Disco: “Samba 808”, Wado

/ Por: Cleber Facchi 22/10/2011

Wado
Brazilian/Alternative/Samba
http://www.wado.com.br/

Por: Cleber Facchi

De toda a crescente de artistas que eclodiram em solo brasileiro ao longo da última década, o catarinense naturalizado alagoano Wado, é de forma incontestável o artista mais inventivo que acabou surgindo. Entre sambas, funks e afoxés, o músico conseguiu através de seus trabalhos proporcionar uma nova roupagem a música brasileira, fundindo tendências, encaixando distintas sonoridades e fazendo com que a cada novo álbum fossemos agraciados com uma onda de novas sensações musicais. Não diferente, seu novo álbum, Samba 808, evoca as mesmas experiências de suas anteriores obras, com o cantor mais uma vez deixando o conforto das antigas fórmulas para experimentar.

Munido de uma bateria eletrônica Roland-TR 808 – mesmo modelo utilizado por Kanye West para dar vida ao sofrido 808s & Heartbreak -, Wado nos faz navegar em uma maré de sambas levemente melancólicos e nostálgicos, inundados por pequenas doses de projeções eletrônicas. Lançado unicamente em formato virtual e dialogando de forma “coerente com a cultura do mp3”, o disco é mais um bem desenvolto achado musical, uma espécie de grande resultado de tudo que foi desenvolvido pelo artista ao longo de sua bem resolvida carreira.

Da trinca inicial de trabalhos do músico – Manifesto da Arte Periférica, Cinema Auditivo e A Farsa do Samba Nublado -, quando ainda apresentava ao lado de sua banda, O Realismo Fantástico, surgem as experiências líricas, deixando para os trabalhos seguintes a influência instrumental. Do caloroso Terceiro Mundo Festivo, de 2008, explode a pluralidade sonora e os flertes com a programação eletrônica, deixando para Atlântico Negro, de 2009, o toque conceitual, com Wado abandonando a temática voltada ao continente negro e fixando seus esforços no conceito que se apresenta logo no título do trabalho.

Embora o cantor surja praticamente solitário como responsável pelo disco, Samba 808 se apresenta como um enorme ponto de encontro entre diferentes representantes da nossa música, transformando-se no mais vasto álbum já projetado pelo alagoano. Além de velhos parceiros como Curumin, Momo e Alvinho Lancellotti, surge ainda uma pluralidade de bem incluídas participações. De Marcelo Camelo e Mallu Magalhães no pop romântico e sintetizado de Com A Ponta Dos Dedos ao passeio dos veteranos Zeca Baleiro, Chico Cézar e André Abujamra, o álbum explode em diversidade e, consequentemente, beleza.

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Além da gama de convidados especiais – que se completa com Fabio Góes e Fernando Anittelli -, grande parte do que torna o registro aprazível está na bem executada banda de apoio do músico. Formada por Rodrigo Peixe, Pedro Ivo Euzébio, Dinho Zampier, Bruno Rodrigues e Vitor Peixoto, o quinteto, mesmo ao fundo das sublimes camadas eletrônicas, acabam garantindo uma fluência despojada e um caráter orgânico ao projeto. O resultado dessa perfeita sincronia entre as letras de Wado e a sonoridade montada por seus parceiros está em Vai Ver e Recompensa, dois novos achados para a coletânea de memoráveis composições do artista.

Inverso ao que fora explorado pelo músico em seu último disco – que acabou adornado por melodias ensolaradas, furto óbvio da temática explorada pela obra -, em Samba 808 é visível o quando o registro foca suas composições para dentro. Mesmo nos momentos mais exaltados do trabalho há uma espécie de controle, com as músicas soando intensamente abrandadas. Seja a abertura do disco ao som da moderada Si Próprio ou no fecho com Beira Mar, Wado opta por um som quase diminuto, longe da grandiosidade explorada em faixas como Estrada, Cordão de Isolamento ou Macaco Pavão.

Embora o título do álbum transpareça grande parte do que encontraremos em seu interior, Wado e seus parceiros se permitem quebrar os limites, apostando em composições que se desvencilhem da unidade de sambas carregados por uma fluência sintética. É o caso de faixas como Não Para, que parece ter escapado de Terceiro Mundo Festivo e fugido para cá, evocando uma espécie de funk carregado de suingue, permitindo que o cantor ecoe a calorosa sequência “não para, não para, não para não/ Até o chão/ Elas estão descontroladas”.

Talvez acabem decepcionados aqueles que buscam em Samba 808 a mesma fluidez exaltada por Wado em suas antigas obras, afinal, é inegável o quanto o registro carece de certo tempo até se assentar confortavelmente em nossos ouvidos. Passado o desconforto, ou calmaria demasiada que se anuncia nas primeiras audições do álbum, o álbum acaba revelando a sempre mutável e inteligente imagem do compositor alagoano, uma figura que mesmo desconhecida do grande público e muitas vezes esquecida pela imprensa “especializada”, nunca esquece de seus seguidores, presenteando-os com mais um deleite musical.

Samba 808 (2011, Independente)

Nota: 9.0
Para quem gosta de: Lucas Santtana, Momo e Curumin
Ouça: Com a Ponta Dos dedos, Vai ver e Jornada

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.