Disco: “Lesser Evil”, Doldrums

/ Por: Cleber Facchi 04/02/2013

Doldrums
Experimental/Electronic/Indie
https://www.facebook.com/pages/Doldrums/

Por: Cleber Facchi

Doldrums

Lesser Evil é de maneira bastante clara um passeio por diversos estágios e épocas distintas da música experimental. Enquanto a aproximação com os sons recentes tingem de forma estranha o brilho pop da produção musical canadense, os encaixes sintéticos e a busca pelo etéreo arremessam o ouvinte para uma variedade de outros mundos – muitos deles ainda não descobertos. Da herança quase assumida de Björk às aproximações com o trabalho da conterrânea Grimes, Airick Woodhead, responsável pelo Doldrums, afunda em um cenário que se parte em rumos inexatos, projeções sintetizadas e vozes que praticamente se liquefazem nos ouvidos do espectador. Um plano excêntrico em que o comum, o óbvio ou o tradicional, são obrigatoriamente deixados de lado.

Depois de uma sequência de composições banhadas pelos mais distintos aspectos da experimentação eletrônica, a exemplo de Egypt e She Is The Wave, ao alcançar o primeiro registro oficial, Woodhead mantém de forma constante a busca pela versatilidade musical. Cada faixa se transforma em um registro particular, quase um trabalho isolado dentro da grandiosidade da obra, absorvendo uma temática sonora que parece interessada em brincar com as mais variadas percepções do público. Tudo é estranho, sombrio e ainda assim atrativo ao ouvinte, tamanha a capacidade do produtor em lidar com a suavidade e a constante acessibilidade das melodias.

Por se tratar de um álbum voltado ao experimento, Lesser Evil usa de cada instante como um mecanismo de transformação com foco na capacidade de instigar. Nada é pensado de maneira convencional, reflexo que imediatamente brinca com a androginia dos vocais Woodhead. A curiosa referência é tratada de forma a decidir muito do que orienta as canções pelo álbum, aproximando o produtor do mesmo cenário eletrônico que se estabelece de maneira dançante e por vezes climática no conteúdo musical da obra. Dessa forma,  o canadense se materializa em uma espécie de instrumento complementar, um organismo que se dissolve na sobreposição instrumental que mantém firme a relação com a música pop da década de 1980 ou os inventos eletrônicos dos anos 1990.


[youtube:http://www.youtube.com/watch?v=8vIP2ZEnxnc?rol=0]

[youtube:http://www.youtube.com/watch?v=x7DGp1-AyI4?rol=0]

Ainda que o álbum seja construído dentro de um acabamento voltado ao reflexo particular de cada faixa, não há como questionar a capacidade do músico em separar o disco em dois grupos bem delineados de canções. Woodhead, entretanto, mantém firme a proposta de desenvolver o álbum sem uma divisão exata, fazendo com que o disco flutue do princípio ao fim em blocos de canções ora atmosféricas, ora explosivas. O primeiro grupo parece bem representado pela ambientação de Singularity Acid Face e Lost In Everyone, composições que passeiam de forma regular pela climatização densa do Drone, investindo fortemente no uso dos sintetizadores e, principalmente, incorporando um direcionamento instrumental que se desprende ainda mais do uso da voz.

Quebrando de maneira autêntica o bloco climático do disco, faixas como Anomaly, She Is The Wave e Sunrise tratam de aproximar o trabalho de Doldrums das mesmas experiências dançantes que atualmente circulam pela música canadense. Sempre dividido entre o pop dançante e a eletrônica excêntrica, é preciso notar que mesmo próximo do que propõe Grimes em Visions ou da dupla Purity Ring em Shrines, Woodhead mantém até a execução da última música um aspecto musical de natureza própria. Com base na sobreposição de sons (de maneira inicialmente confusa), o produtor esculpe um registro que desestabiliza e hipnotiza na mesma medida, transformando um passeio pelo registro em um exercício tortuoso, porém, sempre inventivo.

Não existem limites ao trabalho de estreia do Doldrums, e muito menos composições encaixadas apenas para fazer volume. Exemplo claro disso está no concentrado assertivo de faixas posicionadas na metade final da obra. Quem talvez pudesse esperar por canções movidas pelo descartável encontrará em Live Forever (um dos momentos mais Bjorkinianos do álbum) e Golden Calf (com ares de Crystal Castles) criações tão (ou até mais) instigantes quanto as que inauguram a obra. Com um acabamento que surpreende até os últimos minutos, Lesser Evil chega para somar com a multiplicidade de registros e novos lançamentos que tiveram início no último ano, tratando da experimentação de forma naturalmente renovada, sem se desligar de uma atenta relação com a dança.

 

Lesser Evil

Lesser Evil (2013, )


Nota: 8.1
Para quem gosta de: Grimes, Purity Ring e Crystal Castles
Ouça: Anomaly e She’s The Wave

[soundcloud url=”http://api.soundcloud.com/tracks/74272838″ params=”” width=” 100%” height=”166″ iframe=”true” /]

[soundcloud url=”http://api.soundcloud.com/tracks/43659686″ params=”” width=” 100%” height=”166″ iframe=”true” /]

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.