Disco: “Monomania”, Clarice Falcão

/ Por: Cleber Facchi 02/05/2013

Clarice Falcão
Indie/Folk/Indie Pop
https://www.facebook.com/daclarice

 

Por: Cleber Facchi

Clarice Falcão

Existe graça no sofrimento de Clarice Falcão. Contrariando a lógica de que um típico disco de amor (ou que se ausenta dele) deve vir acompanhado pelo drama confesso e o mais profundo sofrimento, a cantora e compositora pernambucana faz do primeiro registro em estúdio um jogo adorável de antíteses e contradições amorosas. Versos que derramam textos mórbidos sobre suicídio, desespero e morte, mas que se acomodam de forma descompromissada nos vocais agridoces da cantora. Fazendo jus ao título da obra, Monomania (2013, Independente), a cantora discute da primeira até a última faixa a estranha liberdade de quem conseguiu se ver livre de um ex-amor ao mesmo tempo em que regressa instantaneamente a ele. Paranoias modernas com um toque leve de bom humor.

Caminhando por um território que talvez esbarre em nomes de peso da nova música brasileira, Falcão encontra meio que sem querer um espaço próprio na cena vigente – dançando pelo Mainstream, ao mesmo tempo em que se converte na nova queridinha do público alternativo. Mais conhecida por sua atuação nas esquetes do Porta dos Fundos, a cantora e compositora usa da mesma interpretação nas telas para brincar com as palavras que despeja pela obra. Uma atuação, que contrária a outros registros do gênero, completa com perfeição a estrutura tragicômica que vai da faixa de abertura até os instantes mais sombrios escondidos pelo disco.

Ainda que interprete a si própria, a emoção passada pela recifense ao longo do disco é genuína. Lidando com a mesma sutileza dos sons que acompanham Mallu Magalhães ou a norte-americana Fiest, Clarice traz nas melodias comportadas memórias de um passado recente. Faixas portadoras de um brilho tolo e naturalmente cômico, porém encantador. Da amargura sombria de 8º Andar (“Quando eu te vi fechar a porta eu pensei em me atirar pela janela do 8º andar”) ao ponto de superação que inaugura o disco com Eu Esqueci Você (E agora quando eu lembro que você existe/ Eu já não sinto mais nada), cada instante do registro é encarado com simplicidade, exercício que esbarra no cotidiano de quem já se viu aos prantos por um grande amor, e hoje apenas ri.


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É preciso levar em conta que nem só de sofrimento e pequenos dramas vive Clarice Falcão. Parte fundamental do que concede beleza ao disco está na presença de adoráveis declarações de amor que se esparramam por toda a obra. “De todos os loucos do mundo eu quis você/ Porque eu tava cansada de ser louca assim sozinha” confessa em De todos os loucos do mundo, um dos exemplares mais encantadores da obra e ponto de representação do lado menos soturno do trabalho. Entretanto, mesmo no rico catálogo de confissões amorosas que recheiam o disco, é na parceria com o capixaba Silva que a cantora deixa crescer um dos instantes mais graciosos do registro: Eu Me Lembro. Brincando com o ponto de vista de um casal durante o primeiro encontro, a canção passeia pelas oposições como um pequeno número musical, florescendo no dueto um dos momentos mais significativos da obra.

Por falar em Eu Me Lembro, é justamente na colorida faixa que se ergue o instante de maior transformação no instrumental do disco. Ainda que conduzida por uma base acústica simples, a canção abre espaço para o uso de metais, elemento que se estende até execução de A Gente Voltou, rompendo com a aura Badroom Pop do restante da obra. Sobram ainda pequenos encaixes movidos por sintetizadores, guitarras controladas e temáticas instrumentais que se dividem entre os regionalismos de Beirut e o pop-folk que banha os trabalhos da dupla She & Him. Todavia, mesmo que haja cuidado por diversos instantes a música fica em segundo plano, quase como um simples trilha sonora, comprovando que em Monomania o importante mesmo são os versos.

Há quem possa defender que o sucesso de Clarice Falcão se relaciona diretamente com a presença ativa da artista nos vídeos do Porta dos Fundos, o que talvez até seja verdade. Entretanto, fechar os olhos para a beleza simples que preenche o registro de estreia da cantora é como tentar negar o óbvio. Ainda que assuma um caminho diferente em relação ao que marca Tulipa Ruiz, Céu e tantas outras vozes presentes da música brasileira, Falcão trata sobre os mesmos sentimentos, apenas livre de bloqueios ou barreiras que possam excluir o grande público.

Em meio ao drama desmedido e anseios de jovens adultos que ocupam boa parte da música nacional, Monomania é aquela comédia romântica de sábado à tarde que você provavelmente vai querer rever centenas de vezes.

 

Monomania

Monomania (2013, Independente)


Nota: 8.0
Pata quem gosta de: Mallu Magalhães, Silva e Tiê
Ouça: Eu Esqueci Você, Eu Me Lembro e Macaé
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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.