Críticas

Actress

: "R.I.P. "

Ano: 2012

Selo: Honest Jon's

Gênero: Eletrônica, Experimental

Para quem gosta de: Autchere, Aphex Twin

Ouça: Jardin, Shadow From Tartarus

8.6
8.6

Disco: “R.I.P.”, Actress

Ano: 2012

Selo: Honest Jon's

Gênero: Eletrônica, Experimental

Para quem gosta de: Autchere, Aphex Twin

Ouça: Jardin, Shadow From Tartarus

/ Por: Cleber Facchi 20/04/2012

Darren Cunningham é um herdeiro sincero dos minimalismos eletrônicos que afloraram ao longo da década de 1990. Produtor responsável pelo projeto Actress, o britânico não tardou a incluir cada uma das pequenas referências que flutuam em sua mente quando lançou em 2010 o surpreendente Splazsh. Espécie de ponto de encontro de todos os ensinamentos aplicados por Aphex Twin, Boards Of Canada e principalmente Autechre, o inglês transformou o delicado registro em uma verdadeira ode aos ruídos calculados e métricas suaves que afloraram desde a expansão da famigerada IDM, gênero musical que nas mãos do artista é esculpido de forma detalhista e sempre cuidadosa.

Ainda agarrado a essa mesma necessidade de se envolver com a música dentro de um ambiente delicado e tomado por acertos matemáticos, Cunningham faz do recente R.I.P. (2012, Honest Jon’s) o segundo e talvez mais importante registro de sua curta carreira. Intencionalmente mais experimental que o álbum anterior, o composto de 15 faixas possibilita que o produtor mergulhe em um oceano de sutilezas instrumentais ainda mais complexas e até místicas do que as encontradas anteriormente, incorporando todo um novo mundo de formas, nuances e sons que antes transitavam como sombras entre os espaços formados pelas faixas do último álbum.

Cada faixa moldada por Cunningham é movida por uma fragilidade hipnótica que parece se desintegrar nos ouvidos do espectador. As batidas precisas se contrapondo aos ruídos estabelecem um diálogo perfeito e essencialmente suave, gerando um estranho sentimento de efemeridade e até urgência, como se as músicas pudessem desaparecer a qualquer momento nas mãos do ouvinte. Tudo se movimenta de maneira comportada, porém sempre repleta de detalhes. Sem jamais ultrapassar os 130 BPM, o britânico estabelece um constante limite sobre a obra, como se fosse autor de um particular Jardim do Éden, onde tudo parece perfeitamente enquadrado e devidamente posicionado – pelo menos durante a primeira metade do álbum.

A metáfora com o mágico ambiente projetado por Deus para servir de morada aos primeiros humanos está presente em toda a extensão do registro. Tanto Holy Water como Jardin, posicionadas nos primórdios do trabalho transmitem uma constante e natural sensação de suavidade e beleza, como se o produtor estivesse introduzindo o ouvinte ao acolhedor ambiente que ele arquitetou. Tudo ecoa descoberta e a mesma ambientação sublime que permeou todo o último disco do britânico. Durante essa etapa do registro as batidas parecem estar em um segundo plano, com uma maior valorização dos samples e bases amenas que preenchem faixas como Ascending, Marble Plexus e Uriel’s Black Harp.

É justamente nessa primeira etapa do registro em que encontramos Actress demonstrando toda sua aproximação com os grandes produtores que tanto o inspiram. Sejam as programações hipnóticas que habitam o clássico Richard D. James Album de 1996 – bem representadas em Marble Plexus – ou as mínimas e sempre cuidadosas construções sintéticas que se revelam em Music Has the Right to Children de 1998 – aqui presentes em Holy Water -, o que não faltam são diálogos ativos com a produção eletrônica do passado. Todavia, assim como no registro de 2010, Darren se deixa influenciar de maneira leve por estes artistas, imprimindo a todo momento uma sonoridade (na medida do possível) desenvolvida por ele próprio.

A tonalidade sempre branda e tomada por nuances delicadíssimas acaba se extinguindo bruscamente a partir da sinuosa Serpent. Como se o pecado original tomasse conta do registro, R.I.P. envereda para uma sonoridade mais ruidosa e por vezes obscura, resultado que se maximiza durante as execução da enevoada Tree Of Knowledge. As referências, antes tomadas por harmonias ensolaradas e batidas policromáticas, agora revelam um tom áspero e melancólico, com Actress cultivando apenas a relação com o Autechre e por vezes se aproximando da produção climática gerada pelo Burial do álbum Untrue.

De fato, é possível encontrar em diversos momentos do trabalho uma forte aproximação com o que o que William Bevan alcançou ao apresentar a grande obra de sua carreira em 2007. Assim como as vinhetas e o resultado intencionalmente atmosférico que preenchia toda a extensão de Untrue, em R.I.P. Cunningham se deixa conduzir pela mesma temática densa, espalhando pelo registro algumas faixas mais curtas que parecem servir para ligar as composições maiores esparramadas pelo álbum. Até a maneira como o produtor disseca os vocais presentes no decorrer do disco lembram muito o que Bevan moldou em faixas como Near Dark ou Endorphin. Entretanto, mais uma vez Actress absorve as referências e as converte em algo particular, nunca as copia.

Um pouco menor que o disco que o precede, R.I.P. traz o investimento de Cunningham em composições menos extensas e consequentemente mais atrativas. A opção por criações menores permite que o produtor se envolva com um variado conjunto de possibilidades, tornando o projeto muito mais amplo e naturalmente rodeado por elementos que antes pareciam ocultos no primeiro disco. Contrário ao título do trabalho – uma abreviatura para a expressão fúnebre “Rest in Peace” -, com o novo álbum Actress não parece nem um pouco interessado em edificar um registro de fechamento, pelo contrário, mesmo delicadas ou efêmeras, em cada faixa o produtor nos apresenta uma nova biosfera musical, pequenas frações do imenso universo que ele acaba de construir.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.