Disco: “Lembra?”, Rafael Castro

/ Por: Cleber Facchi 16/10/2012

Rafael Castro
Brazilian/Indie/Singer-Songwriter
http://rafaelcastro.com.br/

Por: Cleber Facchi

Talvez seja pelo excesso de trabalhos ou a vasta gama de percursos instrumentais e poéticos, Rafael Castro sempre me assustou. Ainda hoje me pergunto “por onde começar?” em uma discografia que beira uma dezena de lançamentos – todos registros independentes, mezzo caseiros, mezzo profissionais. A resposta mais indicada para essa pergunta talvez esteja no interior do oitavo e mais recente lançamento do músico paulistano, Lembra? (2012, Inependente). Menos irregular e bem estruturado registro de toda a carreira do artista, o novo disco expande os horizontes do compositor, que se distancia de forma assertiva do rock hippie de outrora e aparece apostando em uma sonoridade urbana, por vezes comercial, e naturalmente muito mais atrativa.

Como se partilhassem de um mesmo propósito, cada uma das 14 faixas encontradas no decorrer do presente disco puxam Castro (e o ouvinte) para uma solução de versos cotidianos, como se o disco todo se desenvolvesse ao longo de um só dia. Dentro dessa funcionalidade e concisão constante o músico se esforça para a produção de um registro que desce fácil pelos ouvidos, partilhando em diversos momentos a mesma singeleza confessional que decide os rumos dos iniciais discos de Arnaldo Baptista (Mutantes) em carreira solo. É possível até observar o álbum como uma manifestação mais simples do que flutua nos versos menos experimentais de Fernando Catatau – imagine uma versão mais “pop” de Uhuuu! (2009).

Brincando com as metáforas e ironias nos versos de cada faixa, flertando abertamente com o amor (e a falta dele), além de se desvencilhar a todo o instante do bom humor tradicional que guiava grande parte das composições anteriores, o músico finaliza aquele que parece ser o mais coerente a atrativo trabalho desde que iniciou suas gravações em meados da década passada. Não importa a direção, por todos os cantos do disco ecoam criações capazes de percorrer a psicodelia de maneira experimental (Os Meus Doces São Meus Doces) e o romantismo brega de forma renovada (Lembra?), com o músico estabelecendo uma visão particular do que há trinta anos ocupava a produção musical brasileira.

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Mais surpreendente do que notar a capacidade de Castro em nos manter atentos e confortavelmente instalados durante toda a extensão do álbum é descobrir que cada pequena porção instrumental do disco é fruto único do multi-instrumentista. Oposto do que fora proposto nos registros passados, da primeira à última faixa o trabalho se mantém atrativo de maneira hipnótica, com o músico posicionando sem medo o uso de teclados nostálgicos (Você Sabe Como É) e guitarras bem delineadas (Surdo-Mudo) capazes de se entregar ao que há de mais marcante no rock nacional da década de 1970. A medida afasta o músico do desempenho Lo-Fi, tornando curioso perceber a limpidez das formas sonoras de um trabalho gravado no estúdio que o músico mantém na casa dos pais.

Quando voltamos os olhos para os projetos anteriores do cantor é visível como pouco parece ter sobrevivido. Musicalmente Informação e a formatação bucólica que a acompanha – além da letra capaz de brincar de forma humorada com detalhes cotidianos do jornalismo – talvez seja o que há de mais próximo dos trabalhos que precedem o atual registro. Principalmente pela suavidade – que muito lembra a psicodelia folk e acolhedora do último disco de Bonifrate, Um Futuro Inteiro -, a canção posicionada no fecho do disco surge como uma suave recordação do que Castro parecia inclinado a produzir até o último ano, não atrapalhando o desempenho mais enérgico e radiante do restante do trabalho.

Contando com a presença de nomes como Tulipa Ruiz, Leo Cavalcanti e Pélico (todos velhos parceiros do paulistano), Lembra? passa longe de se manifestar como uma sequência aprimorada dos antigos trabalhos de Rafael Castro, afinal, quanto mais tempo passamos dentro da obra de contornos bem estabelecidos e atrativos, mais ela se manifesta como um claro recomeço para o cantor. Sem o esforço de produzir um disco grandioso ou que rompa com possíveis limites da cena independente, Castro apresenta o trabalho que mesmo simples pela forma como se desenvolve, parece ser tão atrativo (ou talvez até mais) do que muitos registros bem conceituados que circulam por aí.

Lembra? (2012, Independente)

Nota: 7.7
Para quem gosta de: Lulina, Bonifrate e O Terno
Ouça: Você Sabe Como É, Talvez e Lembra?

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.