Disco: “Somewhere Else”, Sally Shapiro

/ Por: Cleber Facchi 27/02/2013

Sally Shapiro
Swedish/Electronic/Female Vocalists
https://www.facebook.com/shapirosally

 

Por: Cleber Facchi

Sally Shapiro é uma artista de proposta curiosa. Talvez pelos vestidos de acabamento bucólico ou pelas fotos de divulgação quase sempre carregadas pelo verde dos ambientes orgânicos, o trabalho da artista original de Gothenburg na Suécia seja um caminho fácil para quem busca pela música folk. Pelo menos aos desavisados. Dona de vocais tão suaves e encantadores quanto os de qualquer outra grande representante do Folk atual, a artista já passeia por mais de meia década de composições inteiramente voltadas às pistas, faixas que dotadas de uma pureza ambiental abraçam a Italo Disco, derramam música pop em cima de camadas eletrônicas até firmar um composto sonoro que parece único do trabalho da artista.

Acompanhada do velho parceiro Johan Agebjörn, principal responsável pela nuvem de sons eletrônicos que passeiam pela obra, Shapiro transforma Somewhere Else (2013, Paper Bag) no terceiro álbum de inéditas da carreira, ao mesmo tempo em que firma um curioso regresso aos sons e acertos que a apresentaram em 2006. Sempre orientado dentro de uma atmosfera branda e pop na mesma proporção, o novo disco parece excluir os exageros que decidiram os rumos da sueca no insosso My Guilty Pleasure (2009), bebendo diretamente das batidas doces e dos versos bem estabelecidos que percorrem toda a construção do debut Disco Romance (2006).

É preciso notar que enquanto o primeiro álbum tratava de absorver as batidas como a principal fonte de movimento para o trabalho de Shapiro, com o novo disco a proposta é outra. Apostando no uso constante de camadas brandas, Agebjörn estabelece o clima delicado e naturalmente coeso para que os vocais da parceira se derramem em faixas ao molde de Sundown. Livre de qualquer exagero vocal ou sonoro, a canção representa muito do que é construído no decorrer da obra, marca anunciada logo na vinheta de abertura, Prescript, seguida na progressão eletrônica de I Dream With An Angel Tonight (uma versão “feminina” do trabalho de Lindstrøm), até que se derramem as emanações letárgicas (e dolorosas) da música de encerramento, Postscript.

 

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Mesmo a proposta introspectiva que toma conta do registro não consegue distanciá-lo das pistas – e não são poucos os instantes em que isso impulsiona Somewhere Else. Composição mais comercial de toda a obra, e uma verdadeiro resgate do clima dançante de outrora, Starman aproxima Annie e Robyn de um mesmo cenário musical, como se as duas se revezassem nos vocais enquanto as bases eletrônicas de Agebjörn (mas também poderia ser Lindstrøm) se espalham de forma atrativa. Ecos de Goldfrapp e de tudo que orientou a eletrônica na década de 1990 também se fazem visíveis, direcionamento que logo se conecta com o clima agridoce (e mais intenso) de Lives Together, Don’t Be Afraid e Architectured, faixas de encerramento do trabalho.  

É como se ao abandonar o clima romântico (e pacato) de Sundown, a dupla mostrasse a real grandeza que se esconde pelos sintetizadores que banham a obra. Interessante perceber que é a partir desse mesmo ponto que os colaboradores que acompanham o disco são apresentados. Enquanto Electric Youth dança pelas batidas nada comportadas de Starman, Le Prix auxilia os parceiros suecos a entregar o que parece ser a melhor faixa que jamais será lançada por Ellie Goulding. Mesmo o deposito comportado de canções na primeira metade do trabalho não consegue ocultar o surgimento de exemplares com um foco maior nas pistas, caso de All My Life, música que parece guardada e construída lentamente por Shapiro desde o primeiro álbum. Até a formatação intencionalmente compacta de I Dream With An Angel Tonight não consegue barrar os pequenos instantes de exaltação, doses homeopáticas que se escondem nos mais remotos cantos da obra.

É bastante provável que para os habituados com os experimentos eletrônicos de Grimes ou o reforço do R&B que que passeia pelo pop atual, Sally Shapiro e Johan Agebjörn se apresentem como estranhos. Primeiro pela distância entre o último lançamento e o registro atual, depois pela concepção musical que praticamente rompe com grande parte do que decide os rumos da música recente. Todavia, o bom enquadramento dado ao disco, bem como a soma expressiva de composições capazes de surpreender os ouvidos ainda virgens fazem com que Somewhere Else se materialize como uma obra coerente. Um álbum capaz de se relacionar com boa parte do que o casal testou em outras épocas, ao mesmo tempo em que entrega ao público atual uma nova forma de dançar.

Sally Shapiro

Somewhere Else (2013, Paper Bag)

 

Nota: 7.9
Para quem gosta de: Annie, Lindstrøm e Robyn
Ouça: Starman, All My Life e Sundown

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.