Disco: “Miley Cyrus & Her Dead Petz”, Miley Cyrus

/ Por: Cleber Facchi 03/09/2015

Miley Cyrus
Pop/Psychedelic/Experimental
http://www.mileycyrus.com/

Em janeiro deste ano, quando Rihanna apresentou ao público o single FourFiveSeconds, muita gente perguntou com desdém no Twitter: “Quem é Paul McCartney?”. Por mais absurda que possa parecer, essa foi a honesta reação de centenas de jovens que nunca tiveram acesso ou pouco se importaram com a obra do ex-integrante dos Beatles – junto de Kanye West, um dos artistas convidados para a canção. Espantoso, o questionamento reflete com naturalidade a velha divisão – e boa dose de preconceito – que há décadas separa o público do “rock” e os ouvintes da “música pop”.

Miley Cyrus com certeza sabe quem é Paul McCartney. A cantora não apenas conhece o trabalho do músico britânico, como em 2014 foi convidada a participar do álbum With a Little Help from My Fwends, registro comandado pela banda norte-americana The Flaming Lips e uma espécie de “adaptação” do clássico de 1967 Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band. Ainda que o resultado da obra seja catastrófico – Cyrus cantou em Lucy in the Sky with Diamonds e A Day In Life -, a rápida passagem da cantora pelo disco, além, claro, da estreita relação Wayne Coyne, vocalista dos lábios flamejantes, parece servir de base para o quinto álbum de estúdio da ex-Hannah Montana: Miley Cyrus & Her Dead Petz (2015).

Encaixado de forma precisa nesse cenário conflituoso que divide o mesmo “pop” de Rihanna e o “rock” de Paul McCartney, o álbum lançado durante o último VMA, evento apresentado pela própria Cyrus, é uma obra que conecta – de forma esquizofrênica – esses dois universos. De um lado, a plasticidade e alto teor comercial das canções de Miley. No outro, arranjos experimentais, sons abstratos e colagens tão íntimas de veteranos como Pink Floyd e The Beatles, como do som criado pelo The Flaming Lips em obras ainda recentes, caso de  Embryonic (2009) e The Terror (2013).

Produzido pela própria cantora em parceria com a banda de Wayne Coyne, o sucessor de Bangerz, bem-sucedido álbum de 2013 e casa de músicas como Wrecking Ball e Adore You, é uma obra marcada pelo delírio. São mais de 90 minutos dissolvidos em 23 faixas que arrastam o ouvinte para dentro do mesmo universo explorado no vídeo de Lucy in the Sky with Diamonds. Uma coleção de ruídos, batidas eletrônicas e temas que atraem a atenção do ouvinte pelo aspecto inusitado, mas tropeça nos exageros e nítido descontrole de seus criadores.

Como escapar de ótimas composições como Dooo it!, BB Talk, Slab The Butter, Karen Don’t Be Sad, I Forgive Yiew e Twinkle Song? Impossível. Poucas vezes antes uma artista de peso da música pop pareceu tão íntima do próprio público quanto desafiadora. Pena que Miley Cyrus & Her Dead Petz  não se resume a esse grupo específico de faixas. Ao mesmo tempo em que Cyrus e os convidados articulam uma obra inventiva, difícil ignorar o sofrível catálogo de músicas preguiçosas que preenchem o restante do álbum. Qualquer canção lançada por Ariel Pink nos últimos 10 anos parece melhor do que a monótona Tiger Dreams. Sobram ainda faixas penosas (e desnecessárias) como 1 Sun, Evil is but a Shadow e Lighter, canções em que Cyrus parece andar em círculos, completamente desnorteada.

Assim como na estranha interpretação de Sgt. Pepper’s, de 2014, o erro do disco está na ausência de um bom produtor. Alguém capaz de cortar os excessos do trabalho ou assumir o controle no repasse de drogas e outras substâncias (ilícitas) consumidas durante a gravação do disco. Caretice? Talvez, mas o que tinha tudo para se transformar em uma bem-sucedida experiência lisérgica/musical acabou se revelando uma verdadeira bad trip. Na dúvida, mantenha a sobriedade, pule o que há de mais arrastado pelo disco e aproveite os instantes em que o pop (psicodélico) de Miley Cyrus brilha com maior intensidade.

Miley Cyrus & Her Dead Petz (2015, Smiley Miley Inc.)

Nota: 6.5
Para quem gosta de: The Flaming Lips, Ariel Pink e MGMT 
Ouça: Dooo It!, BB Talk e Slab of Butter (Scorpion)

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.