Disco: “Presença”, Cássio Figueiredo

/ Por: Cleber Facchi 06/01/2016

Cássio Figueiredo
Experimental/Ambient/Drone
https://cassiofigueiredo.bandcamp.com/

 

Microfonias, sons de carros, ruídos abafados, vozes, arranjos lentos e o riso torto que se repete de forma cíclica. Basta uma audição detalhada para perceber que a música de Cássio Figueiredo se alimenta de instantes. Fragmentos instrumentais (e cotidianos) que se movimentam lentamente, sussurrando e crescendo sem exageros, efêmeros, como peças que se encaixam de forma a reproduzir o curto acervo do delicado Presença (2016, Independente).

Quarto e mais recente registro de inéditas do músico de Volta Redonda, o disco de 12 faixas curtas parece seguir a trilha anteriormente explorada pelo músico no álbum Diário, de 2015, dançando uma valsa lenta de sobreposições minimalistas, sempre enevoadas. A diferença em relação aos últimos trabalhos de Figueiredo está na curiosa sensação de “acolhimento” criada pelo disco, conceito que se reforça pelo uso atento de melodias tímidas – marca de composições como Retorno e Laura.

Mesmo a tapeçaria soturna de músicas como Rua e Trajeto – porções “fantasmagóricas” do registro – em nenhum momento interferem na montagem delicada que sustenta parte expressiva da obra. Presença, como um típico trabalho de Figueiredo, é um a obra entregue ao curioso experimento de seu criador. Exemplo disso sobrevive nas maquinações etéreas de Entre coisas, um dos fragmentos mais curiosos do disco e uma espécie de “diálogo” do artista com o mesmo som obscuro de nomes como Balam Acab.

Ao mesmo tempo em que parece “confortar” o ouvinte em um cenário de regras preestabelecidas, o músico lentamente cria pequenas brechas e curvas bruscas que provocam a interpretação do ouvinte. Composições como a cinzenta Trajeto, uma climática sequência de ruídos sobrepostos, inicialmente branda, mas que colide em uma instável parede de ruídos nos instantes finais.

Convidado a participar em duas composições do disco – A Forma do Dia e Caminhão de Lixo -, o carioca Cadu Tenório em nenhum momento corrompe a singular arquitetura de Figueiredo. Seja na colagem de ruídos que solucionam a inaugural A Forma do Dia ou na massa densa de Caminhão de Lixo, cada passo dado por Tenório parece seguir o mesmo catálogo de “regras” propostas pelo músico.

Perto dos últimos registros de Figueiredo, Presença talvez seja o trabalho que melhor incorpora os pequenos retalhos instrumentais do músico, reforçando a sensação de completude. Mesmo aleatórios, por vezes isolados, cada fragmento do álbum parece servir de alicerce para a canção seguinte. Mesmo peças curtas – como Retorno e Coisa -, se projetam como pequenas pinceladas na imensa paisagem detalhista que o músico arquiteta até o último ruído de Condução.

 

Presença (2016, Independente)

Nota: 8.0
Para quem gosta de: Cadu Tenório, Bemônio e Ceticências
Ouça: Entre Coisas, Trajeto e Caminhão de Lixo

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.