Disco: “IAN”, Ian Ramil

/ Por: Cleber Facchi 16/04/2014

Ian Ramil
Indie/Alternative/Experimental
www.ianramil.com

Por: Cleber Facchi

Ian Ramil

Imagine um cabo de aço esticado de um canto a outro de um cômodo. De um lado dessa linha reta, no chão, está tudo o que há de mais excêntrico e desafiador em relação aos padrões “comerciais” da música popular. Ruídos, incertezas e experimentos a serem aproveitados. No outro lado, o oposto: versos fáceis, melodias pegajosas e uma vastidão (quase) infinita de possibilidades que há décadas sustentam as faces da música pop. Sob o olhar atento do público e no meio dessa divisória está IAN (2014, Escápula), registro de estreia de Ian Ramil e uma obra que usa dos pés firmes para manter o equilíbrio ou perdê-lo de vez.

Filho do cantor/escritor Vitor Ramil, sobrinho da dupla Kleiton e Kledir e parceiro de longa data dos “garotos” da Apanhador Só, o jovem Ian está longe de desfilar pelo disco como um completo desconhecido. Mais do que um cartão de visitas – como o resgate das já conhecidas Rota e Nescafé parece anunciar -, IAN é uma obra de fechamento. Trata-se de um conjunto amarrado de todas as ideias, versos, sons e experiências conquistadas ao longo dos anos pelo artista. Um exercício que flui com jovialidade por conta do fluxo dinâmico das músicas, mas fixa maturidade em cada azulejo sombrio do álbum.

Ao mesmo tempo em que brinca com a própria herança – dos pais, tios ou amigos -, Ramil soluciona identidade ao justamente fragmentar a própria estética em diferentes rumos. Marcado do princípio ao fim pela divisão das experiências – o pop e o experimental, o acessível e o hermético -, IAN é um trabalho que usa dos pequenos contrastes com acerto e parcimônia. Ainda que o equilíbrio seja a chave para entender a funcionalidade do álbum, é ao descer (ou cair) da suposta linha divisória e escolher uma direção específica que o músico encontra movimento aos elementos que completam o trabalho.

Em se tratando do lado mais complexo da obra, Ramil segue a linha anunciada em Zero e um, faixa apresentada pelo cantor ainda em 2013. São acordes inexatos, vocais (cantados e versados) que mudam de direção sem ordem aparente, além de versos que brincam com a figura do próprio cantor/personagem. Uma mudança brusca em relação ao que o “rock americano” de Hamburger, o lado romântico de Suvenir ou a confortável (e ainda quente) Rota materializam em um exercício de puro comodismo. Passos entre o pop tradicional e algumas experiências esquecidas do rock nacional no começo da década passada.

Curioso perceber que ao subir na “corda bamba” e, mais uma vez, estabelecer “equilíbrio” ao disco, Ian brinca de forma ilimitada com as percepções do ouvinte. Basta um rápido passeio elo pop excêntrico de Seis patinhos para perceber a versatilidade do cantor. Tão romântica, quanto desequilibrada, a música reforça a capacidade do músico em colar gêneros e referências sem esbarrar em um som copioso – tratamento que converte a faixa em um bloco de experiências pueris, ao mesmo tempo em que finaliza como um exemplar de pura maturidade. O mesmo fluxo se repete ainda em canções como Transe e Pelicano, músicas que só parecem funcionar dentro do universo fragmentado do álbum – bem representado na ilustração da capa, assinada por Virgílio Neto.

Produzido por Matías Cella (Jorge Drexler, Lenine) e gravado em Buenos Aires, IAN ecoa em alguns aspectos como uma obra de exílio. A julgar pela melancolia fina das canções e o completo afastamento dos clichês que definem o famigerado “Rock Gaúcho”, talvez esta seja a real imposição do trabalho. Como a capa revela, a estreia de Ramil flui a partir de um conjunto desordenado de ideias. Fragmentos que o músico equilibra entre o “excêntrico” e o “convencional”, mas que usam desse indicativo torto como a abertura para uma obra esquiva de qualquer similaridade.

 

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IAN (2014, Escápula)

Nota: 8.3
Para quem gosta de: Apanhador Só, Vitor Ramil e Cícero
Ouça: Zero e Um, Seis Patinhos e Transe

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.