Disco: “Nikki Nack”, tUnE-yArDs

/ Por: Cleber Facchi 07/05/2014

tUnE-yArDs
Indie/Experimental/Alternative
http://tune-yards.com/

Por: Cleber Facchi

Tune-Yards

O clipe colorido e esquizofrênico de Water Fountain, lançado há poucas semanas, é quase autoexplicativo: a mente de Merrill Garbus não faz parte da nossa realidade. Desde a estreia com BiRd-BrAiNs, em 2009, que a cantora e compositora norte-americana vem utilizando das próprias melodias quebradas e arranjos não óbvios como uma passagem para esse cenário perfeitamente instável. Um exercício expandido de forma inteligente no interior de W h o k i l l, obra-prima da artista lançada em 2011, mas que encontra contornos comerciais e íntimos do grande público no recém-lançado Nikki Nack (2014, 4AD).

Primeiro trabalho da cantora registrado em um estúdio profissional e cercada pelos mimos do selo 4AD – que vem investindo pesado no visual, divulgação e produção do disco -, o terceiro álbum de Garbus é a prova de que a aproximação com o pop está longe de prejudicar o rendimento criativo de sua autora. Naturalmente íntimos das experiências africanas (principalmente nas batidas) e inclinada ao uso de colagens variadas de gêneros, tendências e sons, a musicista facilita o caminho do ouvinte para dentro das próprias referências, utilizando do próprio domínio como uma forma de perversão contínua do óbvio.

Espécie de versão “polida” da sonoridade lançada em W h o k i l l, Nikki Nack é mais do que um diamante lapidado, trata-se de uma obra de adaptação. Da mesma forma que Lykke Li em I Never Learn (2014) e St. Vincent com o novo disco, a presente obra de Garbus cresce como uma pergunta, algo como: até onde eu posso ir? Meio termo entre o “alternativo” e o “pop”, o álbum é uma típica obra do tUnE-yArDs, apenas reforçada pelo apelo comercial de John Hill (Shakira, Rihanna) e Malay (Alicia Keys, Angel Haze), co-produtores do disco e figuras responsáveis pela parcial abertura do trabalho.

Prova do natural domínio de Garbus em relação ao próprio trabalho está na excentricidade dos versos e sons que ocupam todas as dimensões da obra. Onde mais seria possível encontrar uma faixa como Wait for a Minute, música que se entrega ao romantismo confessional do R&B, sem necessariamente perder a sonorização quebrada das bases? E o que dizer da própria faixa de apresentação do álbum, Water Fountain, canção que brinca com os desníveis de áudio sem perder a fluência acessível? É possível ir além, como a vinheta Why Do We Dine on the Tots?, Time of Dark e sua herança “talkingheadniana” ou a suja Sink-O, típicos exemplares do mundo colorido da cantora.

Na contramão de grande parte dos artistas que tendem ao “comercial” em busca de novos horizontes, Garbus curiosamente amplia o próprio campo de atuação. Melhor exemplo disso está em Real Thing, música que soa como uma versão abstrata do Justin Timberlake da fase FutureSex/LoveSound (2006). Precisa de mais? Que tal mergulhar nas confissões da artista em Look Around, uma típica canção de amor que pesa sobre os arranjos e versos da cantora. Sobram experimentos eletrônicos em Stop That Man, uma espécie de regresso ao clima caseiro do primeiro disco em Rocking Chair, além de uma versão reformulada do adorado Afrobeat de Garbus no interior de Left Behind. Possibilidades não faltam – para o ouvinte, ou para a cantora.

Mesmo o caráter versátil do álbum não oculta a carência de alguns elementos “orgânicos” do disco passado. A ausência do trio de metais contratados para a produção de W h o k i l l, por exemplo, bem como a substituição das guitarras por sintetizadores pesa no rendimento da obra, que cresce demasiado sintética em alguns aspectos. Faltam os ruídos artesanais presentes em músicas como My Country e Gangsta do disco de 2011. Entretanto, o cenário delimitado por Garbus se organiza de forma exata, fazendo de Nikki Nack uma espécie de ensaio fechado e uma direção segura para qualquer futuro invento que a artista possa promover.

 

Nickki-Nack

Nikki Nack (2014, 4AD)

Nota: 8.3
Para quem gosta de: Dirty Projectors, St. Vincent e Micachu
Ouça: Water Fountain, Time of Dark e Wait for a Minute

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.