Disco: “Lost Themes”, John Carpenter

/ Por: Cleber Facchi 06/02/2015

John Carpenter
Ambient/Synthpop/Instrumental
http://www.theofficialjohncarpenter.com/

John Carpenter não poderia ter escolhido uma composição mais assertiva para inaugurar Lost Themes (2015, Sacred Bones) do que a climática Vortex. Em uma espiral de sintetizadores obscuros – fazendo valer o título da própria criação, “vórtice” – o artista norte-americano soluciona não apenas a estrutura temática para o restante da obra – um compilado de peças avulsas, instrumentais e sempre atmosféricos -, como ainda estabelece uma espécie de ponte (sonora) para a extensa filmografia de terror/suspense assinada desde o início da década de 1970.

Diretor responsável por filmes como The Thing (1982), Christine (1983), além da franquia Halloween, Carpenter encontra no primeiro trabalho em carreira solo um diálogo transformador com o próprio acervo cinematográfico. Partindo da estilização soturna da faixa de abertura – um possível introdução para qualquer película apresentada pelo artista nas últimas quatro décadas -, o ouvinte é convidado a explorar faixas fragmentadas em pequenos atos (Obsidian), instantes de ascensão (Mystery) ou mesmo suspiros instrumentais orquestrados por bases climáticas (Wraith).

Embora já tenha assinado a trilha sonora de diferentes filmes ao longo da carreira – caso de Assault on Precinct 13 (1976) e The Fog (1980) -, este é o primeiro trabalho de Carpenter pensado inteiramente no uso dos arranjos, esquivo da natural relação do artista com as imagens. Entretanto, difícil passear pela estrutura delicada de Fallen, Purgatory e qualquer outra canção “soturna” da obra sem visualizar as tradicionais cenas de suspense que marcaram a carreira do cineasta. Sem ordem específica, como fragmentos de um filme bruto, não editado, Carpenter detalha uma história de natureza perturbadora ao ouvinte.

Entalhado em um cercado musical específico, Lost Themes acomoda melodias e batidas eletrônicas de forma comportada, como uma película de roteiro lento, porém, envolvente. A julgar pela imposição dos sintetizadores – base de toda a obra -, referências ao trabalho de Kraftwerk e outros gigantes da década de 1970 – quando começou o trabalho como diretor – surgem por todo o álbum. Também é possível estreitar os laços com uma série de produtores recentes, principalmente Daniel Lopatin (Oneohtrix Point Never), além dos ex-parceiros no Emeralds Steve Hauschildt e Mark McGuire.

Como um mecanismo de estímulo natural para a obra, durante todo o registro Carpenter parece encaixar fragmentos de maior aceleração e ritmo forte para o disco. Ainda que a extensa Obsidian sobreviva de explosões rítmicas aleatórios, é na coleção de sintetizadores (dançantes) de Domain que o trabalho encontra um maior estágio de euforia. Inicialmente acomodada no mesmo ambiente soturno das canções, a faixa de quase sete minutos logo esbarra no mesmo universo de Giorgio Moroder, escapando por pouco dos exageros típicos da Disco Music.

Em uma arquitetura de essência flexível, grande parte das músicas em  Lost Themes começa e termina de forma independente, reforçando com naturalidade o título da obra, ao mesmo tempo em que Carpener parece interessado em perturbar a atenção do ouvinte. Entretanto, o constante estado ruptura em nada prejudica o equilíbrio da obra, sempre tensa, acolhedora e marcada pelo uso de reviravoltas – como toda grande obra cinematográfica do diretor.

 

Lost Themes (2015, Sacred Bones)

Nota: 8.0
Para quem gosta de: Oneohtrix Point Never, David Lynch e Kraftwerk
Ouça: Vortex, Obsidian e Abyss

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.