Disco: “Old”, Danny Brown

/ Por: Cleber Facchi 07/10/2013

Danny Brown
Hip-Hop/Rap/Alternative
http://xdannyxbrownx.com/

Por: Cleber Facchi

Enquanto o cenário norte-americano é abastecido por cenas, estéticas e coletivos que desaparecem tão rápido quanto surgem, Danny Brown se apresenta como dono de um território isolado. Insano, bem humorado e um dos poucos artistas capazes de não tropeçar na rima – mesmo quando recebe sexo oral de uma fã em uma apresentação ao vivo -, o rapper chega ao terceiro registro solo alcançando não apenas seu melhor exemplar até aqui, mas uma das obras mais complexas do panorama recente. Longe do retorno conceitual aos anos 1990 e sem buscar pela mesma atmosfera de referências que esbarram em obras como My Beautiful Dark Twisted Fantasy (2010) e Good Kid M.A.A.D City (2012), Brown, mais uma vez, materializa um universo próprio, um lugar onde drogas, sexo e o discurso cru do artista ditam todas as regras.

Enquanto XXX, álbum de 2011, orientava o artista em uma sequência alucinada de rimas e tramas lisérgicas, com Old (2013, Fool’s Gold) esse mesmo “padrão” flui potencializado, sem que Brown necessariamente perca o controle dos versos. “Fecho meus olhos, sinto que estou indo para baixo/ Em um elevador a 90 quilômetros por hora/ E tudo que eu vejo são as estrelas vindo para mim como uma espécie de chuva de meteoros”, exageradamente chapadas ou não, mas as rimas expostas em Kush Coma parecem caracterizar com acerto tudo o que orienta o presente disco. De bases e batidas velozes, princípio para os vocais do rapper, o registro beira a overdose, como se tudo fosse um embaralhado jogo de sensações, temas e pequenas referências tratadas em uma linguagem totalmente esquizofrênica, própria do artista.

Entretanto, longe de uma parada cardíaca, Brown faz valer o título da obra – “velho” -, reforçando a maturidade durante a execução de cada nova faixa. Mais uma vez passeando pelas periferias e o cotidiano de Detroit, Michigan, o artista mantém um registro que flutua entre o presente e o próprio passado, resgatando diversos conceitos de quando era traficante de drogas e vivia mergulhado nas sombras da cidade. A estrutura, longe de esbarrar no egocentrismo tão típico do Hip-Hop, faz com que o rapper apareça de forma reflexiva em grande parte da obra, algo que Lonely (“Eu não preciso de sua ajuda mano/ Porque não ninguém realmente me conhece”) e Torture (“E é tortura/ Olhar em minha mente e ver os horrores/ Toda a merda que eu já vi”) manifestam em um efeito nítido de melancolia.

A obra de Brown, longe de se espatifar no elevador metafórico que cai em Kush Coma, é um trabalho que permite ao artista o próprio crescimento. Parte natural desse sintoma de grandeza do álbum está no número maior de colaboradores. Ainda que o principal composto da obra seja fruto da individualidade do rapper, em uma sequência natural ao mesmo efeito exposto em XXX, a presença de SchoolBoy Q, Ab-Soul e A$ap Rocky tira o álbum de um possível estágio de redundância. Mais do que se manter atento dentro do próprio cenário, Brown acerta ao transitar por diferente territórios, encontrando na presença de velhos colaboradores, como Charli XCX em Float On e a dupla Purity Rings na ótima 25 Bucks, um complemento natural para a obra.

Mais do que o time seleto de colaboradores que dividem as rimas com Brown, Old é uma obra que ganha com as distintas interferências musicais que se acomodam na produção do trabalho. Ainda que parceiros como SKYWLKR e Paul White se mantenham tão ativos quando no disco passado, é na chegada de uma nova frente de intervenções sonoras que o álbum realmente cresce. Rustie nas anfetaminadas Side B (Dope Song) e Break It (Go), A-Track em Smokin & Drinkin ou os músicos do BADBADNOTGOOD em Float On, ao apostar em um novo cardápio de produtores, Brown abre espaço para que a própria rima encontre um efeito volátil, transitando por versos de apelo comercial, como canções essencialmente herméticas. Experimentar parece ser uma das (inúmeras) palavras de ordem que caracterizam o disco.

Anunciado (de forma sarcástica) como o Kid A de Danny Brown, Old ainda está longe de manifestar o mesmo teor revolucionário que define a complexa obra do Radiohead. Não espere por instantes de canto melancólico, ou versos que se esfarelam em meio aos sons, com o recente álbum o ouvinte tem apenas o mesmo efeito sujo exposto em XXX, talvez ampliado musicalmente e capaz de apontar para novas direções. Entretanto, ao desenvolver um universo específico, em que bases instrumentais, rimas e interferências externas parecem trabalhadas com pleno sentimento de proximidade, Brown, involuntariamente, acaba de criar uma obra tão autêntica quanto a que consolidou o trabalho do coletivo britânico. E isso parece ser só o começo.

Danny Brown

Old (2013, Fool’s Gold)

Nota: 8.8
Para quem gosta de: Schoolboy Q, Purity Ring e Ab-Soul
Ouça: Lonely, 25 Bucks e Kush Coma

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.