Disco: “Muchacho”, Phosphorescent

/ Por: Cleber Facchi 25/03/2013

Phosphorescent
Indie/Singer-Songwriter/Folk
http://phosphorescentmusic.com/

 

Por: Cleber Facchi

Phosphorescent

As transformações que acompanham Matthew Houck em mais de uma década de lançamentos constantes se relacionam com tudo o que passou pelo cancioneiro norte-americano nos primeiros anos do século XXI. Enquanto em começo de carreira o músico de Atlanta, Georgia parecia ser alimentado pela lisergia e a excentricidade do Freak Folk, marca que acompanhou suas composições até o lançamento de Pride (2007), a partir da segunda metade da década passada a perversão do Alt. Country parece se manifestar como a principal orientação do trabalho do músico. À frente do Phosphorescent, o norte-americano dá continuidade aos mesmos sons inaugurados com Here’s to Taking It Easy (2010), aproximando velhas e novas referências dentro de um cenário esculpido pela dor e pela saudade.

Espécie de sequência não intencional daquilo que Justin Vernon aprimorou com o lançamento do segundo álbum do Bon Iver (2011), ao mesmo tempo que estende diversas referências aos projetos recentes de Lambchop, Wilco e Jim James (My Morning Jacket), Muchacho (2013, Dead Oceans) é uma ode à saudade e também uma libertação. Ainda que a entrega de Song For Zula no final do último ano tenha servido para ilustrar parte do que se concretiza no novo disco, cada espaço do álbum se estende para além dos limites iniciais da composição, utilizando do tempero doloroso como um caminho seguro para que o cantor possa alcançar tanto composições grandiosas (The Quotidian Beasts), como faixas tomadas pela simplicidade dos sons e versos (Muchacho’s Tune).

Muchacho é um trabalho que cresce quanto mais nos habituamos a ele. Em uma primeira medida, o jogo contrastado entre sintetizadores e guitarras slide parecem servir como ordem para que os versos lacrimejantes do compositor sejam derramados pelo disco. Uma sucessão de canções mergulhadas no que parece ser um doloroso término de relacionamento, mas que na verdade escondem o real propósito do disco: a libertação. Como bem assume na faixa que dá título ao disco (“See I was slow to understand/ This river’s bigger than I am/ It’s running faster than I can, though lord I tried”) ou em Terror In The Canyons (“Now you’re telling me my heart’s safe/ And I’m telling you I know/ You’re telling me lean in and I’m telling you to go”), Houck parece lentamente despertar, deixando a dor (bem expressa nos discos passados) para trás, utilizando do presente álbum como um respiro.

 

[youtube:http://www.youtube.com/watch?v=S8m_Oek-Xec?rel=0]

[youtube:http://www.youtube.com/watch?v=anwDp_xDhn4?rel=0]

Nada econômico em relação aos lançamentos passados, com o novo álbum o músico deixa a instrumentação fluir ilimitada. Cuidadoso, Houck e o engenheiro de som John Agnello fazem de cada composição um mecanismo de fácil cruzamento com os vocais, resultado nítido na inaugural Sun, Arise! (An Invocation, An Introduction). Mais distinta composição do disco, Ride On, Right On rompe com o clima esvoaçante da obra para lidar com uma canção sólida, um rock acolchoado de leve pelo eletrônico. Até um mergulho no clima sombrio do The National pós-Boxer (2007) em Down To Go é percebido, afinal, o que é a canção se não uma faixa irmã de tudo o que Matt Berninger vem construindo desde a última década? Sobra ainda o clima semi-épico de The Quotidian Beasts e a herança “Vernonian” em Song For Zula, faixa que deve apresentar o registro e os próprios trabalhos de Houck. Um cardápio de sons sempre íntimos do Alt. Country e ao mesmo tempo distante.

Assim como Nick Drake dentro do clássico Pink Moon (1972) ou mesmo outros nomes de relevância do Folk da década de 1970, a transformação de Houck e o uso metafórico do compositor como um elemento da natureza parece ser constante na formatação do disco. Por todas as faixas elementos como a Lua, o Sol, animais e cenários campestres se apoderam da obra com extrema delicadeza – um efeito curioso, visto que há alguns anos o compositor deixou a região de origem para viver em Nova York. Exemplo bem sucedido de todas as referências bucólicas que alimentam o disco está em Terror In The Canyons (The Wounded Master), faixa que expressa o amor ou as possíveis exaltações melancólicas de Houck em diferentes seres, cenários e sensações

Acompanhado do engenheiro de som John Agnello (que ajudou Kurt Vile na construção do memorável Smoke Ring for My Halo), Matthew Houck faz do novo álbum do Phosphorescent sua maior obra. Pelo menos até agora. Sem o compromisso de soar grandioso e flutuando em uma medida de tempo marcada pela calmaria, o músico celebra a melancolia como quem sobreviveu à dor e hoje caminha de rosto erguido. Transitando de forma intencional entre o passado e o presente (tanto nos versos como na sonoridade que conduz a obra), Muchacho quebra os limites tradicionais de uma obra do gênero, sendo ao mesmo tempo um ápice na obra de Houck e um princípio das transformações que devem sustentar o trabalho do músico daqui pra frente.

 

Phosphorescent

Muchacho (2013, Dead Oceans)


Nota: 8.5
Para quem gosta de: Bon Iver, Songs: Ohia e Jim James
Ouça: Song For Zula, Terror In The Canyons (The Wounded Master) e Ride On, Right On

[soundcloud url=”http://api.soundcloud.com/tracks/71082732″ params=”” width=” 100%” height=”166″ iframe=”true” /]

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.