Disco: “Reign Of Terror”, Sleigh Bells

/ Por: Cleber Facchi 13/03/2012

Sleigh Bells
Noise Pop/Experimental/Female Vocalists
http://reignofterror.tv/

Nenhuma banda, seja ela iniciante ou veterana, que lançou algum trabalho em 2010 conseguiu alcançar o mesmo nível de ineditismo em um disco quanto o que foi alcançado pelo casal nova-iorquino Sleigh Bells. Com o álbum Treats, os vocais ora doce, ora gritados de Alexis Krauss se contrapondo aos ruídos cacofônicos (e até irritantes) arquitetados por Derek E. Miller acabaram resultando em uma experiência musical única. O noise rock compactuando abertamente com o pop. As guitarras orgânicas costuradas aos beats sintéticos da bateria eletrônica. Todas as extensões do disco pareciam orquestradas para a formação de um trabalho expansivo, e, por que não, revolucionário.

Não tardou para que o pequeno fenômeno montado pela banda norte-americana fosse logo notado e assimilado por alguns conterrâneos ou artistas próximos. A própria rapper M.I.A., sempre interessada na produção de trabalhos marcados pela variedade de ritmos e fórmulas musicais se encantou pelo trabalho da dupla, convertendo boa parte do frágil Maya (2010) em uma espécie de irmão (feio) da estreia do duo. Isso sem contar no sem número de artistas, também habitantes do Brooklyn, que pouco à pouco foram transpondo a torrente de distorção montada por Miller para junto de suas próprias obras. De fato, nascia ali um pequeno fenômeno.

Talvez por conta do impacto ruidoso projetado com o primeiro disco que ao experimentarmos Reign Of Terror, o mais novo trabalho da dupla sejamos rapidamente desmotivados. Mesmo que True Shred Guitar (com seus ares de música ao vivo) seja capaz de nos arremessar diretamente para junto do primeiro álbum do casal, à medida que o registro de 11 faixas cresce, mais a dupla se afunda na construção de um padrão sonoro homogêneo. As faixas se interligam, os vocais se fundem e o caos, antes matéria-prima para as composições da banda, agora dá lugar à “calmaria”, afinal, por mais agressivo que o disco seja, ele passa longe de se aproximar da mesma pancadaria musical que se anuncia desde o abrir da explosiva Tell ‘Em.

Entretanto, por mais “decepcionante” que seja o disco em uma primeira – ou mesmo até em uma décima – audição, quanto mais mergulhamos nos paredões sonoros do trabalho, mais difícil se torna abandonar os fones e se desligar por completo da até então simples obra. Reign Of Terror causa obviamente um efeito atrasado no ouvinte. É só quando nos trancamos de fato dentro do hermetismo sujo que a dupla coordena ao longo dos 36 minutos do álbum que realmente conseguimos entender do que se trata esse acumulado de sons.

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Em meio ao padrão homogêneo das sujas guitarras – repletas de elementos típicos de veteranos grupos do Heavy Metal – que aos poucos vamos desvendando com totalidade o novo trabalho da dupla. Os gritos de cheerleades que tanto marcaram o primeiro álbum, os acordes postos em looping, o constante fuzz das guitarras, os vocais repletos de overdubs e os solos quase clichês propostos por Miller vão lentamente nos trazendo de volta para a estreia da banda, agora, sob um novo olhar e uma nova audição. É como se a poeira gerada durante a explosão do debut finalmente assentasse e pudéssemos de fato compreender do que se trata o novo trabalho do duo.

Muito mais orientado para o uso de referências eletrônicas – a programação sintética passeia sem parcimônia da primeira à última faixa -, o novo fluxo musical é o que garante ineditismo ao projeto, evitando que a dupla caia em tentação e apresente um trabalho construído todo em cima de redundâncias e fórmulas garantidas. Dentro dessa inclusão de sons e materiais novos em cada faixa, o casal acaba desenvolvendo um trabalho perceptivelmente mais comercial, algo que o disco anterior talvez tenha pecado. Radiofônico, o álbum derrama uma série de hits, alguns deles romanticamente programados, como End Of The Line, uma espécie de Rill Rill do novo disco.

Mesmo contido em alguns momentos, Reign Of Terror entrega um cardápio mais do que convincente de pedradas musicais. Born To Lose, a primeira faixa do disco que viu a luz do dia mantém o mesmo espírito que Infinity Guitars e Kids alcançaram no último álbum. Já Demons, e os versos berrados de maneira comemorativa reforçam a temática produzida em Tell ‘Em, com Miller amarrando as batidas e as guitarras de forma crescente, visando ao final da faixa alcançar um resultado épico. Sobra até espaço para que os nova-iorquinos explorem novas possibilidades, trazendo na eletrônica quase pura de Never Say Die uma mostra convincente do que pode ser desenvolvido nos futuros trabalhos da banda.

Obviamente complexo (se não difícil) em uma inicial audição, Reign Of Terror comprova que se Treats foi a explosão, então o atual trabalho traz o verdadeiro impacto do que o Sleigh Bells conseguiu explorar com o disco de estreia. Quem sobreviveu ao catastrófico projeto anterior, com todos seus ruídos, berros e camadas de distorção dificilmente sobreviverá ao acumulado de ondas que acabam de chegar. O reino do terror está montado, e apenas os fortes sobreviverão.

Reign Of Terror (2012, Mom+Pop)

Nota: 8.0
Para quem gosta de: No Age, Wavves e The Pains of Being Pure at Heart
Ouça: End Of The Line e Born To Lose

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.