Disco: “NO LOVE DEEP WEB”, Death Grips

/ Por: Cleber Facchi 04/10/2012

Death Grips
Hip-Hop/Rap/Experimental
http://thirdworlds.net/

Por: Cleber Facchi

Desavisados que passeiam com segurança pelas páginas de conteúdo “familiar” gerado por distintas plataformas de busca talvez desconheçam o que há de realmente sujo por trás da internet. Maior porção de tudo que você (não) encontra em uma busca pela rede, a Deep Web concentra a totalidade das páginas que estão longe de serem indexadas pelos buscadores. Um registro escatológico, macabro e assombroso de conteúdos que fariam uma pessoa normal passar mal em poucos segundos. Um passo além de tudo aquilo que mesmo o SefeSearch do Google desativado é capaz de revelar e o cenário exato de onde parece nascer cada verso, sonoridade e dose de esquizofrenia que acompanha os trabalhos do coletivo Death Grips.

Donos de uma proposta que perverte os limites do óbvio, mesmo dentro da insanidade que por vezes habita o novo rap estadunidense ou a música em seu estado mais experimental, MC Ride (vocais), Zach Hill (produção e bateria) e Flatlander (produção) retornam para o lançamento de mais um registro de pura estranheza, obscuridade e experimentação. Espécie de versão caótica de qualquer exagero que possa flutuar no universo de grupos como Odd Future, o trio faz do álbum NO LOVE DEEP WEB (2012, Epic/Columbia) uma sequência aprimorada do que fora testado há alguns meses, quando The Money Store foi apresentado com relevância e aceitação ao público. O que até então parecia ser uma versão remodelada e límpida do debut Exmilitary (2011) aparece novamente em um estado de pura perversão, com a “banda” incorporando mais uma vez a mesma verve obscura de outrora.

“A gravadora vai ouvir o disco pela primeira vez, com vocês” anunciou o grupo em um post no Twitter poucos instantes depois de disponibilizado o álbum para a audição na própria página oficial. A atitude ousada (ou suicida) acabou irritando os selos Epic e Columbia, braços da Sony Music que lançariam o disco em formato físico, resultado visto na atitude abusiva da gravadora, que logo em seguida tirou o site da banda do ar. Agora, ao que tudo indica o lançamento oficial do álbum só acontecerá no próximo ano – como o próprio DG anunciou posteriormente no mesmo perfil do Twitter. Como se não bastasse a atitude arriscada por parte do coletivo, a capa que “ilustra” o álbum (um pênis ereto com o título do trabalho escrito com canetão) se relaciona de forma perfeita com tudo aquilo que o grupo já vinha armando desde o primeiro disco, além, claro, da relação com o título do trabalho.

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Musicalmente quem talvez esperasse por um registro de possibilidades previsíveis em relação aos dois bem estabelecidos registros que antecipam o álbum vai acabar surpreso: NLDW não apenas incorpora o que há de mais assertivo nos projetos anteriores, como entrega todo um novo conjunto de sons, rimas e experiências sempre bizarras e experimentais. Enquanto MC Ride transforma os próprios vocais em um canhão de versos graves e sufocantes, a dupla de produtores aceleram a projeção de um som ruidoso, cru e ainda assim evoluído do ponto de vista rústico firmado em Exmilitary. Espere pela mesma fluência eletrônica-dançante apresentada há alguns meses, agora acrescida de um tempero instrumental que parece pronto para esganar o ouvinte. Apenas o mesmo caos mencionado no texto do disco anterior, agora “controlado”.

Um pouco mais “lento” que o disco antecessor lançado há alguns meses, NLDW divide com exatidão o trabalho em duas frentes bem estabelecidas: os versos e o som. Quem busca pelo primeiro ingrediente encontrará ao longo do álbum um Death Grips tão ácido, agressivo e sombrio quanto o que ditava os rumos de músicas como Guillotine no primeiro disco ou de faixas aos moldes de Fuck That no segundo.  Já os que preferem passear pelo disco atento à sonoridade do trabalho vai se deparar com faixas permeadas pela densidade, propósito que nutre tanto os momentos mais comerciais do disco (Deep Web e Whammy) como os instantes mais amargos e pouco acessíveis (Lock your doors).

Por mais que esta divisão estrutural pareça ser uma premissa natural para qualquer grande registro do gênero, ao longo do disco esse resultado de separação se intensifica, proporcionando o surgimento de um trabalho dotado de acabamento caótico e intencionalmente desordenado. A medida parece contribuir ainda mais para o estado de anarquia – lírica e sonora – firmada desde o primeiro disco do trio californiano, proposta que só não posiciona o Death Grips no topo dos grandes nomes do Hip-Hop atual por um motivo muito simples: eles são donos de um ritmo e um tipo de som totalmente individual, incapaz de ser compartilhado e por vezes até compreendido. Perto do Death Grips a internet e o que há de mais sujo nas profundezas dela surge como delicados retratos da mais doce e encantadora ilustração infantil.

NO LOVE DEEP WEB (2012, Epic/Columbia)

Nota: 8.2
Para quem gosta de: Danny Brown, Shabazz Palaces e TNGHT
Ouça: Deep Web, Whammy e World of Dogs

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.