Disco: “Lese Majesty”, Shabazz Palaces

/ Por: Cleber Facchi 31/07/2014

Shabazz Palaces
Experimental/Hip-Hop/Psychedelic
http://www.shabazzpalaces.com/

Por: Cleber Facchi

A grande beleza de Black Up (2011), registro de estreia do Shabazz Palaces, sempre esteve na ausência de linearidade da obra. Da abertura, em Free Press And Curl, até alcançar a derradeira Swerve…, a corrupção de ideias lançadas por Ishmael Butler e Tendai Maraire forçaram o ouvinte a atravessar diferentes esferas musicais, sem que isso resultasse em uma experiência confusa. Ainda que o Hip-Hop seja a base do trabalho sustentado pela dupla, cada segundo dentro da obra revela mutação, proposta mantida em Lese Majesty (2014, Sub Pop), porém, parcialmente adaptada dentro de uma nova estrutura.

Desenvolvido em cima de 18 composições inéditas, o novo álbum reforça organização, rompendo com o caráter abstrato do trabalho anterior de forma a solucionar uma obra dividida em sete “suites” (ou blocos) diferentes. Entretanto, a principal mudança dentro do presente disco não está no efeito “ordenado” das canções, mas na temática que parece dissolvida de forma precisa ao longo de toda a obra.

Assim como em Black Up ou mesmo nos dois primeiros EPs da dupla – Shabazz Palaces e Of Light, ambos de 2009 -, as viagens pelo espaço e outros elementos típicos dos livros / filmes de Ficção Científica recheiam com liberdade o conteúdo da obra. São músicas como Solemn Swears e Harem Aria em que a rima soterrada de Butler atenta de forma decidida para a psicodelia. Um reforço para o caráter essencialmente etéreo que habita em grande parte das composições da dupla.

Como um passeio pelo cosmos, Lese Majesty, mais do que Black Up, é uma obra conduzida pela sutileza musical de Maraire. Tendo no “espaço” o ponto central do disco, o produtor resgata desde ruídos expostos em clássicos Sci-Fi na década de 1970, até homenagens ao trabalho de veteranos do Krautrock / Ambient Music, também lançados no mesmo período. Por todos os cantos da obra borbulham referências à obra de Brian Eno, Tangerine Dream e até figuras esquecidas da New Age. Logo, a julgar pelos sete “capítulos” do álbum, não seria errado afirmar que o Shabazz Palaces transformou o trabalho em uma lisérgica novela musicada, ou mesmo em um filme psicodélico de ficção científica, deixando que as imagens sejam projetadas na cabeça do espectador.

Ao mesmo tempo em que sobrevive do próprio universo conceitual, com suas bases e arranjos atmosféricos, Lese Majesty é uma obra marcada pela adaptações de brechas para o ouvinte iniciante. Flertando com o pop, Maraire soluciona desde faixas tomadas por doces melodias – caso da onírica Ishmael e Motion Sickness -, até músicas de formatação intensa, quase dançantes. Dentro desse segundo grupo é possível isolar They Come In Gold, destinada aos apreciadores do novo rap norte-americano, ou mesmo #CAKE, faixa que brinca com as bases sujas de Azealia Banks e até esbarra na sonoridade de M.I.A. em Matangi (2013).

Mesmo “linear” em relação ao antecessor, Lese Majesty está longe de ser encarado como uma obra previsível. Pelo contrário, durante todo o percurso o ouvinte é instigado de forma a regressar ao interior mutável da obra, seduzido pela “trama” sombria (e quase mística) lançada pela dupla. Mais uma vez acompanhados pelas parceiras do THEESatisfaction – responsáveis pelas vozes femininas e parte dos arranjos do disco -, Butler e Maraire reforçam a originalidade vasta que caracteriza o Shabazz Palaces, um projeto que há muito ultrapassou os limites do Hip-Hop e agora parte em direção à fronteira final.

Lese Majesty (2014, Sub Pop)

Nota: 8.3
Para quem gosta de: THEESatisfaction, Flying Lotus e Boards Of Canada
Ouça: They Come in Gold, Ishmael e Solemn Swears

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.