Disco: “New History Warfare Vol. 3: To See More Light”, Colin Stetson

/ Por: Cleber Facchi 03/05/2013

Colin Stetson
Experimental/Avant-Garde/Jazz
http://colinstetson.com/

 

Por: Cleber Facchi

Colin Stetson

Cada passo dado por Colin Stetson é instável. Presença constante em projetos que vão de Arcade Fire à Feist, passando por TV On The Radio e Bon Iver, o saxofonista norte-americano chega ao terceiro capítulo da série iniciada em 2007, transformando New History Warfare Vol. 3: To See More Light (2013, Constellation) em um emaranhado de soluções instáveis que lidam abertamente com a experimentação. Seguindo de onde parou há dois anos, com o lançamento de Judges, o músico usa da recente obra não como uma extensão do universo caótico que vem construindo em camadas, mas como um ponto de isolamento e possivelmente o exemplar mais acessível de toda a carreira.

Apoiado no uso coeso de overdubs e loops cacofônicos de saxofone, Stetson flutua em uma medida constante de improviso e autocontrole musical. Ao mesmo tempo em que cada faixa cresce dentro de uma atmosfera de funções ilimitadas, derramando ruídos e até vocais amargos, tudo parece cercado dentro de um plano de extrema intimidade, como se cada música presente no interior do disco se relacionasse com beleza e coerência. Diferente do que fora testado com o registro de 2011 e ainda mais distante do primeiro capítulo lançado há seis anos, o músico trata do álbum como uma obra única, amarrando todas as pontas do trabalho em um exemplar que rompe com as regras atmosféricas e se aprofunda em quebras conceituais.

Ao passo em que no disco anterior cada composição alimentava uma pequena parcela aleatória do conjunto final da obra, em To See More Light a proposta de Stetson assume um rumo de completa oposição. Todas as canções são atos complementares, partículas de uma estrutura que invariavelmente tende à melancolia (Hunted) e até à raiva (Brute). Dessa forma, o compositor estabelece um registro que mesmo orientado de forma natural pelo experimento, assume linearidade. Há preparação no clima matutino de And in Truth, faixa que inaugura o disco, crescimento em Who the Waves Are Roaring For (Hunted II), no meio da obra e um fecho natural na estrutura decrescente de Part of Me Apart From You. Pela primeira vez Stetson parece ter noção exata de cada limite do registro.

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Praticamente desprovido de percussão e outros elementos externos que construíram o disco passado, New History Warfare Vol. 3 traz na figura única de Stetson o objeto central de toda a obra. Excêntrico, desesperador, amplo e minimalista, o sax baixo do músico altera suas formas a cada nova faixa, resultando em um caminho torto que amplia a proposta inicial do artista ao mesmo tempo em que delimita tudo em um labirinto de proporções calculadas. Por justamente se livrar de outros instrumentos, Colin rompe com a proposta essencialmente climática do último disco, alimentando a produção de um álbum que brinca com as formas e com a capacidade de adaptação do próprio ouvinte em ser arremessado para todas as direções.

Aliado ao plano incerto do saxofone, os vocais são apresentados em segundo plano, porém com significado talvez maior do que o próprio instrumental. Como se uma orquestra de baleias atravessasse o disco, vozes sombrias imergem e emergem a todo o instante, ocupando as possíveis lacunas deixas pela obra e naturalmente identificando um ponto de aprimoramento em relação aos últimos trabalhos do músico. Além do plano de fundo ambiental, em pontos estratégicos do registro os vocais se entregam ao canto límpido. É o caso de What Are They Doing in Heaven Today? e outras três faixas que trazem na presença de Justin Vernon (Bon Iver) uma materialização dos inventos anteriormente limitados aos sons de Stetson. Tudo é pensado de forma tão coesa, que por diversas momentos a voz de Vernon simplesmente desliza nas notas repassadas pelo músico.

Da batida nas teclas que se transforma em percussão à orquestração dos ruídos de forma melódica, toda mínima partícula de som é convertida em instrumento para a obra. O próprio Vernon parece ser aproveitado como um mecanismo para o exercício incerto que sustenta o registro. Diferentes dos outros álbuns, o domínio do Colin Stetson é pleno, um pequeno deus em um universo que é construído e destruído a todo o instante dentro do disco. Há um esforço constante em tentar entender quais são as bases do músico, entretanto, Coltrane, Albert Ayler, Evan Parker, nenhum deles parece servir como resposta enquanto Stetson segue em um plano que parece movido por regras próprias.

 

New History Warfare Vol. 3: To See More Light

New History Warfare Vol. 3: To See More Light (2013, Constellation)


Nota: 8.5
Para quem gosta de: Tim Hecker, Bon Iver e The Caretaker
Ouça: To See More Light, Brute e Hunted

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.