se posicionar em um panorama de inventos e atributos particulares. Trazendo na constante proximidade entre as vozes e as melodias instrumentais que tendem a emocionar, o disco suspende as pequenas estranhezas de outrora para alimentar um registro que involuntariamente chama a atenção pela beleza, antes até de ser apreciado com cuidado e real atenção. Entretanto, uma vez dentro do material límpido que a banda constrói, cada instante se traduz em descoberta, convertendo o que inicialmente se concretiza de maneira hipnótica em um cenário de revelações confessionais constantes e uma obra de detalhes ainda maiores.

 

Hummingbird (2013, Frenchkiss)

Nota: 8.5
Para quem gosta de: Grizzly Bear, Fleet Foxes e Arcade Fire
Ouça: Breakers, Three Months e You & I

 

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.