Disco: “Playin’ Me”, Cooly G

/ Por: Cleber Facchi 02/10/2012

Cooly G
British/Electronic/Dubstep
https://www.facebook.com/OFFICIAL.COOLY.G

Por: Cleber Facchi

Desde que Katy B tomou conta das pistas inglesas há pouco mais de dois anos – fazendo uso de batidas estrondosas e dos versos grudentos de Louder – que o Dubstep deixou de ser um terreno unicamente habitado por produtores e artistas masculinos. Seja pela volumosa presença de samples e vozes femininos em infinitas composições do gênero ou mesmo pela presença fundamental de representantes como a DJ britânica Mary Anne Hobbs (uma das grandes expoentes desse tipo de sonoridade), o Dubstep/UK Garage acabou se convertendo em um gênero de visível e necessário domínio das mulheres.

Dentro desse universo crescente e de forte apelo popular – vide a boa repercussão em torno da obra do norte-americano Skrillex -, Merrisa Campbell assume um posicionamento particular, não abraçando o mesmo resultado proposto por artistas donos de uma proposta comercial, como Emika ou a própria Katy B, seguindo por um percurso próprio. Imersa em um plano instrumental que se sustenta visivelmente nas “tradições” do dubstep – quem acompanha o trabalho de artistas como Kode9 e até de nomes mais recentes como Mount Kimbie vai ficar bem satisfeito com o resultado – a britânica faz do registro de estreia um exercício que trança o passado e o presente do gênero de forma curiosa, ora se envolvendo com as pistas de dança, ora apostando em uma ambientação de delineamentos experimentais.

Soando como uma antítese do que a nova-iorquina Azealia Banks desenvolve em sua própria carreira, Campbell substitui as batidas e rimas rápidas da norte-americana pela densidade das camadas, a condução sublime dos versos e todo um enquadramento que a posiciona como figura única dentro do seleto grupo de vozes femininas que ocupam todos os limites do pop/rap/eletrônica atual. Talvez por conta dessa fluidez singular dentro do que há de mais comum no cenário recente, bem como a variedade de resíduos instrumentais que se acumulam pelo disco, uma primeira audição do hermético Playin’ Me (2012, Hyperdub) talvez não seja o suficiente para fisgar o ouvinte. Todavia, uma vez dentro do labirinto edificado pela inglesa, difícil encontrar a saída ou realmente querer sair dele.

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Ao mesmo tempo em que se mantém próxima de toda uma variedade de elementos que constituem a cena eletrônica britânica, Campbell dá um passo além, encontrando nas próprias raízes negras uma variedade de outros sons que ampliam com excelência suas composições. Seja pelo clima intimista que reside em Come Into My Room (com uma forte aproximação com o R&B minimalista que circula pela trilogia do The Weeknd) e Sunshine (música que por vezes se perde nas vias do reggae e soul), é ao firmar a relação com as músicas de seus antepassados que a britânica revela a face mais cantora do disco, se desvencilhando do caráter essencialmente sintético que acaba conduzindo a extensão de músicas como Trying e It’s Serious.

Sem a disponibilidade de grandes hits ou faixas que encarem uma sonoridade mais plástica – como estamos habituados a cantoras do gênero -, Cooly G passeia sem exageros por um disco que parece trabalhado dentro de uma proposta sonora totalmente particular. Assim como já havia desenvolvido no decorrer do primeiro grande single, Love Dub (2009), a britânica deixa que a voz se misture a uma camada acolhedora de reverberações sutis, contribuindo para a construção de um trabalho hipnótico, mesmo aos não habituados a esse tipo de som. Provavelmente o ápice das transformações dentro do trabalho se esconda nos instantes finais do álbum, quando faixas como Is It Gone e Up In My Head mastigam as principais características do gênero e as entregam de forma que parecem confundir mesmo quem já parecia acostumado com os rumos incertos do dubstep.

Imersa na proposta de evidenciar um som pouco óbvio e com toques não convencionais, Campbell se abre em alguns instantes para faixas que se aproximem do público e de um som mais pop, efeito manifesto nas convenções eróticas de Come Into My Room e principalmente na interpretação remodelada de Trouble, música originalmente gravada no primeiro disco do Coldplay, Parachutes (2000), e aqui transformada de forma partidária com as exigências sonoras da artista. Talvez Cooly G exija no título do disco que o ouvinte brinque com ela, mas ao final do trabalho o que temos é uma completa inversão desse resultado, com o espectador sendo manipulado e dançando de acordo com as leis da própria artista.

Playin’ Me (2012, Hyperdub)

Nota: 8.0
Para quem gosta de: Katy B, Moutn Kimbie e The Weeknd
Ouça: Come Into My Room

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.